Durante entrevista coletiva após a exibição de 10 Segundos para Vencer na mostra competitiva nacional do Festival de Gramado, no fim do mês passado, o diretor José Alvarenga Jr. elencava o que era a maior dificuldade de produzir um filme a respeito da vida de Éder Jofre, mais do que a já complicada coreografia das lutas.
– É fácil contar a trajetória de um personagem falho. Difícil era encontrar conflito na trajetória de um homem como Éder Jofre, um atleta que não bebia, não fumava, amava a família e foi casado a vida toda com a mesma mulher – brincou Alvarenga.
A solução encontrada pela produção de 10 Segundos para Vencer, cinebiografia do pugilista brasileiro duas vezes campeão mundial em duas categorias diferentes, foi tornar ponto de conflito o mesmo elemento que ajudou a fazer de Éder um vencedor: sua relação com o pai, o ex-boxeador e treinador argentino Kid Jofre, vivido com brilho por Osmar Prado em uma performance vencedora do Kikito de melhor ator em Gramado.
Para além de ser uma cinebiografia tradicional do paulistano transformado em herói popular após se tornar campeão mundial da categoria peso galo em 1960, 10 Segundos para Vencer opta por um recorte que enfoca também a relação por vezes tumultuada do boxeador com sua família, uma linhagem fortemente vinculada à “nobre arte”. Além de Kid, tem grande importância no começo da trama a figura de Zumbanão (Samuel Toledo), tio do protagonista – e, durante a infância de Éder, a grande aposta da família de poucos recursos para formar um boxeador campeão, mas que teve sua carreira abortada pelo temperamento irresponsável.
Lutas dinâmicas são destaque
Dando atenção tanto à trajetória de Éder (em boa interpretação de Daniel de Oliveira) quanto ao ambiente que o formou, o filme se constrói como um drama competente, enfocando o conflito entre o jovem dividido entre uma vida mais tradicional, cursando a faculdade de Desenho Industrial, e a disciplina espartana aplicada com mão de ferro pelo rígido e austero Kid. Uma tensão que se intensifica na vida adulta de Éder, já um boxeador de renome, tentando conciliar sua rotina de preparações, viagens e lutas com seus anseios de ser um homem normal e um pai presente para a família que formou com sua esposa Cida (vivida por Keli Freitas). Éder luta por si próprio ou por sua família? Mais tarde, a dúvida se amplia: agora ele luta por si mesmo ou por um país que o transformou em um herói?
Raro exemplar brasileiro de uma longa lista de filmes sobre o boxe na história do cinema (que vai de Punhos de Campeão até Creed, passando por Rocky: Um Lutador, Touro Indomável e Menina de Ouro, entre outros), 10 Segundos para Vencer consegue se perfilar com dignidade nessa tradição. As lutas encenadas no filme são ágeis, dinâmicas e brutais como convém às categorias pelas quais Éder lutou, peso galo e peso pena, de pugilistas mais leves e rápidos.
Embora o elenco não tenha pontos fracos, um ponto forte se eleva acima dos demais, Osmar Prado. Sua voz, seus gestos austeros, seu olhar firme compõem um personagem inesquecível, alma de uma produção que sabe qual é a verdadeira história de um filme de boxe: a luta solitária de um indivíduo.
10 segundos para vencer
De José Alvarenga Jr. Drama. Brasil, 2018, 120min, 14 anos.