A juíza Claudia Helena Batista, da 1ª Vara Empresarial de Belo Horizonte, aceitou nesta quinta-feira (31), o pedido de recuperação judicial da empresa 123 Milhas, com valor de causa em R$ 2,3 bilhões. São mais de R$ 200 milhões reclamados em milhares de processos contra a agência de viagens.
Com o deferimento, execuções e cobranças de dívidas ficam suspensas por ao menos 180 dias. As empresas - estão incluídas na decisão a 123 Viagens e Turismo LTDA, a Art Viagens e Turismo LTDA e a controladora Novum Intestimentos Participações SA - devem apresentar um plano em que mostrem como podem quitar as dívidas. A reestruturação deve ser apresentada em 60 dias. Depois, haverá uma organização da forma de pagamento dos credores.
A advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) Carolina Vesentini fala sobre implicações para o consumidor a partir do aceite pela Justiça.
Confira, abaixo, perguntas e respostas sobre a situação:
O que é recuperação judicial?
De acordo com Carolina, a recuperação judicial é um meio que as empresas utilizam para evitar a falência. O processo está previsto pela Lei de Falências, aprovada no final de 2020, e permite que as companhias suspendam e renegociem parte das dívidas acumuladas em um período de crise, evitando o encerramento de suas atividades, possíveis demissões ou atrasos em pagamentos. Para isso, elas apresentam à Justiça os motivos pelos quais precisam da medida, bem como um plano de recuperação.
Os clientes ainda receberão seus valores?
Com a homologação da recuperação judicial, fica suspensa a maior parte dos débitos da empresa, ou seja, o pagamento aos credores é adiado ou suspenso por tempo determinado (no caso da 123 Milhas, o prazo é de 180 dias). A advogada afirma que a legislação também estabelece uma ordem para que a empresa pague suas dívidas, priorizando os créditos trabalhistas, os tributários e os pautados em garantia real.
— Infelizmente, os clientes são os últimos dessa lista. E só avança para o pagamento da próxima categoria se a anterior estiver totalmente satisfeita. Então, além de esperar para receber, os clientes podem receber menos do que gastaram. Com a recuperação, a situação para os consumidores fica muito ruim. É menos prejudicial do que a falência, mas também não é bom — afirma a advogada.
E se a empresa não tiver dinheiro para ressarcir o consumidor?
Caso a empresa não tenha o valor suficiente para o pagamento total dos consumidores, é feita uma divisão proporcional — é isso que faz com que os clientes possam receber valores inferiores. Além disso, Carolina destaca que o Código de Defesa do Consumidor prevê a facilitação da desconsideração da personalidade jurídica da empresa em prol dos consumidores:
— Isso significa que os consumidores podem pedir ao juiz que os donos ou sócios da empresa respondam com seus bens pessoais para pagá-los. As pessoas que já entraram com ação e tiverem liminar podem fazer esse pedido.
Quais as recomendações a partir de agora?
Rainer Grigolo, diretor-executivo do Procon RS, ressalta que os clientes podem continuar apresentando suas reclamações junto aos Procons municipais, buscando a Defensoria Pública para ajuizar ações e demandando judicialmente contra a empresa se assim entenderem por direito, a fim de obter a reparação por todo o prejuízo que estão tendo.
Carolina acrescenta que o Idec recomenda três ações simultâneas: tentar contato com a empresa via e-mail para que fique registrada a falta de retorno, caso ocorra; registrar reclamação no Procon e no site consumidor.gov.br; e acionar o judiciário, seja por meio de um advogado de sua confiança ou do Juizado Especial Cível (JEC), que permite ao cidadão entrar com uma ação desacompanhado de advogado e de forma gratuita. Esse serviço, informa, é destinado somente às causas inferiores a 20 salários-mínimos.
E se a empresa falir?
A recuperação judicial existe justamente para impedir que a empresa venha à falência. Para isso, no entanto, o plano de recuperação da 123 Milhas terá de ser aprovado e, após, a empresa conseguir cumprir as condições acordadas. Se isso não ocorrer, pode ser decreta a falência. Conforme o Idec, se a 123 Milhas decretar falência, o consumidor deverá tomar as providências devidas conforme a sua situação. Em geral, caso a empresa esteja “devendo” algo para o cliente, como a prestação de um serviço já pago, é necessário entrar com uma ação judicial para tentar recuperar o prejuízo.
O Procon RS já tomou alguma medida?
O Procon RS notificou a 123 Milhas em 21 de agosto, em busca de esclarecimentos. A empresa possui um prazo de 10 dias para responder, o que ainda não foi feito. Após o recebimento da resposta da agência, será dado andamento na demanda, com análise jurídica do retorno. Segundo o diretor-executivo do órgão, essa é uma fase preliminar, que pode resultar na abertura de um processo administrativo sancionador.
— Em ato seguinte, também vamos buscar mais informações com os Procons municipais para entender a repercussão desse caso. Nós (do Procon estadual) temos tido contatos por telefone e pelo tira-dúvidas do WhatsApp. E a nossa orientação para essas pessoas é que apresentem a reclamação com a documentação — afirma.
Como solicitar a atuação do Procon RS?
Pelo WhatsApp (51) 3287-6200 — de segunda à sexta-feira, das 10h até 16h. O atendimento eletrônico do Procon é feito via site institucional.