A Revista do Globo número 490, de 3 de setembro de 1949, registra a passagem do escritor, filósofo, dramaturgo, jornalista e ensaísta argelino Albert Camus (1913-1960) pela Capital. Camus permaneceu em nossa cidade por menos de 24 horas, seguindo, logo depois, para Montevidéu. Ele mudou-se para a França, em 1939 (pouco antes da invasão alemã), principalmente devido às polêmicas com as autoridades francesas na Argélia.
O autor havia publicado uma série de ensaios sobre o tratamento que os árabes recebiam por parte dos franceses na Argélia, pois os árabes não eram considerados cidadãos franceses, sendo subjugados por um governo no qual nem ao menos podiam votar.
Vindo em missão de intercâmbio cultural, logo após a sua chegada, na tarde do dia 9 de agosto, ele foi recepcionado na sede da Associação Cultural Franco-Brasileira, com um coquetel que reuniu as figuras mais representativas dos meios literários locais. À noite, perante um enorme público, que lotou inteiramente o auditório do Instituto de Belas Artes, o autor de A Peste pronunciou a sua esperada conferência, parte da série que programou para a sua viagem à América do Sul.
O escritor Erico Verissimo, saudando o conferencista, disse: “Vós sois uma das mais claras, mais belas e corajosas vozes da França de hoje, temperada na forja da resistência. Vós representais o homem que se encontra oprimido entre um mundo que agoniza e um outro que nasce”. Aos 36 anos, falando durante quase duas horas de maneira ágil, vigorosa e elegante, o palestrante prendeu a atenção da plateia.
A mensagem de Albert Camus nessa conferência consistiu na denúncia das filosofias políticas da força e do mito pernicioso do heroísmo a todo preço. “Os homens devem cultivar a honra e a boa vontade”, afirmou ele, manifestando a sua decidida repulsa a toda e qualquer violência legitimada. E terminou dizendo: “Se por desgraça o escritor fracassa na sua generosa missão, mais vale enganar-se sem assassinar ninguém do que ter razão no meio do silêncio e dos túmulos”.
O seu trabalho profícuo inclui peças de teatro, novelas, notícias, filmes, poemas e ensaios, nos quais ele desenvolveu um humanismo baseado na consciência do absurdo da condição humana e na revolta como uma resposta a esse absurdo. Para Camus, essa revolta leva à ação e fornece sentido ao mundo e à existência.
“Nasce, então, a estranha alegria que nos ajuda a viver e a morrer”, concluiu o Prêmio Nobel de Literatura de 1957, que morreu em janeiro de 1960, aos 47 anos, vítima de um acidente de automóvel.