A história de Estrelas Além do Tempo (2016) é tão inspiradora quando surpreendente: no começo dos anos 1960, quando os Estados Unidos testemunhavam a ebulição da luta pelos direitos civis dos afro-americanos e a expansão do movimento feminista, um grupo de mulheres negras matemáticas foi fundamental para que a Nasa alcançasse os soviéticos na corrida espacial. A produção que entra em cartaz nesta quinta-feira na Capital conta a trajetória real de três dessas brilhantes pioneiras, interpretadas por um talentoso e premiado trio: Taraji P. Henson, Octavia Spencer e Janelle Monáe. As atrizes e seus colegas ganharam no último domingo o troféu de melhor elenco segundo o Sindicato dos Atores de Hollywood (SAG), sendo que Octavia concorre ainda ao Oscar de atriz coadjuvante – Estrelas Além do Tempo disputa também as estatuetas douradas de melhor filme e roteiro adaptado.
O drama biográfico dirigido por Theodore Melfi (realizador da comédia dramática Um Santo Vizinho) é baseado no livro homônimo de Margot Lee Shetterly, publicado recentemente pela editora HarperCollins Brasil, que traz à luz o incrível episódio das chamadas "computadores humanos": mulheres afrodescendentes especialistas em cálculos complexos recrutadas pela incipiente indústria aeronáutica norte-americana durante a II Guerra para suprir a falta de mão de obra especializada, que seguiram prestando serviços posteriormente no programa espacial do país. Estrelas Além do Tempo acompanha a chegada de Katherine Johnson (Taraji), Dorothy Vaughn (Octavia) e Mary Jackson (Janelle) à Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço, a Nasa, em um período delicado da disputa entre as superpotências pela primazia sideral: no começo de 1961, a URSS preparava-se para colocar o primeiro homem no espaço, enquanto os EUA ainda não tinham conseguido lançar nem uma bola de beisebol lá em cima. Em meio a um ambiente machista e segregado, Katherine, Dorothy e Mary vão se destacar e mostrar seu valor graças a sua inteligência, determinação e liderança. O caminho dessa afirmação, porém, será duro: mesmo contando com a compreensão do diretor do programa (interpretado por Kevin Costner, em ótima atuação), as profissionais enfrentarão o preconceito e o descrédito dos colegas brancos e de superiores como o matemático chefe (Jim Parsons, o Sheldon Cooper do seriado Big Bang Theory) e a supervisora geral das "computadores" (Kirsten Dunst).
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O grande atrativo de Estrelas Além do Tempo, para além da força e da pertinência do episódio histórico que recupera, é sem dúvida sua trinca de protagonistas, formada por atrizes que brilham equanimemente na tela e vêm ganhando projeção em Hollywood: Taraji P. Henson foi indicada ao Oscar de coadjuvante por O Curioso Caso de Benjamin Button (2008) e acaba de arrebatar um Globo de Ouro pela série Empire, Octavia Spencer já foi oscarizada como coadjuvante em Histórias Cruzadas (2011) e a ótima cantora de soul e r&b Janelle Monáe está também no filme Moonlight: Sob a Luz do Luar, vencedor do Globo de Ouro de melhor drama. O diretor e roteirista Theodore Melfi dosa com equilíbrio crítica social, drama, humor, registro documental – mesclando à ficção cenas de filmes de época sobre os lançamentos de foguetes russos e norte-americanos e os protestos contra a segregação racial – e até mesmo romance. Essa simetria, entretanto, é também o problema de Estrelas Além do Tempo: tudo é tão bem calculado e didático em cena que o filme acaba desbastando seu vigor em favor de um resultado palatável e facilmente assimilável por qualquer público.
ESTRELAS ALÉM DO TEMPO
De Theodore Melfi.
Drama, EUA, 2016, 127min.
Cotação: 3 de 5.