Marcelo Bandeira*
Ao ouvir o nome Chernobyl, provavelmente sua memória identificará o acidente nuclear ocorrido em abril de 1986, que deu fama mundial a essa cidade na Ucrânia. Passados 33 anos da tragédia, o local voltou aos noticiários, desta vez como um dos roteiros mais cobiçados do Leste Europeu. Ainda mais com a badalação em torno da minissérie Chernobyl, da HBO, vencedora, em setembro, de 10 prêmios Emmy, o principal da TV americana. Aliás, desde a estreia da produção, houve um acréscimo no número de turistas e uma inflação nos preços praticados por lá – a taxa de autorização para uso de drones, por exemplo, subiu de 50 euros para 300 euros.
Antes de seguir com a leitura, é preciso entender que Chernobyl é somente uma das cidades evacuadas na chamada zona de exclusão – área de 30 quilômetros do entorno da usina nuclear –, e é esta zona que atrai o interesse dos turistas. O objetivo dos ucranianos é mudar a identidade de local de catástrofe para uma espécie de memorial ao ar livre.
Por isso, desde 2010 o governo mede constantemente os níveis de emissões radioativas. Quando estão baixos, a Ucrânia permite a entrada de visitantes, que, durante toda a jornada, mantêm junto ao corpo um medidor de radiação individual e, obrigatoriamente, passam diversas vezes pelos dosímetros oficiais.
Para fazer essa visita, também é obrigatório contratar uma das agências de turismo credenciadas pelo governo (você pode consultar no site chtoa.org e conhecer as regras). A agência será a responsável por encaminhar seus dados e cópia do passaporte, para assim obter a imprescindível autorização de entrada na zona de exclusão.
O tour guiado, com duração de três horas, pelo interior da Usina Nuclear de Chernobyl custa, em média, US$ 150.
O roteiro mais comum pela zona de exclusão é o chamado bate-volta saindo da capital ucraniana, Kiev, às 8h, e retornando no final da tarde. Como existem pacotes personalizados que podem incluir um pernoite no único e bem simples hotel de Chernobyl, os preços variam entre US$ 100 e US$ 1 mil. Eu fiz o passeio de dois dias, para ter uma experiência mais interessante. Cada agência tem um formato de visita, portanto nem todas usam o hotel em Chernobyl para pernoitar.
Mas, afinal, qual é a atratividade turística deste roteiro? A resposta está logo após os 100 quilômetros que separam o centro de Kiev do acesso à zona de exclusão. Ao adentrar aquelas cancelas, tudo a sua volta lembra um cenário apocalíptico. É uma sensação de que a humanidade foi varrida da face da Terra e a natureza assumiu o controle daquelas cidades.
Além desse cenário de abandono, é ainda mais surpreendente incluir no pacote uma visita ao epicentro do desastre. Ao custo médio de US$ 150, é possível fazer um tour guiado com duração de três horas dentro da Usina Nuclear de Chernobyl, com traje especial, terminando com um almoço no refeitório da usina.
O ponto principal do roteiro é Pripyat, que era um exemplo do modelo russo, com prédios imponentes e largas avenidas. Hoje, é conhecida como a Cidade Fantasma. É nela que encontramos o parque de diversões que nunca foi inaugurado, pois a explosão ocorreu quatro dias antes da data de abertura.
Por ser a população mais próxima ao acidente (apenas 1,5 quilômetro de distância), seus habitantes foram evacuados às pressas – podemos perceber isso na escola e na creche, onde os livros permanecem abertos sobre as classes e a quantidade de brinquedos transmite a sensação de que as crianças estão no intervalo e logo voltarão.
O hospital é o lugar que até hoje tem os maiores níveis de radiação. O supermercado parece como em um filme de guerra, destruído e abandonado. As ruas da cidade mostram o poder que a natureza tem de se recompor. Por todos os lados, ela domina uma paisagem que antes era urbana – Pripyat é uma cidade que se transformou em uma floresta. Mas é uma floresta onde reina o silêncio, porque os animais também morreram ou fugiram, principalmente os pássaros.
Quanto a Chernobyl, é lá que vivem os atuais 150 moradores da zona de exclusão e onde fica o único hotel da região. Apesar da presença humana, o cenário é desolador, pois a cada casa ocupada com seus jardins bem cuidados existem outras 10 abandonadas bem ao lado. A chegada dos turistas, além de um fomento financeiro, serve como uma janela para o mundo. É como entregar para esses moradores uma sensação de humanidade – de pertencerem novamente a uma comunidade.
Normas de segurança
Se você decidir ir a Chernobyl, as dicas mais importantes são: siga as regras e não toque em nada. Leve sua própria máscara oronasal, sua lanterna e use roupas que cubram todo o corpo, bem como calças jeans, camisa manga longa e sapato/tênis fechados – é proibido usar sandálias. Ao final da visita, coloque tudo fora – retire toda a roupa e bote no lixo.
A infraestrutura é menos do que mínima: não há banheiros (aproveite o último disponível no check point), nem bares ou restaurantes. O turista é instruído a não se alimentar por lá, por causa da possibilidade de contaminação pela poeira. Carregue uma garrafa de água, mas não a deixe aberta por mais tempo do que o suficiente para beber. E jamais a coloque no chão.
*Bacharel em Turismo pela PUCRS e blogueiro (roteiroscompartilhados.com)