Nossa leitora Heloisa Dieterich foi ao recôndito de sua memória para buscar as sensações daquele momento especial. Afinal, ela devia ter em torno de cinco anos de idade:
"Todos os amigos da Rua Comendador Coruja, no bairro Floresta, dos menores aos maiores, percorreram suas casas e quintais atrás de madeiras variadas para a montagem da fogueira. Todas as famílias envolviam-se e colaboravam. Me lembro de estar sentada, junto à mesa da sala de jantar, com minha mãe e amigas, riscando e cortando as bandeirinhas coloridas, feitas de papel de seda, que seriam coladas aos cordões. Eram metros e metros. Quando prontas, estavam em condições de ser penduradas à volta da grande fogueira. O quentão também era feito por uma das famílias, e nós, ainda pequenos, aguardávamos impacientes a hora de experimentá-lo, pois bebê-lo era considerado uma das primeiras ‘transgressões’. Também havia o ‘buscapé’ e as ‘estrelinhas’, que eram fogos de artifícios sempre usados nestas ocasiões. Tanto um quanto as outras, em princípio, inofensivos. O primeiro era um bastão de fogo que, aceso, saía louquinho, errante, pelo chão até se apagar, e nós, felizes e audaciosos, corríamos, gritando de alegria, tentando fugir daquele ‘perseguidor implacável’. As estrelinhas era um palito que, quando aceso, largava faíscas para todos os lados, e isso nos deixava em êxtase! Na montagem da fogueira, os meninos mais ousados subiam nas tábuas e paus para, com cautela e habilidade, ir aumentando, cada vez mais, sua altura, tendo como meta ‘chegar às estrelas’. Isso levava à rivalidade entre as ruas do bairro para ver quem montava a fogueira mais alta. Quando a noite chegava e a fogueira era acesa, atingíamos o clímax da magia. A presença do fogo determinava: mais uma Festa de São João estava começando. Ah, e tinha, ainda, alguns anos depois, o ‘casamento na roça’, realizado em meu colégio, Nossa Senhora das Graças, quando fazíamos a festa entre as turmas da escola. Ele era apenas feminino, mas extremamente arrojado para a época, pois fomos preparadas para constituir família, mas, paralelamente, para sermos independentes profissional e emocionalmente. A maioria optava pelo semi-internato, pois era muito bom estar na escola. Fomos alfabetizadas em português e francês simultaneamente, além dos conhecimentos de inglês e espanhol. Tínhamos no esporte e nas prendas domésticas, aulas de bordados e culinária, o complemento de nossa formação. Na época das Festas Juninas, formávamos grupos para definir quais seriam as colegas que representariam a família caipira. Eram feitas rifas e também votações em sala de aula. Assim, aprendíamos a competir, a trabalhar em equipe, a compartilhar e a respeitar as decisões tomadas em grupo. Hoje, as cônegas de Santo Agostinho, responsáveis pelo colégio, têm seu trabalho direcionado ao social, junto às populações de baixa renda e aos povos indígenas da Amazônia, no norte do país. Nosso grupo de alunas? A maioria transformou-se em ótimas mães e profissionais competentes, realizando atividades pelo mundo afora".
Colaborou Heloisa Dieterich