Um levantamento do Ministério Público do Trabalho (MPT) mostra que 33,7% dos casos confirmados de coronavírus no Rio Grande do Sul são de trabalhadores de frigoríficos. Segundo o órgão, 3.201 empregados do setor tiveram ou estão com a doença em 26 plantas. Até a tarde desta terça-feira (2), em toda a população do Estado, os dados da Secretaria Estadual da Saúde apontavam que 9.496 pessoas foram testadas positivas para coronavírus.
O levantamento do MPT é a partir de informações repassadas pelas secretarias de Saúde municipal e estadual — que já contam com os testes feitos pelos próprios frigoríficos. De acordo com a procuradora do MPT Priscila Dibi Schvarcz, o número foi acrescido recentemente em razão da testagem em massa feita pela indústria.
— Há a demonstração de um índice bastante elevado de pessoas que estão contaminadas, ou já se contaminaram, e inclusive permaneceram assintomáticas durante o período. É o que vem nos chamando a atenção e colaborando para o aumento dos casos e maior dispersão da doença — pontuou.
Conforme a procuradora, que é gerente nacional adjunta do projeto de adequação das condições de trabalho nos frigoríficos do MPT, especificidades do setor contribuem para o aumento dos casos. Ela cita a aglomeração de trabalhadores, que ficam "ombro a ombro", deslocamento em ônibus de grande número de empregados, aglomeração em refeitórios e outras áreas, a temperatura refrigerada e a baixa renovação do ar.
— Temos visto que, por exemplo, em pequenos municípios os primeiros casos foram justamente de trabalhadores do setor de frigoríficos — prosseguiu a procuradora.
Ainda de acordo com ela, o MPT já firmou termos de ajustamento de conduta com 16 plantas frigoríficas no Rio Grande do Sul para tentar conter a doença.
A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) diz que o levantamento "carece de esclarecimentos quanto à proporção dos testes realizados sobre o número de trabalhadores dos frigoríficos em relação aos testes efetivados". A entidade que representa o setor também contesta o risco aos trabalhadores por estarem "ombro a ombro". Confira nota na íntegra abaixo.
Desafio é vigilância ativa
Para a procuradora, o maior desafio de controle da doença no setor é uma percepção dos sintomas de uma maneira precoce e consequente afastamento e testagem do trabalhador — assim como das pessoas que tiveram contato com ele.
—Um dos principais motivos de irregularidades em unidades frigoríficas, e isso está sendo fiscalizado por todos os órgãos, é justamente a falta de adoção de medidas de vigilância ativa que sejam eficazes e compatíveis com a realidade de uma pandemia. Precisamos implementar protocolos que verifiquem a situação dos trabalhadores — declarou.
Segundo Priscila, é preciso manter uma rotina de testagem como medida de controle, "já que diversos trabalhadores foram contaminados e nem sequer foram afastados durante o período".
Em razão das especifidades do setor, uma portaria da Secretaria Estadual da Saúde (SES) informa recomendações sanitárias específicas para frigoríficos, exatamente pelo risco maior de contágio. As regras são mais rígidas do que para o restante da indústria.
A SES detalhou que em todos os casos de surtos confirmados em frigoríficos foram recomendadas medidas de restrição de fluxo, como afastamento de pessoas com sintomas, reforço de higienização, distanciamento maior, afastamento de pessoas no grupo de risco e realização de testes.
Para a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), o índice "prova, apenas, que o ambiente frigorífico tem monitoramento superior ao realizado em qualquer outro espaço no estado.
"A Associação Brasileira de Proteína Animal – ABPA ressalta que o índice apresentado pelo Ministério Público do Trabalho carece de esclarecimentos quanto à proporção dos testes realizados sobre o número de trabalhadores dos frigoríficos em relação aos testes efetivados sobre a população total do Rio Grande do Sul, ou mesmo em relação às cidades onde estão instaladas as unidades produtoras.
Este índice prova, apenas, que o ambiente frigorífico tem monitoramento superior ao realizado em qualquer outro espaço no estado.
"A ABPA ressalta, ainda, que o trabalho “ombro a ombro”, como destaca o MPT, não gera risco aos trabalhadores se as recomendações feitas pelo Ministério da Saúde, pela Secretaria do Trabalho e pelo Ministério da Agricultura forem seguidas. As recomendações tratam de diversas camadas de proteção individual com cobertura corporal quase total, incluindo equipamentos tais como máscaras buco-faciais “ninja”, faceshield e outros. E, ressaltamos, as agroindústrias associadas cumprem integralmente a legislação brasileira.
Vale lembrar que foram contratados mais ônibus e limitada a 50% de capacidade total por ônibus, evitando trabalhadores sentados lado a lado no transporte. Também foram adotadas medidas de redução de aglomeração em refeitórios e outras áreas das empresas.
De forma proativa, a ABPA firmou acordo com o Hospital Albert Einstein para reavaliação de todo o processo produtivo e cuidados nas plantas, com a visão técnica da área de saúde humana. Deste acordo nasceu um guia de recomendações que agora complementa o trabalho efetivado pelas agroindústrias do setor.
Informamos ainda que, antes mesmo da adoção da quarentena em vários estados de todo o país e como principal diferencial, o setor frigorífico brasileiro se antecipou e implantou medidas preventivas necessárias para proteger e minimizar, ao máximo, o risco nas unidades de produção.
São medidas como o afastamento de todos os colaboradores identificados como grupo de risco, a intensificação das ações de vigilância ativa, monitoramento da saúde dos trabalhadores, adoção de medidas contra aglomerações e o reforço da rotina de higienização de todos os ambientes dentro e fora do frigorífico. As empresas realizaram, ainda, campanhas de esclarecimento nas comunidades de seus colaboradores, o que contribuiu para a adesão aos cuidados preventivos.
O nosso setor faz parte do rol de atividades essenciais ao país. Para que possamos garantir a produção de alimentos seguros e o abastecimento para a população, a saúde dos colaboradores é prioridade indiscutível."