Suspender temporariamente estudos com vacinas ou remédios após efeito adverso em um voluntário, como ocorreu com a vacina de Oxford nesta terça-feira (8), é algo comum, afirmam analistas consultados por GZH. Não necessariamente a decisão põe fim à imunização: a fase 3 de uma pesquisa, na qual se avalia os efeitos adversos de uma droga, presta-se justamente para checar sua segurança.
Dificilmente estudos clínicos terminam nos prazos mais curtos, sem nenhuma interrupção, destaca Paulo Gewehr, médico infectologista do Hospital Moinhos de Vento.
Ele lembra que vacinas e medicações no mercado costumam trazer efeitos adversos mais severos para uma parcela muito pequena da população — portanto, uma reação em um único paciente não necessariamente implica fim da vacina de Oxford.
O que determinará se o estudo seguirá ou não é a gravidade do efeito. A partir de agora, um comitê externo de especialistas vai tentar responder a uma série de perguntas: o efeito tem relação com a vacina ou é mera coincidência? O quão grave é o efeito? O quão frequente ele é? É raro ou comum? Gerou sequelas?
— No protocolo de pesquisa, já está previsto um acompanhamento contínuo dos possíveis efeitos adversos. Algumas pessoas podem ter reações alérgicas graves a remédios e vacinas. Mas a frequência é muito, muito, muito rara. A gente não sabe qual é o efeito, nem tem ideia se está relacionado à vacina. Atrasos podem acontecer, tanto que há um cronograma mais enxuto, quando tudo dá certo, algo difícil de acontecer, e um cronograma com pausas e interrupções — afirma Gewehr.
A suspensão não significa o fim da vacina de Oxford, mas o lançamento deve ser atrasado, explica o médico e professor de Infectologia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Alexandre Zavascki.
— Os investigadores são obrigados a notificar a ocorrência de efeito adverso, faz parte do protocolo de segurança. Isso não quer dizer sequer que o efeito adverso está associado à vacina. Precisa investigar se teve uma relação com a vacina. Normalmente, há comitês independentes para avaliar a segurança. Como não foi divulgado qual foi o efeito adverso, precisa ver se houve relação. Até que se esclareça, fica interrompido, mas não quer dizer que (o estudo) não seja retomado — diz Zavascki.
Pausas fazem parte do jogo, destaca Danise Senna Oliveira, professora de Infectologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Ela observa que a população aguarda com pressa pela vacina, mas que o ritmo da ciência é outro.
— É comum. É do jogo. Estamos com pressa, mas não há como apressar o processo de pesquisa. Isso dá um alento no sentido de saber que os laboratórios não estão apressando nada e estão olhando os dados de segurança e eficácia com cautela. Quando a vacina chegar, teremos convicção de que é segura e efetiva — afirma Danise.
Para Raquel Stucchi, infectologista da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), a suspensão dos testes demonstra a seriedade com que o laboratório trata a questão:
— Isso mostra que é uma vacina de um laboratório sério, responsável, que diante de uma reação séria, fez o comunicado, antes mesmo de saber se essa reação tem mesmo vínculo com a vacina ou não. Eles poderiam suspender e não dar muitas explicações, poderiam analisar a reação e depois fazer o comunicado. Mas está no protocolo de segurança comunicar, e essa suspensão nos dá segurança de que eles estão fazendo um trabalho sério. É isso que temos falado: temos várias vacinas em fase 3 , mas não temos ainda garantia de nenhuma delas. Nessa corrida, não é o valor investido que conta, é a saúde e a segurança das pessoas.