
Na metade da década de 1960, o advogado Rui Sommer (1939-1972) ganhou uma boa grana numa ação judicial e resolveu acatar a sugestão de seu amigo Tatata Pimentel para que abrisse uma casa noturna em Porto Alegre, nos moldes dos clubes privé que eram moda na época. Assim, nasceu o Encouraçado Butikin, uma boate que marcou profundamente a vida social da Capital.

A logomarca da casa, a sereiazinha com boina da Marinha Imperial Russa, foi criada pelo cartunista Ziraldo. O endereço (Avenida Independência, 936), passou a ser a meca de quem queria diversão, boa bebida e shows imperdíveis. O nível era alto. A música eletrônica era discotecada pelo mestre Claudinho Pereira ou pelo DJ Gilberto. No salão, ficavam a elites local e visitante.
No palco, astros e estrelas como Chico Buarque, Elis Regina, Nara Leão, Elizeth Cardoso, Jorge Ben, Maria Bethânia, Maysa, Dick Farney e muitos outros. Dias atrás, nas redes sociais, o marchand Renato Rosa, um habitué tão assíduo quanto a alegre jornalista Gilda Marinho ou o colunista Paulo Raimundo Gasparotto, escreveu que, depois de um episódio de racismo, que acabou superado como um mal-entendido, ele e a artista plástica Magliani acabaram sendo, possivelmente, os únicos negros que frequentavam o local.
O compositor Lupicínio Rodrigues esteve em pelo menos uma oportunidade no Butikin: foi prestigiar o show de seus amigos Dorival Caymmi e Vinicius de Moraes. Muitas vezes, o traje adequado ali era black-tie. Situado no porão de um velho sobrado, o espaço foi planejado pelo arquiteto Milton Mattos, com um projeto ousado (e premiado) de arcadas e paredes com tijolos à vista e acesso por meio de uma longa escada de madeira, pela qual convidados e artistas chegavam ao clube.

Em plena ditadura militar, o nome escolhido, referência ao filme soviético de Serguei Eisenstein, o Encouraçado Potemkin (1925), que relata a revolta dos marinheiros de um navio da armada czarista em 1905, não foi bem digerido pelas autoridades. Alegando se tratar de material subversivo, a censura mandou retirar um painel fotográfico que decorava o fundo do ambiente com uma cena da famosa película. Apesar da inusitada suspeição, a alta sociedade, os ricos e famosos, os vips, intelectuais e artistas continuaram desfrutando, por quase uma década, daquele espaço de convivência, cultura e lazer. A fase áurea acabou com a morte de Rui Sommer, em 1972. Após passar por outras mãos, nos anos 1980 e 1990, um dia definhou e acabou.