Aproximar o público dos museus é um desafio permanente para as instituições culturais brasileiras. Pelo menos por uma noite, em Porto Alegre, esse problema foi resolvido. Pessoas de todas as idades lotaram as 10 instituições que participaram da segunda edição da Noite dos Museus. Para algumas delas, foi a chance de conhecer espaços nunca frequentados.
O sucesso da primeira edição do evento, que reuniu 16 mil pessoas em 2016, já indicava que a segunda teria um grande público. A programação ampliada e a colaboração de São Pedro, que retardou a chuva até as 23h30min, colaboraram para manter mais gente na rua até o final do evento. Se por um lado era bonito ver tanta gente procurando museus que passam a semana vazios, o grande volume de público acarretou problemas como longas filas e dificuldade de locomoção entre um ponto e outro.
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Realizado pela produtora Rompecabezas, a Noite dos Museus promoveu pocket shows em 10 espaços entre 19h e 0h deste sábado: Museu de Arte do Rio Grande do Sul (MARGS), Museu de Arte Contemporânea (MACRS), Museu de Porto Alegre Joaquim Felizardo, Museu da UFRGS, Memorial do Rio Grande do Sul, Planetário, Pinacoteca Ruben Berta, Fundação Iberê Camargo, Instituto Goethe e Museu Julio de Castilhos. Zero Hora circulou por alguns destes locais durante a noite. Veja como foi:
19h30min, Memorial do Rio Grande do Sul
A noite começou em clima nativista, com show de Renato Borghetti, Renato Müller e a Fábrica de Gaiteiros às 19h30min. Cerca de 15 crianças representantes das mais de 300 que participam do projeto executaram clássicos regionais e foram ovacionadas pelo público.
– Cada vez que eu escuto essa meninada tocar, eu me emociono. E isso passa para as pessoas – disse o Borghettinho a ZH, ao final do show.
A lotação era tanta que alguns reclamaram de calor e outros optaram por circular pelas exposições do Memorial. A trilha nativista vinha a calhar já que as mostras ensinavam sobre a indumentária gaúcha e a história do Rio Grande do Sul.
20h, Instituto Goethe
Ao fim da apresentação da Orquestra de Flautas Transversas do Instituto Popular de Arte-Educação (IPDAE), o público que pedia “mais um” foi atendido com “Tico-tico No Fubá”. A curta exibição da orquestra, de 20 minutos, cativou dezenas de pessoas, como a doméstica Marizete Viana, de São Lourenço.
– Muito bom! Gostei de tudo aqui, tanto das músicas quanto da exposição Ponto de Partida, da artista Anico Herskovits – avaliou.
É a segunda vez de Marizete na Noite dos Museus – no ano passado, ela acompanhou o evento na Fundação Iberê Camargo:
– Já fui duas vezes no Iberê e no Margs. É a minha primeira vez aqui, mas não deve ser a última, pretendo voltar.
20h30min, Margs
A fila iniciava na entrada do Margs, estendendo-se até a lateral do Santander Cultural. Por causa disso, muita gente acabou perdendo o início do show de Bebeto Alves, que se apresentou em meio à exposição Pro Posições. Apesar do burburinho do público, a acústica ampliou o som do show no formato voz e violão.
Muita gente se intimidou com o tamanho das filas e preferiu passar o tempo na Praça de Alfândega, que contava com food trucks vendendo comidas e cerveja artesanal, além de reforço policial e uma ambulância a postos.
21h15min a 22h30min, Museu de Porto Alegre Joaquim Felizardo
Quem caminhava pela Rua João Alfredo conseguia ouvir a batida da roda de capoeira que rolava no jardim do Museu de Porto Alegre Joaquim Felizardo, onde a programação de toda a noite foi dedicada à celebração da cultura afro. O clima era de piquenique, com muita gente distribuída pela grama do amplo jardim.
As galerias do Museu também atraíram os visitantes, como Alerson Cachoeira Cândido, que ainda não conhecia o espaço.
– Estou aprendendo bastante coisa sobre a história antiga de Porto Alegre – afirmou o funcionário público, que olhava atentamente para documentos da mostra.
A mediadora Suzana Pohia aproveitava a oportunidade para falar aos novos visitantes sobre o trabalho desenvolvido no museu e convidá-los a voltar.
– É maravilhoso ver o museu cheio. Ele existe para isso! – comemorou.
Às 21h45min, Negra Jaque subiu no palco ao ar livre para mostrar seu repertório permeado por discursos sobre empoderamento feminino.
– São poesias, mas é uma contestação a tudo. Ao que acontece de ruim com os jovens. As coisas ruins a gente tem que canalizar para a arte – disse a cantora à ZH.
Entre o público, jovens vidrados na artista, que é uma revelação do hip hop no Estado.
– Me identifico com tudo o que ela disse – falou a estudante de dança Naiara Teixeira Baptista, de 25 anos.
Entusiasmada com o show, Naiara impressionou o público com uma coreografia de dança de rua em frente ao palco.
– Tiveram que me empurrar para dançar aqui na frente do palco, mas, no fim, deu tudo certo – disse ela, entre risos.
23h, Fundação Iberê Camargo
Executada no térreo da Fundação Iberê Camargo por Amauri Iablonovski e Michel Dorfman, a canção “Se acaso você chegasse” ecoava por todo o prédio, enquanto o público acompanhava das rampas. Mais de 2.950 pessoas passaram pela porta do edifício ao longo da noite. A maioria se concentrou na mostra NO DRAMA, com quadros de Iberê Camargo, como a manicure Letícia Pedroso, de 37 anos, e as filhas Beatriz, de 8 anos, e Sofia, de 10.
– Eu nunca tinha ido a um museu. Minha mãe nunca me levou. É muito bom poder descobrir isso com elas – disse Letícia, que se surpreendeu ao saber que a entrada à FIC é sempre gratuita, não apenas naquela noite.
As filhas admiraram-se com o edifício da Fundação e repararam nas telas de Iberê:
– Não é bonito, mas tem um significado – arriscou Sofia.
Para a Fundação, que empreende um esforço para democratizar o acesso ao museu, a Noite dos Museus é uma inspiração e um fenômeno a ser investigado:
– É muito raro ver esse público de A a Z num espaço de arte. Se tiver que acontecer de madrugada, que seja. O que me surpreende é como uma coisa tão simples consegue reunir esse número de pessoas. Quero entender porque tanta gente vem hoje e não nos outros dias – disse Bernardo de Souza, diretor-artístico da FIC.