O guerreiro olha para cima, implorando e espantado, para a jovem que o está decapitando, uma explosão de violência sobre tela que pode ser uma obra-prima de Caravaggio... ou uma mera cópia.
O mistério talvez será desvendado nesta quinta-feira (28) durante a apresentação em uma galeria londrina, após dois anos de restauração, desta pintura da Renascença que alguns consideram como a última grande obra do gênio milanês.
A tela de 144x173 centímetros, que representa o episódio bíblico de Judite decapitando o general assírio Holofernes para defender a cidade de Betulia, foi descoberta em 2014 em um loft da cidade francesa de Toulouse, uma descoberta considerada "muito importante" pelo Ministério da Cultura da França.
Michelangelo Merisi da Caravaggio mencionou a existência de um trabalho semelhante em uma carta para um amigo. Mas a atribuição de pinturas ao mestre, que morreu aos 38 anos em 1610, é muito complicada porque ele não assinava seus trabalhos e porque os mesmos eram copiados com frequência.
Caravaggio já tem um trabalho intitulado Judite e Holfernes, que pintou em 1598 e é muito diferente do encontrado na França.
Os proprietários do quadro recorreram a um especialista francês, Eric Turquin, que está convencido de que se trata de um Caravaggio.
Outro especialista mundialmente conhecido do pintor italiano, Nicola Spinosa, afirmou em 2016 que também via nessa obra "um Caravaggio autêntico".
— É de uma qualidade excepcional e corresponde ao período mais importante do artista, por volta de 1605, época em que ele melhor traduz na pintura o drama dos homens — acrescentou.
Outros conhecedores da obra de Caravaggio, entretanto, estão menos convencidos e atribuem essa pintura a Louis Finson, um pintor flamengo (1580-1617) que foi seu contemporâneo e copista.
Em todo o caso, a obra não entrará para nenhuma coleção do Estado francês. Depois de declarar a obra um tesouro nacional, o que impediu a sua venda no exterior até novembro de 2018, o governo deixou passar o prazo de 30 meses para poder adquiri-lo.
A falta de certeza sobre a autenticidade ou o alto valor estimado (120 milhões de euros, cerca de R$ 511 milhões) da pintura poderia ter influenciado a decisão do Estado de não adquiri-la, num momento em que o orçamento dos museus é limitado.
O trabalho poderá ser leiloado no final da próxima primavera (boreal), segundo a empresa especializada no mercado de arte Artprice, em uma venda organizada pelo especialista Eric Turquin em Toulouse, após uma turnê no exterior.