A pandemia de coronavírus tem levado empresas do Estado a optarem pelo home office e motivado as principais entidades empresariais a sugerirem medidas para reduzir riscos de contágio entre empregados. Indústrias e empresas de comércio e serviços têm determinado, desde a semana passada, que colaboradores realizem de casa suas tarefas. As decisões antecipam uma recomendação do Ministério da Saúde para que companhias prefiram o trabalho domiciliar onde haja transmissão sustentada da covid-19 (quando não é possível mais saber a origem da infecção), o que não é o caso do Rio Grande do Sul.
— A ideia é evitar que pessoas circulem por ambientes fechados onde pode haver maior risco do contágio, como é o caso dos escritórios — explica Irio Piva, presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL) da Capital.
Nos últimos dias, muitas varejistas têm recomendado que os funcionários de setores como administrativo e financeiro trabalhem em casa.
— Mais de 50% das pessoas que trabalham no comércio cumprem funções administrativas, que podem ser realizadas do domicílio — explica o dirigente.
A rede de pisos e revestimentos Elevato, dirigida por Piva, é uma que tomou essa decisão. Uma reunião na semana passada firmou um plano de emergência diante da epidemia, eliminando cursos e palestras e direcionando parte dos funcionários ao trabalho domiciliar.
Já o Sindicato dos Lojistas do Comércio de Porto Alegre (Sindilojas) abriu um debate com o Sindicato dos Empregados no Comércio (Sindec) para avaliar o afastamento temporário de funcionários que façam parte dos grupos de risco, como idosos, gestantes e pessoas com doenças crônicas.
No setor de tecnologia, mais propenso ao home office em razão de acesso remoto e ferramentas digitais, os casos se multiplicam. No Parque Científico e Tecnológico da PUCRS (Tecnopuc), o maior do Estado, boa parte das 7 mil pessoas que trabalham nas 170 startups foram mandadas para casa – a administração do local não soube precisar o número. Uma das primeiras foi a e-Core, que na semana passada decidiu que todos os seus 320 funcionários trabalharão remotamente.
— Nos primeiros dias poderá haver mudança no ritmo do trabalho, o que é normal, mas precisamos pensar na saúde dos colaboradores — afirma Christian Lykawka, CEO da Rockhead, empresa instalada no Tecnopuc.
A companhia decidiu que a partir desta terça-feira (17) seus 11 funcionários trabalharão de casa. Em áreas de trabalho coletivo em Porto Alegre, o movimento é semelhante. No Flowork, que reúne empreendedores na Capital, apenas um terço dos 600 frequentadores habituais circularam na segunda-feira (16).
As medidas se replicam na indústria. A Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs) determinou que parte de seus 3,6 mil colaboradores trabalhem a distância e proibiu viagens ao Exterior para participação em feiras ou congressos, por exemplo. Fábricas na serra gaúcha e na Região Metropolitana passaram a optar pelo trabalho remoto para quem não atua na linha de produção.
Na CMPC, fornecedora de papel e celulose, entre as medidas em vigor estão o trabalho remoto por ao menos 14 dias para as funções administrativas, suspensão de todas as viagens aéreas e recomendação de dar preferência a videoconferências.
— O momento é crucial para unir iniciativas públicas e privadas no combate ao avanço dessa epidemia — acredita Mauricio Harger, diretor-geral da CMPC.
Trabalho remoto exige disciplina e tempo para adequação
Desde esta segunda-feira (16), Davi Guilherme da Silva Pacheco, 24 anos, está precisando readaptar o apartamento onde mora com amigos em local de trabalho provisório. Na semana passada, a empresa em que trabalha como analista de marketing avisou que os 70 colaboradores atuariam por home office por tempo indeterminado em razão do coronavírus.
— O grande desafio é a comunicação com os colegas. Aquela conversa rápida para tirar uma dúvida ou ajustar um projeto fica mais difícil — afirma ele, que realizou seis videoconferências em seu primeiro dia trabalhando de casa para organizar o serviço.
A experiência é incipiente, mas ele já sabe que terá de manter uma rotina semelhante ao do escritório para dar conta de todas as demandas.
— Não adianta ligar o computador e ir fazer um café, conversar com vizinhos. Tem que sentar e trabalhar — afirma, preocupado com distrações.
Profissionais de recursos humanos alertam que é preciso redobrar a disciplina para trabalhar em casa, evitando perder tempo com tarefas domésticas e resistindo à tentação de procrastinar o serviço.
— Para algumas pessoas, o home office pode ser um desafio, porque em casa temos mais distrações e outros afazeres nos chamando — comenta a especialista em produtividade Tathiane Deândhela, autora do livro Faça o tempo trabalhar para você.
Ela recomenda uma rotina bem afinada de horários, com pausas programadas ao longo do dia e metas a cumprir.
Advogado trabalhista, Breno Nascimento, do escritório Marins Bertoldi Advogados, de Curitiba, esclarece que o home office tem sido uma escolha crescente nos últimos dias em razão da pandemia. Ele explica que a legislação admite o home office temporário diante de um aditivo simples no contrato de trabalho. Essa observação deve deixar claro que a mudança será durante o período de cuidados recomendado por autoridades em razão da covid-19.
— O funcionário pode sugerir o home office, mas a decisão será da empresa, que deverá manter o controle da jornada e do ponto e não poderá descontar o salário do funcionário durante o período sob nenhuma alegação — explica.
Recomendações
- É preciso definir um lugar apropriado para realizar as atividades. Deitar na cama com o notebook no colo ou trabalhar no sofá da sala com a TV ligada pode prejudicar o desempenho
- É fundamental que a pessoa estabeleça e cumpra os horários de trabalho que propôs para si mesma. Caso contrário, será fácil se distrair e produzir pouco durante o dia
- Prefira reproduzir na sala ou no escritório sua mesa de trabalho, com calendário, telefone, caneta e bloco de anotação. Opte por lugares claros e frescos, preferencialmente isolados do barulho da rua ou do resto da casa
- As distrações para quem trabalha em casa são muitas (familiares com TV ligada, música, faxina, animais de estimação etc). Peça compreensão e explique que, assim como qualquer emprego, você tem tarefas a cumprir
- Caso tenha filhos, defina escalas para ver quem fica com eles e combine para que não haja interrupções
Fonte: Tathiane Deândhela, especialista em liderança e autora do livro Faça o tempo trabalhar para você.