Ele bem que poderia ter sido jóquei “por seu amor aos cavalos e pela leveza de sua estatura” — como diz a amiga Maria Tomaselli (com quem trabalhou no Atelier MAM de Litografia, nos anos 1980) —, mas Paulinho Chimendes se tornou um mestre das artes visuais. Desenhista e gravador, além de ser um dos artistas que trabalham há mais tempo de forma ininterrupta com litografia no Estado, ele completou meio século de atividades artísticas.
A data está sendo celebrada com uma exposição individual no Atelier Livre Xico Stockinger, no Centro Municipal de Cultura, na Capital. Com curadoria de José Francisco Alves, a mostra ficará em cartaz (com entrada franca) até o final de março.
Além disso, Chimendes recebeu homenagem na cerimônia de entrega do Prêmio Açorianos de Artes Plásticas (em dezembro passado) e teve a trajetória reconstituída no documentário Paulinho Chimendes — Meus olhos não são suaves, de Gilberto Perin e Emerson Souza (em agosto de 2022). Natural de Rosário do Sul, encantado com os panos de prato bordados pela avó, Chimendes, aos quatro anos, passou a rabiscar a laje do chão no pátio de casa com um pedaço de vara. Outra inspiração foi o cemitério defronte à chácara dos avós, com as figuras de anjos e santos nos mausoléus.
— Era o único lugar em que podia ter contato com a arte na cidade. Eu dizia que o cemitério era o meu museu — relembra.
Já na Capital, ingressou no Atelier Livre em 1966, aos 12 anos, época em que a escola funcionava no segundo andar do Mercado Público. Lá, teve aulas com Danúbio Gonçalves, Vasco Prado, Paulo Peres e Fernando Baril.
— Danúbio foi quem me lançou nas artes visuais. Digo sempre que foi meu padrinho – conta, orgulhoso.
Em 1972, abriu a primeira mostra individual (com desenhos de bico de pena) na galeria do Atelier Livre, que tinha se mudado para a Rua Lobo da Costa, na Cidade Baixa. Nos anos seguintes, por ter a pele mais escura do que os 13 irmãos (“era o diferente da família”), não teve receio de aderir à moda black power, um dos símbolos da rebeldia dos jovens da época.
— Não via negros nos ateliês, só a moça do cafezinho — comenta ele.
No início dos anos 1980, quando o Brasil ainda vivia sob o regime militar, era costume da turma sair dos ateliês diretamente para as mesas de bar. Ele carregava sempre a tiracolo uma pasta com suas gravuras. Certa noite, a moça da mesa ao lado pediu para olhar o que havia na pasta. “Não gostei”, disse ela. “Não tenho culpa se você não entende de arte”, respondeu Chimendes, sem desconfiar de que ela era policial. O artista passou um dia e meio no xadrez.
Além da questão social, outro destaque da obra de Chimendes — hoje responsável pela oficina de litografia do Museu do Trabalho – é o cotidiano de Porto Alegre, que aparece envolto em um clima de sonho e imaginação, sob a influência de surrealistas como Salvador Dali.
— Nem sempre é um olhar de alegria, mas é como eu vejo a cidade, com muitas pessoas miseráveis nas ruas e outras vivendo em condomínios atrás de grades, achando que estão seguras e não estão — conclui o artista.