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O nosso leitor Gustavo De Déa, 35 anos, que é agricultor e vereador em Nova Roma do Sul, na Serra, nos enviou o texto a seguir. Trata-se de uma homenagem ao avô dele, Anastácio De Déa, ex-pracinha da Força Expedicionária Brasileira (FEB), que lutou na Itália durante a Segunda Guerra.
A história de Anastácio De Déa é um misto de simplicidade, trabalho, cidadania e coragem. Muitos dos seus 97 anos vividos foram cheios de dificuldades, sempre enfrentadas com muita bravura. As mãos, a enxada e a foice foram os instrumentos com os quais trabalhou a terra pedregosa e íngreme da encosta do Rio da Prata, cultivando seus alimentos e vendendo algum excedente para comprar as coisas básicas do dia a dia.
Morador das proximidades da Capela São Valentin, em Nova Roma do Sul, na serra gaúcha, por quase 60 anos, Anastácio e seus irmãos tiveram uma infância muito penosa. Não raro, as frutas do mato ou as batatas roubadas na roça, cruas, serviam de almoço ou janta. Escola não havia. Aprendeu a ler e a fazer algumas contas com um tio que se disponibilizou a ensinar-lhe.
Aos 12 anos de idade, Anastácio começou a trabalhar. Tornou-se aprendiz de carpinteiro. Aprendeu rápido os segredos do martelo e do serrote e de como construir pequenas casas ou moinhos movidos a água. Em 1943, aos 21 anos, largou as ferramentas, juntou suas poucas roupas e lá se foi para Caxias do Sul prestar serviço militar. A expectativa era de ficar por lá um ano.
Esse era o período normal. Mas vivia-se um tempo de guerra, a Segunda Guerra Mundial. Antes do ano terminar, veio a convocação para integrar a Força Expedicionária Brasileira. O Brasil decidira entrar na guerra ao lado das forças aliadas. Seu destino: Itália. Havia, naquele país, uma operação esperando os soldados brasileiros. Após 14 dias de mar, desembarcam em Nápoli e, dali, por terra, para Stáffoli, nas imediações de Monte Castelo, um dos campos de batalha dos brasileiros.
Terminada a guerra, em 1945, a companhia em que Anastácio servia permaneceu por mais seis meses na Itália. Foi uma época de ajudar na reconstrução dos estragos provocados pelo conflito e, concomitantemente, um tempo de lazer. Da guerra, ficou uma ideia na mente de Anastácio: “Nem eu e nem os outros tínhamos raiva dos alemães. Nós nem conhecia eles. Mas a Guerra é assim, você mata para não morrer, sem saber o porquê e para quê”.
Ao retornar ao Brasil, voltou para sua velha atividade. Trabalhou como carpinteiro, pedreiro e, quando não havia serviço, trabalhava na lavoura. Casou-se com Amélia Vanzetto, com quem teve 16 filhos. Viveu seus últimos anos dedicando-se à família, aos amigos, aos cuidados a sua lavoura e a seu pomar. Sempre cultivou o hábito da pescaria, não dispensava uma saborosa polenta e queijo, gostava de uma boa e longa conversa, principalmente sobre suas experiências como expedicionário.
O “pracinha” faleceu no sábado passado, dia 30 de maio, em sua propriedade em Nova Roma do Sul, onde cuidava diariamente da sua lavoura de milho e de sua árvores frutíferas. Morreu trabalhando em seu pomar, podando as laranjeiras. Anastácio, que completaria 98 anos de idade no próximo mês de outubro, deixou um legado de heroísmo, amor à pátria e à família, que será sempre lembrado ao longo do tempo. Descanse em paz soldado 3949 da FEB.