— Os eleitores de Bolsonaro que acharam que estavam votando no capitão Nascimento talvez tenham votado no Rocha, o chefe da milícia.
A opinião é do cineasta José Padilha, diretor de Tropa de Elite e Tropa de Elite 2 - filmes que descrevem a atuação de milicianos nas engrenagens da política, em especial no Rio de Janeiro, e que tiveram grande impacto cultural no país.
O capitão Nascimento, interpretado por Wagner Moura nos longas, era o agente do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) que ultrapassava qualquer tipo de fronteira ética ou legal para combater o crime. O major Rocha, interpretado por Sandro Rocha, era o policial corrupto que passava a controlar o tráfico na comunidade.
Assim que vieram à tona as acusações de que o senador eleito Flávio Bolsonaro havia comissionado em seu gabinete a mãe e a mulher de um ex-capitão da PM suspeito de chefiar milícias, pipocaram comparações com os filmes de Padilha e até sugestões para filmagens de um Tropa de Elite 3.
Em entrevista à reportagem por e-mail, o diretor diz achar "muito estranho" o cargo em comissão indicado pelo filho do presidente a parentes do policial Adriano Nóbrega.
— [Ele é] considerado por muitos policiais que conheço no Bope como um policial matador e supostamente envolvido na morte de bicheiros, presidentes de escolas de samba e milicianos inimigos — diz Padilha.
Em sua defesa, o parlamentar afirma que as nomeações foram atribuídas por seu ex-assessor, o ex-policial militar Fabrício Queiroz, cujas movimentações financeiras foram consideradas como atípicas pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).
Padilha diz considerar Jair Bolsonaro um político "unfit for office", isto é, inapto para o cargo. Isso não significa, contudo, que ele faça o coro dos petistas, que antagonizaram com o presidente nas últimas eleições. Haddad, diz o diretor, também era inapto.
O cineasta ganhou o Urso de Ouro, prêmio máximo do Festival de Berlim, graças a Tropa de Elite. Em fevereiro, é o ator principal de seu longa, Wagner Moura, que retorna à prestigiosa mostra alemã com Marighella, cinebiografia do guerrilheiro que lutou contra a ditadura militar.
Padilha diz que fica feliz por Moura.
— É o meu festival preferido. Está de parabéns, e isso indica que deve ser um filme incrível.
Procurada, a assessoria da Presidência da República afirmou que não comentará a entrevista do cineasta.