A pandemia de coronavírus obrigou os cinemas do mundo todo a suspenderam as atividades. Consequentemente, as grandes apostas de bilheteria para este ano tiveram suas estreias adiadas, ou estrearam direto no streaming – caso de Mulan. Logo, estabeleceu-se um calendário de 2021 com filmes que estavam previstos para 2020. Esses reagendamentos se intensificaram nas últimas semanas, com mudanças de datas para filmes como Duna e 007 – Sem Tempo para Morrer. Algumas estreias agendadas para o ano que vem foram empurradas para 2022, criando um efeito dominó. E os cinemas que agora começam a ser reabertos encontram poucas novidades para exibirem até o final deste ano.
No Brasil, alguns Estados já iniciaram a reabertura dos cinemas. No Rio Grande do Sul, a liberação estadual para a retomada das atividades acabou de sair – dando início às movimentações de exibidores para reabrirem as salas. Uma das apostas para atrair o público ainda em 2020 é Tenet, de Christopher Nolan, que tem estreia oficial prevista, no Brasil, para esta quinta-feira (onde a exibição for possível). Outra é Mulher-Maravilha 1984, que chegará aos cinemas do país em 24 de dezembro.
Hormar Castello, presidente do Sindicato das Empresas Exibidoras do Rio Grande do Sul, aponta que os adiamentos devem atrapalhar a reabertura das salas:
— Até os filmes médios estão sendo empurrados para 2021. Esperávamos uma reação pouco mais adequada e gradual, com menos adiamentos, para que pudéssemos retomar a confiança do público.
Para Ricardo Difini Leite, diretor do GNC Cinemas e presidente da Federação Nacional das Empresas Exibidoras Cinematográficas, as postergações de blockbusters para 2021 não chegam a assustar, pois ele crê que seria difícil absorver todos os lançamentos programados para o que resta da temporada. Se não houvesse adiamentos, os filmes poderiam ser retirados de cartaz sem tempo para serem vistos.
Difini concorda que os filmes com apelo popular serão escassos até o final do ano:
— Estamos começando a reabrir sem produto para oferecer. Ficamos com cada vez menos opções de filmes. É o posto de gasolina sem a gasolina para oferecer.
Ewerton Brandolt, proprietário do Cine + Arte (que mantém cinemas em Capão da Canoa e Montenegro), é pessimista:
— Vejo tempos sombrios para o cinema. Uma crise jamais vista. Nós vivemos de lançamento de filmes. Se nós não tivermos lançamento de filmes, não justifica ficar aberto. E isso não serve só para o pequeno ou o médio, mas para todos os cinemas.
Brandolt, Difini e Castello defendem a necessidade de que os cinemas sejam reabertos logo. Castello classifica a situação como “bastante grave”, com a possibilidade de cinemas do Interior fecharem de vez.
— Se não forem reabertos logo, todo mundo vai falir. Com a reabertura, imagina-se que as distribuidoras vão voltar a liberar os filmes para exibição – acredita Brandolt.
Diretor do portal Filme B, especializado em análise do mercado, Paulo Sérgio Almeida avalia que, por mais que se reclame da invasão massiva dos blockbusters, que tiram espaço dos filmes menores, são as superproduções que sustentam a indústria.
— Sem os blockbusters é difícil você romper a desconfiança do espectador de ir ao cinema — afirma Almeida.
Aposta em produções nacionais está prejudicada
Ao redor do mundo, na falta de filmes hollywoodianos capazes de atrair espectadores, investe-se em produções locais. São os casos de países como Alemanha, China, Coreia do Sul e França. Para isso, porém, é necessário que o mercado de filmes nacionais seja mais robusto. No Brasil, a dependência por blockbusters ainda é excessiva, a exceção das comédias populares. Mesmo assim, os filmes desse filão estão previstos apenas para 2021 – são os casos de Tô Ryca 2, O Palestrante (estrelado por Fábio Porchat) e Os Suburbanos. Também há a tendência de alguns longas nacionais irem parar nas plataformas digitais. Almeida lembra que o tradicional modelo de lançamento de Hollywood já vinha enfrentando a concorrência do streaming.
– O cinema está em xeque. A pandemia só veio pisar no acelerador de um problema que já vinha acontecendo, que é a explosão do streaming. A cada dia que passa, serviços como a Netflix crescem mais, e os cinemas perdem – reflete Almeida.
Ele reforça a necessidade de uma produção local forte no país, mas acrescenta que o audiovisual brasileiro enfrenta momentos de dificuldades e tem seu órgão regulador, Agência Nacional do Cinema (Ancine), que está paralisado.
— O que está acontecendo com os filmes nacionais é a mesma coisa que acontece com as produções norte-americanas: chega um ponto que não pode exibir nos cinemas e vai direto para o streaming, onde as propostas são cada vez melhores. A situação é dramática — diz.
Outra questão é saber como está o público para a reabertura, pontua Almeida:
— Há duas coisas na cabeça do espectador: é seguro ir ao cinema? Vale a pena eu correr o risco para assistir a esse filme? Essas duas perguntas paralisam o mercado. Além da pandemia, o mercado não estava preparado para enfrentar uma situação dessas de programação.