O salão já não é tão cheio e colorido como nos tempos áureos, nas décadas de 1970 e 1980. As marchinhas deram espaço ao axé, as fantasias ficaram mais discretas, e a decoração das festas, mais simplista. O que não muda é a empolgação dos foliões que pulam o Carnaval nos clubes do Litoral Norte.
Um público estimado em mil pessoas divertiu-se na madrugada deste domingo no salão principal da Sociedade dos Amigos de Capão da Canoa (SACC). Não está nem perto da multidão de 4 mil foliões que frequentavam seguidas noites de festa há pelo menos duas décadas. Para diretores da entidade, no entanto, a possibilidade de resistir à concorrência dos clubes noturnos e festas particulares já é motivo suficiente para comemorar.
– Antigamente, os carnavais dos clubes eram foco das atenções do público. Agora, temos de disputar com as raves, festas de pagode e, principalmente, os carnavais realizados dentro dos condomínios fechados – afirma o presidente da SACC, Marcelo Ramos.
Leia também
Saiba como foi o segundo dia de desfiles do Carnaval de São Paulo
Sábado de Carnaval tem mar azul e céu sem nuvens no Litoral Norte
O que deu certo e o que não funcionou no Carnaval de Rua deste sábado em Porto Alegre
Além do clube de Capão da Canoa, somente a Associação dos Amigos da Praia Torres (SAPT) e a Sociedade dos Amigos do Arroio do Sal (SAAS) abriram as portas para os blocos nesse fim de semana. Para que pudesse seguir com a tradição, eles tiveram de reduzir as noites de Carnaval para somente uma e apostar no diferencial do evento: um ambiente seguro e familiar, onde podem se reunir foliões de todas as idades.
Foi preciso se adaptar. A decoração da SACC, que nos tempos de auge sobressaía com temas como "Egito Antigo" e "Alegrias do Momo", neste ano se resumiu a serpentinas penduradas no teto e máscaras de Carnaval coladas nas paredes. As fantasias há tempos foram substituídas por colares havaianos e abadás customizados. No salão, ganha cada vez mais destaque a maquiagem com toques de purpurina – que, resistente aos banhos, ficam como recordação da festa pelos dias seguintes.
Ana Berenice Radtke, 67 anos, que costumava pular os carnavais da SACC vestida de Pedrita, personagem dos Flintstones, apostou no vestido e na maquiagem colorida e caiu no salão – não sem deixar de relembrar os velhos tempos.
– Frequentávamos as animadas festas nos anos 1970, quando se vinha com a família inteira. Era o tempo de marchinhas como Nega do Cabelo Duro e outras tantas, que nem podem mais ser cantadas hoje. Amanhecíamos neste salão e depois saíamos para comer uma bela sopa na casa de alguém – conta Ana Berenice.
As marchinhas, hoje, pipocam lá pelas tantas entre as já consagradas músicas de Carnaval, como É o Bicho, de Ricardo Chaves, e Carro Velho, de Ivete Sangalo. Independentemente do estilo musical, no entanto, a banda Cia Show 4 animou o público que varou a madrugada. Não ficaram de fora o senhor de 80 anos que vestia um chapéu de pirata, nem o de 70, que estava de saia escocesa.
– O Carnaval mudou muito, mas ainda está bonito – avalia Cauby Maluf, 68 anos, que foi presidente da SACC por quase duas décadas.
Maluf começou sua história dentro do clube no início dos anos 1980, como diretor social. Naqueles tempos, eram quatro noites seguidas de folia, cada uma delas chegava reunir até cinco mil pessoas. Segundo o "presidente eterno", como é conhecido pelos sócios da SACC, era até difícil sair de casa durante o Carnaval. Bastava abrir a porta para dar de cara com pessoas tentando conseguir ingressos, já esgotados, ou jornalistas pedindo entrevistas. Se os tempos mudaram, a alegria segue.
– É um prazer enorme podermos manter o Carnaval, ainda que seja um dia só. Temos de fazer com que passe bons momentos e saia daqui feliz. É importante seguir esta tradição. É difícil encontrar um veranista adulto que diga que não tem uma história para contar dos carnavais da SACC. Aí está a importância desta festa – diz Maluf.
A madrugada deste domingo foi a de estreia de Rafael Fonseca, 14 anos, nos carnavais de clube. Ao lado dos pais, Aldrin e Carla, o garoto ensaiava os primeiros passos no salão.
– Não sei como era antes, mas estou gostando muito – resumiu o adolescente.