No Rio de Janeiro, o gaúcho nascido em Rio Pardo Manuel de Araújo Porto-Alegre (1806-1879) foi o criador, em 1837, da primeira charge publicada no Brasil: A Campainha e o Cujo, ao registrar o recebimento de propina pelo diretor do Correio Oficial, que era ligado ao governo. Essa charge se constitui num ícone de denúncia contra a corrupção.
Alguns anos se passaram para que, finalmente, a charge fosse inserida no cotidiano da imprensa gaúcha. O primeiro avanço ocorreu em 1849, em Porto Alegre, quando se instalou a primeira oficina litográfica. Com o nome de Litografia do Comércio de Pomatelli & Cia, seu principal gravador foi o alemão Guilherme Grote Tex. A Sentinella do Sul (1867-1869) foi o primeiro jornal gaúcho ilustrado. Suas charges retratavam a Guerra do Paraguai (1865-1870) e seus comandantes militares, além dos problemas da administração pública, como saneamento e iluminação.
Com talento e criatividade, Inácio Weingärtner (1845-1908) ilustrou as suas páginas. Na época, devido ao alto índice de analfabetos, nunca inferior a 80%, a presença da ilustração era um elemento fundamental na compreensão do conteúdo dos periódicos. Com o desenvolvimento da litografia (de lithos, pedra, e graphein, escrever), outros jornais ilustrados começaram a circular em nosso Estado.
Utilizando-se da charge como instrumento de crítica político-social, esses periódicos foram denominados por Athos Damasceno Ferreira (1902-1975) como "imprensa caricata". Em Porto Alegre, numa segunda fase, em 1874, circulou o semanário O Diógenes. Literário e crítico político, o jornal foi fundado por Luiz Cavalcanti de Albuquerque. Em 1877, circulou, também na Capital, o álbum humorístico A Lanterna, criado pelo político e jornalista alemão Carlos Von Koseritz (1830-1890). Naquele mesmo ano, o escritor e jornalista Miguel de Werna e Bilstein (1836-1896) fundou O Charivari. Embora jornais de circulação efêmera, esses três foram importantes no contexto sociopolítico da época.
Leia mais
Você já se comunicou por telegrama ou fonograma?
Livro retrata história da indústria gráfica do Rio Grande do Sul
Paradouro de Morro Reuter pode voltar a funcionar
Nascido em Sergipe, o famoso caricaturista e ilustrador Cândido Aragonez Faria (1849-1911) fundou, em Porto Alegre, o semanário ilustrado O Fígaro (1878-1879). Com a proposta de contemplar todas as camadas sociais, o jornal tinha a marca do humor refinado.
No dia 11 de novembro de 1880, O Século, um dos mais importantes jornais ilustrados, foi fundado, aqui, por Miguel de Werna. Circulando aos domingos, este semanário criticou os republicanos, apoiou o regime monárquico e participou da propaganda abolicionista. As charges eram assinadas por Araújo Guerra, Inácio Weingärtner e Joaquim Samaranch.
De acordo com Sérgio Dillenburg, o jornal parou de circular em 1893, sendo motivo de regozijo entre os algozes do seu polêmico editor. Exonerado do serviço público municipal, Miguel de Werna mudou-se para o Rio de Janeiro, onde morreu pobre e esquecido... Segundo o historiador Francisco das Neves Alves, o primeiro jornal ilustrado do interior do Rio Grande do Sul foi O Amolador (1874-1875). Fundado por Gaspar Alves Meira, em Rio Grande, contou com o litógrafo e desenhista Pedro Mozer. Após o seu encerramento, começou a circular O Diabrete (1875-1881), que era abolicionista e anticlerical. Henrique Marcos Gonzales, Constantino Alves do Amorim e Thádeo Alves do Amorim formam a tríade que ilustrou o jornal.
Na mesma cidade, circularam, também, os jornais ilustrados Maruí (1880-1882) e Bisturi (1888-1906). Em Pelotas, destacou-se O Cabrion (1879-1881) – "folha ilustrada de assuntos políticos e sociais" –, tendo como responsáveis Eduardo Chapon e Araújo Guerra. Crítico e ilustrado, o Zé Povinho circulou no primeiro semestre de 1883.
Outro destaque pelotense foi A Ventarola (1887-1890), que criticou de forma implacável o clero e o governo provincial. Alguns periódicos, que foram citados neste texto, fazem parte do acervo raro do Museu de Comunicação Hipólito José da Costa, de Porto Alegre.
Ao longo do tempo, a charge tem registrado, com humor irreverente e criativo, o olhar crítico dos artistas, levando-nos a refletir acerca da sociedade da qual fazemos parte.
Colaboração de Carlos Roberto Saraiva da Costa Leite, pesquisador e coordenador do setor de imprensa do Museu da Comunicação.