Até hoje Carlos Eduardo Robledo Puch causa espanto e fascínio na Argentina: serial killer mais famoso do país, foi preso em 1972 e declarado culpado por 11 homicídios, um estupro, dois sequestros e 17 roubos à mão armada. Carlos tinha 20 anos quando foi detido e segue até hoje atrás das grades – é o prisioneiro há mais tempo confinado na Argentina. Com rosto delicado, sexualidade ambígua, olhos azuis e cabelo loiro e cacheado, recebeu alcunhas como Anjo da Morte e Anjo Negro. E sua história nada angelical inspirou o filme O Anjo, que entrou em cartaz nos cinemas nesta quinta-feira (18).
Dirigido por Luis Ortega, de filmes como Caja Negra (2002) e Lulu (2014), e produzido pelo renomado cineasta espanhol Pedro Almodóvar, O Anjo estreou no Festival de Cannes de 2018, na mostra Um Certain Regard, e representou a Argentina na disputa pela indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 2019.
Para viver Carlos, foi escalado o cantor de rap Lorenzo Ferro, também conhecido por Kiddo Toto. Ator estreante, e logo como protagonista de um longa-metragem muito badalado em seu país, Lorenzo mimetiza a aparência do criminoso na juventude – lembra ainda uma versão loira de Pete Doherty, guitarrista e vocalista da banda inglesa The Libertines.
Inspirado na história real, mas com uma interpretação livre do caso, O Anjo acompanha Carlos desde a sua adolescência, no começo dos anos 1970, realizando furtos em casas de classe alta em Buenos Aires. Na primeira cena do filme, o jovem invade despreocupadamente uma mansão para pegar o que lhe der na telha. Logo, começa a dançar ao som de El Extraño de Pelo Largo, canção de 1968 da banda argentina La Joven Guardia. O crime para Carlos é fluido, como um passo de balé. Na narração em off, afirma ser contra a propriedade privada: “Sou ladrão de nascimento, não creio em ‘isto é teu e isto é meu’”.
Filme retrata um assassino desconectado da realidade
Integrantes da classe média, os bondosos pais do jovem delinquente, Aurora (Cecilia Roth) e Héctor (Luis Gnecco), não conseguem lidar com os impulsos criminosos do filho. Talentoso como gatuno, entrando e saindo de lugares sutilmente, Carlos desperta a atenção de Ramón (Chino Darín, filho do astro portenho Ricardo Darín), seu colega de escola – personagem inspirado em Jorge Ibáñez, cúmplice do Anjo da Morte na vida real. Em cena, os dois mantêm uma tensão dúbia, como se a qualquer momento fossem tanto se beijar quanto se agredir.
Atraído pelo novo amigo, Carlos é convidado a conhecer o ex-presidiário José (Daniel Fanego), pai de Ramón. Os três se unem para roubar estabelecimentos comerciais e casas. No entanto, crimes que deveriam ser discretos acabam resultando em pilhas de cadáveres.
Em boa atuação de Lorenzo Ferro, Carlos é retratado como um sujeito displicente, sociopata e egoísta, cujo único propósito consiste em roubar os outros. Carros, quadros ou joias existem para ele se apropriar e jogar fora. O magnetismo de sua personalidade e beleza o fizeram ganhar fãs nos anos 1970, como se fosse um popstar – a atriz Cecilia Roth contou que ela e suas amigas carregavam fotos do delinquente quando jovens.
Há um apelo pop em O Anjo, na sua ambientação colorida dos anos 1970, à la Andy Warhol (realçada pela caprichada direção de fotografia de Julián Apezteguia), e na trilha sonora embalada pelo rock argentino da época. Com esse ritmo, o filme entrega a história feroz de um criminoso sem romantizá-lo ou julgá-lo. Ilumina um sujeito perversamente desconectado da realidade.
Vida e Prisão
- Nascido em Buenos Aires, Carlos Eduardo Robledo Puch (foto abaixo) tem hoje 67 anos e está preso há 46.
- Aos 20 anos, foi declarado culpado por 11 homicídios, um estupro, dois sequestros e 17 roubos à mão armada.
- Em 1973, escapou da prisão e ficou 68 horas em liberdade, até ser capturado novamente. Em 1980, foi condenado à prisão perpétua.
- Em suas tentativas de liberdade condicional, alegou que seu parceiro Ibáñez foi o verdadeiro responsável pelos crimes.
- Segundo o site argentino Infobae, Carlos sonhava em ser interpretado no cinema por Leonardo DiCaprio em um filme dirigido por Martin Scorsese.
- Ele também pretendia escrever o roteiro do filme na cela, na sua máquina de escrever Olivetti.