Dramaturgia enxuta, com poucos diálogos, ausência de trilha sonora e personagens aparentemente apáticos diante de um impasse cujo enfrentamento se mostrará decisivo para sair da inércia. Mas esse processo não se mostrará com a recorrente grandiloquência cinematográfica.
São essas algumas marcas autorais perceptíveis no trabalho do diretor argentino Pablo Giorgelli, que apresenta seu segundo longa-metragem, Invisível, em cartaz desde quinta-feira em Porto Alegre.
Com um registro naturalista que lembra o estilo consagrado pelos irmãos belgas Luc e Jean-Pierre Dardenne em seus dramas sociais, Invisível acompanha uma jornada de dias decisivos na vida de Ely (Mora Arenillas), estudante de 17 anos – mas que se apresenta a uma interlocutora como já maior de idade e fora da escola. A garota descobre estar grávida do filho do dono da pet shop em que trabalha, em Buenos Aires. Seu amante ocasional é casado e tem um filho. O relacionamento é secreto e sem maior interesse de ambos além do sexo casual. De pronto, Ely decide que não quer ter a criança. Com a ajuda de uma colega de aula, começa a pesquisar na internet sobre aborto, procedimento ilegal na Argentina, como no Brasil, em casos como o seu. Tem início então um périplo que coloca a protagonista diante do acesso a medicamentos via mercado negro e também da opção por uma clínica que faz abortos de forma clandestina.
Invisível, porém, mostra que o foco de Giorgelli é menos sob os aspectos legais e morais que cercam o tema, a discussão em torno do livre-arbítrio de Ely sobre seu corpo e os riscos envolvidos. Ao diretor interessa mais destacar o turbilhão emocional imposto por uma escolha que, seja qual for, terá de ser feita com urgência por uma jovem solitária – o socialmente invisível a que se refere o título do filme – e desprovida tanto de recursos financeiros quanto de amparo afetivo — a mãe sobrevive em permanente torpor, e o amante, lógico, quer resolver logo a situação.
A solidão de Ely é a mesma do protagonista de As Acácias, que, entre outros prêmios, valeu a Giorgelli a Câmera de Ouro de melhor longa de diretor estreante no Festival de Cannes de 2011: um caminhoneiro argentino que dá carona a uma mulher paraguaia e seu bebê numa viagem de Assunção a Buenos Aires. Ao longo da estrada, o motorista bronco que passou boa parte da vida na boleia passa a vislumbrar um horizonte que o leva além daquela vida sem graça cumprida no piloto automático.
E é no interior de um carro que os caminhos de Ely são traçados, do prazer à dolorosa decisão. Mas ela terá de percorrê-los sozinha e com as próprias pernas.
Assista ao trailer:
INVISÍVEL
De Pablo Giorgelli. Drama, Argentina/Brasil, 2017, 90min, 16 anos. Salas e horários: CineBancários (17h), GNC Moinhos 4 (13h20, 15h15, 19h35), Guion Center 1 (19h35) e Guion Center 3 (13h50).