Por Daniel Bydlowski
Artista brasileiro de realidade virtual, doutorando na Universidade da Califórnia (EUA)
Em cartaz nos cinemas, Os Incríveis 2 conta a história da família Pera, que tenta conquistar espaço em uma sociedade que não dá a chance de eles usarem seus superpoderes para salvar vidas. Trata-se de um enredo que faz pensar a história e os avanços da linguagem da animação, hoje desenvolvida tanto no que diz respeito à técnica quanto às histórias contadas.
Os desenhos animados começaram ainda na era paleolítica. Os retratos de animais pré-históricos pareciam se mover quando as cavernas eram iluminadas pelo fogo, graças à cintilação e aos movimentos das tochas, que só jogavam luz sobre alguns elementos do desenho de cada vez.
E essa era apenas uma das técnicas usadas pelo homem pré-histórico para dar vida a figuras inanimadas, um objetivo que desde então foi aprimorado, encontrando no cinema o meio perfeito para seu desenvolvimento. O encontro da animação com a arte cinematográfica aconteceu em 1908, quando o artista francês Émile Cohl criou Fantasmagorie, o primeiro desenho de animação tradicional, ou seja, com desenhos pintados à mão.
Fantasmagorie apenas mostra homens de palito em movimento. Mas foi a partir dessa técnica que os estúdios Disney se desenvolveram. Começando com desenhos cômicos, a Disney inovou animando criaturas antropomórficas, como o Mickey Mouse, e também descobrindo que a animação pode ser usada para contar histórias de cunho emocional.
Foi com A Branca de Neve e os Sete Anões (1937), o primeiro longa-metragem animado, que a Disney mostrou que os desenhos podem ter impacto emocional como qualquer filme. Pela primeira vez, os animadores tiveram a impressão de que um desenho poderia falecer, quando a personagem Branca de Neve caiu no chão de uma grande altura. Havia a preocupação com a personagem – como se esta fosse real. Está aí a origem dos enredos complexos desenvolvidos nos desenhos modernos, nos quais o público torce para que personagens animados consigam seus objetivos. Ou, em Os Incríveis 2, que a família superpoderosa consiga salvar a cidade.
Enquanto desenhos à mão se desenvolviam a cada ano, uma outra técnica de animação também evoluía – o stop-motion, no qual bonecos e objetos são fotografados a cada vez que mudam de posição. Quando as fotos são colocadas em sequência, há a impressão do movimento. Essa técnica, que começou em 1897, produziu bonecos cada vez mais complexos que fazem parte não somente de animações consagradas, como A Fuga das Galinhas, dos estúdios Aardman, mas também de filmes live action, como Star Wars (no clássico universo dessa série, o transporte AT-AT walker original foi criado com o stop-motion).
Foi nos anos 1940 que o desenvolvimento de uma nova técnica de animação possibilitou a criação de filmes como Os Incríveis: a animação por computador, conhecida como CG ("computer graphic"). Depois de anos subsistindo em formas primárias, o CG se expandiu nos anos 1990 em filmes como Jurassic Park. Mas, antes disso, artistas e estúdios de Hollywood já pensavam em usar a tecnologia para criar animações. Em 1974, a Pixar surgiu, fundada por Alexander Schure, dono de uma empresa de animação tradicional que acreditava na possibilidade de os efeitos serem realizados por computadores.
A empresa sempre foi cobiçada e mudou de mãos várias vezes e, mesmo com curtas de sucesso vencedores, como Luxo Jr., a empresa realmente se firmou com seu primeiro longa, Toy Story, em 1995. Essa animação usa tanto as técnicas tradicionais quanto de stop-motion, construindo expressões faciais a partir das emoções humanas desenvolvidas pela Disney e os corpos de personagens a partir de um esqueleto, o que possibilita os movimentos complexos. A animação CG também inova por si própria, sempre desenvolvendo técnicas que vão da textura de objetos à gravidade. Tudo para dar à animação uma sensação cada vez mais real, ainda que mantendo seu aspecto caricato.
Em Os Incríveis 2, uma produção da Disney e da Pixar, todas essas técnicas se fazem presentes simultaneamente. Das expressões faciais da animação tradicional à tridimensionalidade dos corpos do stop-motion, passando pela textura real do CG, todas têm o mesmo objetivo perseguido desde o homem paleolítico: dar vida a objetos inanimados.