Ícone do Cinema Novo, o ator baiano Antônio Pitanga falou em entrevista coletiva nesta quarta-feira sobre política e cinema brasileiro, além de clamar por uma união de todos os setores da cultura. Esta noite, o artista de 78 anos receberá o Troféu Cidade de Gramado, que destaca nomes vinculados à cidade e ao festival de cinema. Ele é presença constante no evento – seja como concorrente, convidado ou espectador.
O ator começou a coletiva comentando sobre o documentário Pitanga, dirigido por Beto Brant e sua filha Camila Pitanga. Lançado este ano, o filme retrata a vida do ator baiano.
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– Camila e Beto tiveram a sensibilidade humana para contar a minha história. O que me emociona no conjunto da obra é representar uma geração que estava conectada com o mundo, com Cacá Diegues e Glauber Rocha – disse o ator, que relatou ter visto o longa umas 10 vezes.
Pitanga voltou a exaltar a sua geração do Cinema Novo:
– Naquela geração está genuinamente a brasilidade nas telas, levantando uma bandeira brasileira. Isso me emociona muito.
Na coletiva, o ator lamentou a atual situação política do país.
– Infelizmente o tempo é tão curto que aquela festa que a gente organizava em um Brasil justo vê que agora está piorando de novo. Velho não faz revolução, a gente acompanha – ressaltou.
Para Pitanga, ninguém quer entender a importância da cultura e falta unidade entre seus participantes.
– A cultura é esse instrumento, e nós da cultura precisamos entender essa importância. Nos anos 1960. Todos eram de um corpo só. Não era só da dança, do cinema ou do teatro. O que falta na gente é companheirismo, entender que tanto quem faz artes plásticas ou cinema está em um corpo só. Nós somos muito mais fortes que leis de incentivo porque a gente é um coração que pulsa. Porque se depender do governo vai continuar como está – declarou.
Segundo Pitanga, o cinema brasileiro é o melhor do mundo.
– Ainda não caiu a ficha do brasileiro, mas aqui se faz o maior e melhor cinema do mundo. Eu vejo que hoje há grandes cineastas do Oiapoque ao Chuí de variadas culturas fazendo grandes obras sem apoio. Você tem um potencial de cultura muito maior que todos esses países pequeninhos que fizeram sucesso mundial. Já estamos fazendo o melhor cinema do mundo, só falta vitrine – destacou.
Pitanga também abordou a discriminação racial.
– Discriminação eu sempre enfrentei, não no cinema, mas na vida, na minha formação. Vim de uma família muito pobre, e a cultura abriu meus neurônios, meu coração e minha alma a entender a importância da minha brasilidade. Eu sempre tive companheiros que tinham projetos relacionados ao Brasil. Eu não estava ali como ator negro. Eu sou um ator, sempre falei isso. Hoje se tem outros tipos de apelos ou de condição de levar toda a sua discussão. Na nossa época, não tinha como. Eu nunca cunhei em mim nenhum ranço: olho, registro e caminho. Acho que aquele que tem a pobreza de ser racista vai viver assim tão pobre. Eu tenho muito mais a caminhar. Nós ainda não chegamos a lugar nenhum na questão racial, temos muito a conquistar na democracia racial, mas eu acho que a gente tem feito uma caminhada muito dignificante – refletiu.
Com mais de 50 filmes no currículo, mais de 40 atrações na TV e 60 anos de profissão, Pitanga trabalhou com importantes diretores brasileiros – como Glauber Rocha, Cacá Diegues, Anselmo Duarte, Walter Lima Jr., entre outros. No cinema, ele atuou em filmes como O Pagador de Promessas (1962), Barravento (1962), Ganga Zumba (1963), Menino de Engenho (1965), A Grande Cidade (1966), Quando o Carnaval Chegar (1972), Joanna Francesa (1973), A Idade da Terra (1980), Rio Babilônia (1982) e Quilombo (1984). Ele também trabalhou atrás das câmeras, dirigindo Na Boca do Mundo (1978).