A prefeitura de Passo Fundo divulgou nesta terça-feira (19) um estudo sobre o perfil dos mortos por coronavírus na cidade. O município do norte gaúcho concentra o maior número de mortes pela covid-19 no Estado, 25, conforme levantamento da própria prefeitura, e 24, empatando com Porto Alegre, de acordo com balanço da Secretaria Estadual da Saúde (SES). O levantamento foi feito pela administração municipal em conjunto com o Comitê de Orientações Emergenciais (COE), que inclui a Secretaria Municipal de Saúde, hospitais, faculdades de Medicina, Ministério Público, Conselho Municipal de Saúde e médicos epidemiologistas.
Foram analisados os casos de 24 pacientes que morreram entre 22 de março e 18 de maio. Dos óbitos ocorridos, 12 deles, o equivalente a 50%, procuraram atendimento diretamente nos hospitais, o que contribuiu, conforme interpretação do estudo, “para que chegassem em estado grave”.
— As pessoas estão demorando um pouco mais do que deveriam para buscar socorro médico em caso de necessidade. Isso é, provavelmente, uma das explicações (para o alto número de mortes na cidade) — sustenta o prefeito Luciano Azevedo.
Conforme o estudo, o tempo médio entre o primeiro atendimento até a internação (considerando o total de óbitos) foi de 1,7 dia, variando entre zero e seis dias. As vítimas tinham entre 51 e 90 anos, sendo que a idade média era de 75,2 anos. O tempo médio de internação foi 8,5 dias, sendo o mínimo de um dia e o máximo de 26 dias. Todos os pacientes apresentavam um ou mais problemas de saúde que estão descritos como fatores de risco, como hipertensão, diabetes e cardiopatia. Cinco deles eram pacientes com limitação de cuidados invasivos por opção da família.
A letalidade do vírus em Passo Fundo, conforme o estudo, segue o comportamento internacional, nacional e estadual, onde o percentual de óbitos é maior em idosos, em especial a partir dos 80 anos. Não foram registradas mortes de pacientes jovens, sem comorbidades ou profissionais da saúde.
Uso de hidroxicloroquina
O tratamento dos internados em UTI, em ambos os hospitais da cidade, além do suporte de vida relacionado ao controle das complicações pela covid-19, tem incluso o uso de hidroxicloroquina, oseltamivir, anticoagulantes e macrolídeo (azitromicina ou claritromicina). O professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Passo Fundo (UPF) e integrante do COE Paulo Reichert tem opinião semelhante à do prefeito.
— Essa orientação (de procurar os hospitais somente em casos graves) tem dado maus resultados. Eu acho que isso é um ponto crítico no município. Nós temos que orientar melhor a população e não chegar a um terço dos óbitos ocorrer nas primeiras horas (de atendimento médico) – avalia o professor.
Para Reichert, uma das alternativas seria aplicar tratamentos mais “agressivos”, mesmo nas pessoas com sintomas leves.
— Tentando evitar uma evolução, uma doença mais grave. Talvez criar um protocolo do município — acrescenta.
O professor acredita que a região de Passo Fundo possa ter sido atingida por uma intensidade mais forte do vírus. Lembra que situação semelhante foi registrada norte da Itália.
Trabalhadores da indústria
O estudo também aponta que os casos em trabalhadores da indústria de alimentos da região contribui para o elevado número de mortes. Também que o perfil socioeconômico tem relação com os óbitos.
“Esse perfil populacional tem maior dificuldade de isolar os doentes das pessoas mais velhas, devido a habitarem mais aglomeradas (maior número de pessoas morando em habitações com menos cômodos), que favorece a transmissão do coronavírus entre pessoas suscetíveis. Além disso, são pessoas que já têm menos acesso a outros direitos fundamentais que estão relacionados a melhor qualidade de saúde, como acesso a saneamento básico, a água tratada, prática de atividades físicas ou controle prévio de doenças crônicas, fazendo com que a covid-19 tenha um impacto muito maior na mortalidade, visto não só em Passo Fundo, mas nos outros municípios com surtos documentados em frigoríficos, como em Lajeado, Marau e Garibaldi”, diz o estudo.
Conforme a prefeitura, seguindo orientações do Ministério da Saúde e levando em consideração os cenários social, econômico e de saúde, a administração municipal agiu no início da pandemia, de forma imediata, publicando decretos para organizar o funcionamento de atividades. Para garantir medidas de proteção por parte da população, por exemplo, lembra que tornou obrigatório o uso de máscaras, alertando sempre para a importância do distanciamento social.
O Executivo municipal sustenta, ainda, que não se pode ligar o elevado índice de óbitos à possível deficiência do sistema hospitalar. Conforme o estudo, não houve colapso dos leitos hospitalares.