Por dois dias, nossa equipe visitou propriedades, fez algumas rotas, perdeu-se inúmeras vezes, deu boas risadas e experimentou acolhidas indescritíveis na nova rota de Garibaldi, a Via Orgânica, que reúne produtores orgânicos.
Para começar, a dica de ouro aos turistas: reserve mais do que um par de dias para conhecer o município. Apesar de ser um município relativamente pequeno – sua população é de aproximadamente 33 mil habitantes, conforme o IBGE –, é preciso contabilizar o tempo gasto no trajeto entre uma propriedade e outra, somar os minutos perdidos com a correção de rotas erradas e, claro, estimar um bom período para apreciar cada anfitrião, ouvir suas deliciosas histórias e visitar com calma as propriedades. Afinal, estar lá é bem mais do que contemplar belas paisagens, mas se desconectar da correria e se ligar à natureza e à vida no campo.
A segunda dica: vá despido de qualquer pré-conceito e prepare-se para comer folhas, flores, brotos e cascas de frutos colhidos na hora, entre uma pernada e outra. Esqueça suas preferências alimentares e prove tudo o que lhe for oferecido. Isso dá um toque especial a toda experiência.
Cooperativa Vinícola Garibaldi
Chegamos ainda em êxtase com toda a beleza que nossos olhos testemunharam desde a BR-470 até o centro da cidade. Prédios antigos, flores, cores e um sol maravilhoso coroando nossa estadia. Começamos no terminal turístico da Cooperativa Vinícola Garibaldi. Fundada em 1931, conta, hoje, com 380 famílias associadas. Elas cultivam 900 hectares de vinhedos, dos quais 10% são dedicados à produção sem agrotóxicos.
– Hoje, o foco da Garibaldi, além de sucos e vinhos orgânicos, são os espumantes e os sucos de uva integrais –explica o gerente de marketing e nosso "guia" no passeio, Maiquel Vignatti.
A entrada apresenta dezenas de pipas de madeira utilizadas há décadas para produção das bebidas, e o visitante se diverte com as plaquinhas que enaltecem o vinho: "Diga-me o que bebes e dir-te-ei quem és",
"O vinho lava nossas inquietações, enxuga a alma até o fundo e, entre outras coisas, garante a cura da tristeza", "Todas as questões se afogam em vinho". O ambiente é escuro e traz o sedutor aroma da uva. Os visitantes podem optar por fazer uma degustação às cegas dos produtos ícones da linha Acordes – e que deve ser agendado, pois permite, no máximo, nove visitantes por vez.
Cooperativa Vinícola Garibaldi
Avenida Independência, 845
Telefone: (54) 3464-8104
Quanto: o projeto Desperte os Seus Sentidos é o único serviço cobrado. Os preços variam entre R$ 45 e R$ 90.
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Econatura
A Econatura faz o aproveitamento quase integral da uva, com exceção do cabinho. De lá saem sucos, farinhas da casca e da semente da fruta, óleo e vinagres orgânicos. Basicamente formatada para receber visitas técnicas, a Econatura atrai escolas e universidades interessadas em conhecer esse formato de produção.
– Eles se interessam por este modelo de uma empresa sustentável, que gera lucros e consegue respeitar a natureza, a questão social, ambiental e cultural – explica Bruna Postingher, que, ao lado do pai, Luiz Postingher, nos recebeu na fábrica.
Por lá, todas as palavras de ordem começam com o prefixo "re": reaproveitamento, reuso e reciclagem. Prova disso é a pipa gigantesca transformada em abrigo para os funcionários que trabalham na época da safra. A megaestrutura possui iluminação e ventilação natural, cobertura feita com telhado de Tetra-Pak e reaproveitamento de água da chuva. Antes de ir embora, claro, sentamos à mesa para experimentar o suco e um bolo feito com farinha da semente de uva e cobertura com farinha da casca.
Econatura
Linha São Luís do Araripe
Telefone: (54) 3462-1074
Quanto: gratuito
Família Boroto
Como havia chovido muito nos dias anteriores à nossa visita à propriedade da família Boroto, demos uma volta a pé na área com seis hectares de plantação de uvas isabel, lorena, moscato e sauvignon blanc. No trajeto, paramos para colher pêssegos e ameixas amarelas e comer durante a caminhada. Depois de conhecer o território, partimos para o lanche, que foi servido na sala da família.
Como amigos de longa data, fomos recebidos com um prato gigantesco com pão, copa, salame, queijo, chocolates e um pão de mel divino, regados a um espumante orgânico maravilhoso. Após muita conversa, precisamos zarpar, pois um jantar-degustação nos esperava. Fomos embora com a promessa de retornar no dia seguinte para visitar uma gruta próxima a propriedade. Já na estrada, a caminho do Valle Rústico, fomos abordados pelo senhor Leopoldo, que vocês conheceram lá no início desta matéria.
Família Boroto
Linha Presidente Soares
Telefone: (54) 3464-7904
Quanto: entre R$ 30 e R$ 100
Valle Rústico
Indescritível é a única palavra que me vem à mente quando lembro do que vivi no Valle Rústico, restaurante comandado pelo turismólogo convertido a chef Rodrigo Bellora. Quando chegamos, a lua já dava as caras, o que diminuiu nosso passeio pela propriedade. O pouco que vimos já me rendeu alguns conhecimentos interessantes sobre as PANC's (plantas alimentícias não convencionais). Em resumo, podemos comer boa parte do que a natureza nos oferece: trevo, língua de vaca, brinco de princesa, amor perfeito etc. Prova disso foi o menu que degustamos na sequência da nossa agradável caminhada.
Seguindo o conceito do slow food, de ofertar alimentos bons, limpos e justos em todos os aspectos e etapas de produção, fomos apresentados a 12 opções de pratos. Entre carpaccio de beterraba, ovos com farinha de bergamota, salada verde com trevos e amores perfeitos, entrecot ao molho de amora e várias outras delícias, me rendi à lasanha de cogumelos com crisps de alho poró.
Sentado à mesa com nossa equipe, o chef nos instigava a sentir os sabores, apreciar cada detalhe e aroma a fim de descobrir os ingredientes das preparações. Terminamos nossa refeição com um limoncello, licor típico da Itália produzido ali mesmo, com as frutas locais.
Linha Marcílio Dias, 15 da Graciema – Vale dos Vinhedos
Contato: (54) 3067-1163
Quanto: refeições entre R$ 95 e R$ 130
Arte da Vinha
Na Arte da Vinha, quem nos recebeu foi Eduardo Zenker, um apaixonado pela cultura do vinho. Nosso roteiro foi feito na garagem adaptada da sua residência, onde ele fabrica os próprios vinhos de maneira artesanal usando técnicas milenares, como uso de ânforas de terracota.
– Resgatei o jeito que o vinho era feito há 7 mil anos e consegui uma bebida interessante sem adição de nenhum produto enológico – explica.
A matéria-prima para vinhos e espumantes são colhidas a 17 quilômetros dali, nos vinhedos, sem nenhuma adição de agrotóxicos. Ao sair da cave, passeamos por entre os barris de madeira e ainda conhecemos alguns projetos do vitivinicultor sonhador: um vinho chamado Bicho Grilo, com a imagem de um hippie no rótulo e uma headband de tecido presa por fora.
Rua Dante Grossi, 643, Centro
Contato: edu.zenker@yahoo.com.br
Quanto: R$ 100 (com degustação; mínimo quatro pessoas)
Sítio Crescer
Arrisco a dizer que no Sítio Crescer tivemos a recepção mais calorosa. Explico: logo quando abri a porta do carro ouvi choros e uma cabeça preta adentrando meu espaço. Era o Max, border collie de seis anos. Para uma repórter "cachorreira", esse foi o ponto alto da chegada.
Em seguida, vieram a Ana Cláudia Chiesa e o Damian Chiesa de braços abertos, pausando a colheita de pêssegos, para nos dar as boas vindas. O jovem casal adquiriu a propriedade em 2009 e apostou no viés turístico desde o ano passado. Para isso, os dois construíram um hostel com capacidade para 40 hóspedes, salão com cozinha e uma paisagem belíssima, onde o único som que ouvimos é o dos pássaros e das cascatas.
– Aqui, fazemos um passeio guiado que chamamos de "sítio tur". Em nossa caminhada por entre as cascatas, falamos das flores, frutas, educação ambiental – conta Ana.
Depois da breve conversa, partimos para o famoso "sítio tur". Sempre acompanhados de Max e da gatinha Poderosa, caminhamos por entre as plantações de hortaliças provando tudo aquilo que aparecia pela frente: flores, amoras, broto de bambu, trevos, kinkans. O clima bucólico é reforçado pelo jardim repleto de margaridas, lavandas e outras flores que enchiam de cores o gramado da propriedade.
Após uma infinidade de registros fotográficos, adentramos o salão cheirando a doce de pêssego para tomar um café e comer um pãozinho coberto com as geleias produzidas ali, de kinkan e ameixa amarela. Delicioso!
Rua Buarque de Macedo, 5.743
Telefone: (54) 8145-0037
Quanto: passeio, R$ 10 (mínimo cinco pessoas); hospedagem entre R$ 40 e R$ 60.
Família Mariani
A propriedade da Família Mariani produz sucos de uva tradicionais e alguns bem peculiares, como o com beterraba e gengibre e o de alface. Oferece um passeio de carretão pelas diversas plantações.
– Os visitantes podem colher frutas da época. Temos uva, kiwi, pêssego, figo, laranja, bergamota – enumera Salete Arruda.
Também é possível levar para casa cúrcuma, cebolinha, gengibre, couve, repolho, tomates: tudo colhido fresquinho e sem nenhum aditivo. Caminhamos por entre parreiras com idade estimada entre 116 e 121 anos. Terminamos a visita na porta do galpão onde é feita a degustação dos produtos, uma bela casa em estilo rústico e imponente. Por fim, provamos os vinhos e sucos – o de uva com beterraba e gengibre é imperdível.
Linha Marcílio Dias
Telefone: (54) 9999-9752
Quanto: R$ 10 (crianças até 12 anos não pagam)
– É um sonho. E sonhos a gente faz, não fica pensando muito.
Villa Fitarelli
Foi com o desejo de realizar este sonho, que o veterinário Luiz Fitarelli iniciou sozinho, há 12 anos, a construção de um museu a céu aberto que reproduz em detalhes as construções da época em que os primeiros italianos chegaram ao Brasil. Embora não faça parte da Via Orgânica, optamos por desviar um pouco nosso caminho e fazer uma pequena viagem no tempo.
Seguindo as orientações dos moradores da região, encontramos o "muro caprichado", todo feito em pedra, e avistamos alguns cenários familiares – pelo menos para mim. A Villa Fitarelli reúne construções da antiga colônia que já serviram de pano de fundo para produções globais como a minissérie Decamerão e a novela Além do Tempo.
Cada prédio – ferraria, marcenaria, armazém (ou shopping da colônia, como Fitarelli brinca) e capela – conta com um acervo enorme de peças originais, colecionadas há 40 anos pelo idealizador do projeto. Ao todo, são mais de oito mil artigos que vão de instrumentos de marcenaria a louças.
– Comecei a juntar tudo quando era guri. Eram pequenas coisas do meu avô. Me encantei com elas e comecei a guardar. A coleção foi crescendo até que chegou um ponto em que precisei de outro lugar para colocá-la – relembra.
Mesmo sem fazer parte dos nossos planos iniciais de viagem, esse desvio valeu cada minuto. O lugar é lindo. O armazém é um encanto, repleto de louças, baleiros e apetrechos da época. Mas para mim, a capela foi o destaque. Pequena, delicada e aconchegante. O altar aguarda a finalização do empreendimento para abrigar um Santo Antônio.
Ah, até o momento o parque ainda não foi aberto ao público. Enquanto estuda a melhor forma de conduzir o turismo no local, o senhor Fitarelli recebe pequenos grupos e os guia por entre os prédios.
Rua Ari José Piva, 291
Telefone: (54) 3462- 3184