A Páscoa de 1952 marcou a família Abraham profundamente. Procedentes de Barcelona, na Espanha, eles chegaram ao Brasil exatamente no domingo que assinala a data cristã. Depois de uma longa viagem a bordo do navio Provence, desembarcar no porto da cidade de Santos representava para eles uma verdadeira ressurreição. Tinham a esperança e a confiança de que, em nosso país, começariam uma vida nova e muito diferente daquela cheia de agruras que haviam experimentado na Europa.
O casal José Abraham Diaz e Maria Lhereux chegou trazendo nos braços o pequeno Alfonso (mesmo nome do avô), com um ano de idade, nascido em Barcelona como os pais, José em 1921 e Maria em 1925. Eles tinham, além da jovialidade, os traumas causados pela Guerra Civil (e depois pela II Guerra). Jovens de menos de 20 anos, conheceram-se durante o conflito. José, com 17 anos, havia se alistado nas Brigadas Internacionais, acabou tomando um tiro, foi preso pelas forças de Franco e passou quase um ano detido. Maria, com mais ou menos 12 anos, teve de se refugiar em Orthez, na França, para escapar das atrocidades. Voltou a Barcelona ao final da Guerra Civil.
Em 1942, José havia sido incorporado ao exército espanhol, onde serviu nos Pirineus. Logo após acabarem as hostilidades, José e Maria se casaram. Atendendo aos conselhos de Alfonso, pai de Maria, que já tinha uma irmã morando no Brasil, o casal resolveu emigrar. De Santos foram a Campinas, onde moravam patrícios, mas, logo depois, apanharam um trem em São Paulo e vieram para Porto Alegre, via Santa Maria. Aqui foram acolhidos pela tia Luiza, moradora na Floresta.
José, primeiro, arrumou emprego na Springer/Admiral e depois como laboratorista fotográfico no Correio do Povo. Durante um plantão, numa emergência, convocado pelo colega Walter Galvani, teve que virar fotógrafo. "Espanhol", como era chamado, tornou-se um dos melhores da imprensa gaúcha. Trabalhou também no Deprec (Departamento Estadual de Portos, Rios e Canais), até se aposentar. José morreu em 1997. Em 1957, nasceu Maria del Carmen, irmã de Alfonso, que, como o pai, também fez carreira de sucesso como fotojornalista.
Dona Maria fará 93 anos em setembro. Lúcida, ativa e muito bem disposta, ela comemora, neste domingo de Páscoa, como sempre, a dupla ressurreição.