Os frigoríficos são os principais focos de surtos de coronavírus na indústria gaúcha, segundo boletim epidemiológico da Secretaria Estadual de Saúde (SES) divulgado na quarta-feira (20) e que traz capítulo exclusivo para o setor. Dos 30 surtos na indústria, 18 se concentram em frigoríficos — o que representa 60% do total.
Ao todo, são 528 trabalhadores de frigoríficos que tiveram diagnóstico positivo para covid-19. Outros 2.595 estão com sintomas gripais e são considerados suspeitos.
Dois trabalhadores de frigoríficos morreram em decorrência do coronavírus. Houve 10 mortes de familiares ou pessoas que moram com os funcionários do ramo, o que é classificado no boletim como óbitos secundários.
Os frigoríficos também concentram a maior taxa de contágio da doença. Essa conta mostra o número de casos confirmados ou suspeitos em comparação com a quantidade de pessoas expostas em uma área limitada. Em Lajeado, no Vale do Taquari, mais de 40% dos 1,8 mil trabalhadores de um frigorífico apresentaram sintomas de covid-19.
Na Serra, são quatro frigoríficos com surto de coronavírus, sendo dois em Garibaldi e um em Carlos Barbosa, Farroupilha e Nova Araçá. No Norte gaúcho, são cinco, em Passo Fundo, Marau, Tapejara, Serafina Correia e Trindade do Sul. No Noroeste, dois, em Miraguaí e Três Passos. E no Vale do Taquari, seis, sendo dois em Lajeado, dois em Arroio do Meio, um em Encatado e um em Poço das Antas.
Em todas as 30 indústrias que sofrem hoje com surto de coronavírus no Estado, trabalham 28.452 pessoas, que são considerados pelo boletim epidemiológico como "expostas".
A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) se manifestou sobre o tema e disse que "refuta a classificação dos frigoríficos como ambientes com especificidades que propiciem surtos". Confira nota na íntegra no final deste texto.
Preocupação das autoridades
O tema dos frigoríficos preocupa as autoridades. A partir de pedido do Ministério Público, duas plantas de Lajeado chegaram a ser interditadas em função dos surtos e voltaram ao trabalho nesta semana. Em Passo Fundo, a unidade da JBS também foi interditada e só retomou as atividades na quarta-feira.
Para a SES, a quantidade maior de surtos em frigoríficos "pode ser explicada pelas especificidades relacionadas ao trabalho nestes ambientes”. Em nota enviada a GaúchaZH, a pasta detalhou que "os trabalhadores realizam as atividades muito próximos, os ambientes são fechados, possuem sistema de refrigeração e renovação de ar com características próprias para manter a qualidade microbiológica dos produtos, além das áreas de convivência como refeitório e vestiários que favorecem as aglomerações”.
Uma portaria da secretaria informa recomendações sanitárias específicas para frigoríficos, exatamente pelo risco de contágio que o setor possui. As regras são mais rígidas do que para o restante da indústria.
Ainda segundo a SES, a maioria dos surtos em frigoríficos ainda não foi encerrada, mas está sob constante avaliação e monitoramento por parte dos próprios estabelecimentos e das secretarias municipais e estadual de Saúde. A pasta detalhou que em todos os casos foram recomendadas medidas de restrição de fluxo, como afastamento de pessoas com sintomas, reforço de higienização, distanciamento maior, afastamento de pessoas no grupo de risco e realização de testes.
Surtos em instituições de permanência de idosos
O boletim também traz referência ao aumento dos surtos em instituições de longa permanência de idosos. Até a última semana, eram oito instituições. Passaram para nove no último boletim. Morreram 11 pessoas por covid-19 nesses locais. Questionada, a secretaria disse que vem adotando medidas de controle semelhantes às das indústrias para as instituições de idosos.
O setor especializado em surtos da pasta aponta que “nesses locais tem-se observado uma tendência de resolução mais rápida dos surtos, provavelmente devido à menor quantidade de pessoas envolvidas”, mas a gravidade é maior, por se tratar de idosos. Nos casos dessas instituições, a pasta recomenda a testagem de todos os expostos, residentes e funcionários.
Contraponto:
"A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) refuta a classificação dos frigoríficos como ambientes com especificidades que propiciem surtos. A entidade ressalta que:
1 - As agroindústrias cumprem rigorosamente as leis brasileiras, como é o caso da Orientação Conjunta n° 01/SITRAB/SEPRT-ME/SPA-MAPA/SVS-MS, com orientações dos Ministérios da Saúde, da Agricultura e da Economia para o trabalho nos frigoríficos;
2 - Organismos internacionais classificam o ambiente frigorífico como diferenciado, frente aos cuidados tomados constantemente para preservar a biosseguridade;
3 - Já no início de março foram tomadas medidas contra aglomerações, especialmente nos refeitórios, transporte e outros espaços;
4 - Antes mesmo da adoção da quarentena em vários estados de todo o país, as agroindústrias implantaram medidas preventivas necessárias para proteger e prevenir, ao máximo, o risco nas unidades de produção, como o afastamento de todos os colaboradores identificados como grupo de risco (com idade acima de 60 anos, doenças pré-existentes e outros), a intensificação das ações de vigilância ativa nas unidades frigoríficas e monitoria da saúde dos trabalhadores (com a verificação constante de temperatura) e o aumento da rotina de higienização de todos os ambientes dentro e fora do frigorífico. Também foram reforçadas as orientações de cuidados preventivos dentro e fora do frigorífico;
5 - Durante o período de trabalho, os colaboradores utilizam diversas camadas de proteção individual com cobertura corporal quase total, incluindo equipamentos tais como máscaras buco-faciais “ninja”, faceshield e outros;
6 - Por fim, a ABPA ressalta que preservar a saúde dos trabalhadores e a segurança alimentar do país são honrosas missões que as empresas vêm desempenhando, e assim seguirão para garantir o alimento nas mesas das famílias brasileiras."