Com a morte de José Mojica Marins, o jornalista André Barcinski perdeu não somente uma das personalidades que mais acompanhou em sua vida, mas praticamente um segundo pai. O escritor e roteirista é coautor de Maldito (1998), obra que conta a história do cineasta desde a sua infância pobre no bairro de Vila Anastácio, em São Paulo, até a sua consagração internacional.
Barcinski também codirigiu um documentário homônimo ao livro em 2001, sendo vencedor do Prêmio do Júri do Festival de Sundance (EUA), do Prêmio do Público do Festival É Tudo Verdade (São Paulo) e exibido em 15 festivais pelo mundo afora. Também roteirizou uma série de TV, Zé do Caixão, transmitida pelo canal Space.
Além de definir Mojica como um "herói do cinema brasileiro", Barcinski pontua que seu biografado sempre foi 100% independente e "nunca fez parte de nenhuma turma ou movimento do cinema brasileiro".
— Ele fazia filmes desde os anos 1940. Sempre fez tudo sozinho e é isso que destaca ele. Seus filmes são absolutamente sem compromisso com o comercialismo e se as pessoas acham bom ou ruim. Mojica sempre botava o que ele achava o que era bom — explica, emocionado, a GaúchaZH.
Personagem que virou um sinônimo de maldade, Zé do Caixão transcendeu a imagem de ser apenas uma figura do cinema nacional, como evidencia o jornalista:
— O Mojica é um gigante da cultura brasileira, que criou um personagem que entrou para o folclore brasileiro. Como o Saci Pererê, a Mula-Sem-Cabeça, tem o Zé do Caixão! Um caso único no mundo, talvez, de um cara que criou algo para o cinema e entrou para o folclore.
Dos longas de Zé do Caixão, Barcinski destaca os lançados na década de 1960: À Meia-Noite Levarei Sua Alma (1963), Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver (1967), O Estranho Mundo de Zé do Caixão (1968) e O Despertar da Besta (1970). E ainda comenta que o cineasta é considerado revolucionário por ter inovado na forma de fazer cinema:
— Zé do Caixão é um personagem fantástico, radical, terceiro mundista. Mojica é o grande nome do cinema de terror do terceiro mundo, não tenho menor dúvida disso. Os filmes dele são experiências, não tem comparação com nada do que era feito lá fora.
Despedida
Amigo de Mojica há 35 anos, Barcinski o considerava "um segundo pai mesmo", que lhe inspirou independência e o espírito alternativo.
— Nunca vi o Mojica falar mal de ninguém, ele era de uma humildade completa que não tinha noção do quanto ele era genial. Se fazia um trabalho excelente, não tinha um pingo de arrogância ou de nada, era um sujeito maravilhoso que vai fazer muita falta para o cinema brasileiro.
O biógrafo também ressalta que Mojica foi reconhecido pelo público e pela crítica ainda durante a vida, diferentemente do que ocorre com muitos artistas brasileiros:
— Mojica teve a sorte de ter os seus filmes lançados no Exterior nos anos 1990 e isso criou uma nova legião de fãs. Deu a ele uma sobrevida. Nos últimos 20 anos, Mojica viu como era admirado e como o seu cinema era único e autêntico. Isso foi muito bom, e merecido — finaliza.