A pandemia trouxe prejuízo e causou o fechamento de estabelecimentos de diferentes setores em Porto Alegre. No entanto, o mercado ligado aos animais de estimação segue colhendo resultados positivos. Dados da prefeitura da Capital apontam que o número de alvarás emitidos para clínicas veterinárias e pet shops mais do que triplicou de 2020 a 2022.
Em 2020, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo (Smdet) registrou 31 alvarás emitidos para clínicas, consultórios e hospitais veterinários. Neste mesmo período, foram 32 alvarás emitidos para os pet shops. No ano seguinte, já foi possível perceber uma evolução nos números.
Em 2021, foram emitidos 80 alvarás para as clínicas veterinárias e 84 para pet shops - cerca de 160% de aumento nos dois setores em um ano. Agora, até julho de 2022, já foram 104 alvarás para clínicas veterinárias e, pelo menos, 107 para pet shops.
Ainda conforme os dados da secretaria, em anos anteriores, a emissão de alvarás tanto para as clínicas quanto para os pet shops apresentava um ritmo menor. Em 2019 e 2018, por exemplo, não passava de 23 documentos ao ano (confira o gráfico).
A Smdet ressalta que estabelecimentos com um pet shop são considerados de baixo risco e, por isso, não possuem a obrigatoriedade de ter um alvará. A lei, no entanto, não se aplica para as clínicas, consultórios e hospitais veterinários, que são considerados de médio a alto risco.
Essas determinações estão incluídas na lei municipal de liberdade econômica, que foi regulamentada em 2021. A lei também alterou processos da prefeitura para abertura de estabelecimentos, com a simplificação de etapas e redução da burocracia.
Outro ponto é que essas licenças são emitidas por ano para cada atividade, sendo que um local pode ter mais de uma atividade. Por exemplo, um pet shop pode ter alvará também para ser clínica.
O secretário Municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo, Vicente Perrone, destaca que estas mudanças tenham papel importante para o aumento na emissão de alvarás. Conforme Perrone, atualmente o processo de regularização de uma empresa pode ocorrer em 24 horas na Capital.
O secretário ressalta ainda o papel da pandemia para o crescimento deste mercado em Porto Alegre.
— Aumentou muito o número de pets durante a pandemia, pois surgiu o home office, as pessoas ficaram mais tempo em casa e sentiram a necessidade de ter um animalzinho. Isso favoreceu muito o mercado. Ao mesmo tempo, houve um trabalho do município, de simplificar os processos e facilitar a abertura de empresas — afirmou.
O crescimento do mercado pet em Porto Alegre nos últimos anos acompanha um movimento observado em outras cidades gaúchas e até nos Estados do Sul.
Levantamento divulgado pela empresa de análise de dados DataHub aponta Porto Alegre como a segunda cidade da Região Sul do Brasil com maior aumento de estabelecimentos ligados ao mercado pet, com um crescimento de 76% na abertura de CNPJs entre 2019 a 2021. Apenas Curitiba apresentou índice maior, com elevação de 87% no mesmo período.
A expansão dos últimos anos também é observada pelo Instituto Pet Brasil (IPB), que busca estimular o desenvolvimento do mercado no país. Conforme o presidente do conselho consultivo da entidade, Nelo Marraccini, o setor nunca parou de crescer, mas, com a pandemia, passou a ter mais importância na vida da famílias.
— A pandemia mudou o comportamento das pessoas, a dinâmica das famílias. Temos, por exemplo, muitos casos de pessoas que começaram a trabalhar em casa e, agora, não pretendem voltar à rotina anterior. Essa alteração na rotina fez com que o cenário mudasse para nós. O projeto de ter um pet tornou-se possível, e aqueles que já tinham animais começaram a reparar mais nas necessidades do bichinho.
Ainda segundo Marracini, o crescimento da população animal motivou a expansão de toda a cadeia ligada ao setor - dos pet shops, passando pelas clínicas veterinárias, até creches e hotéis.
Da creche para o spa
Com a retomada de muitas atividades para o modelo presencial, o mercado pet não deixou de lucrar e novos espaços passaram a ter um aumento significativo de clientes. É o caso das creches que recebem, em sua maioria, cães.
Com duas unidades abertas e uma terceira próxima a começar a operar, a PetsGoPoa é um destes estabelecimentos que opera na Capital. Além do serviço de creche, o local oferece hotel, banho e tosa, atendimento veterinário e vende produtos para os cãezinhos.
Aumentou muito o número de pets durante a pandemia (...). Isso favoreceu muito o mercado. Ao mesmo tempo, houve um trabalho do município, de simplificar os processos e facilitar a abertura de empresas."
VICENTE PERRONE
Secretário Municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo
O sistema de atendimento é semelhante às creches infantis. Os “alunos” podem vir com os tutores ou serem pegos em casa, pelo transporte que a empresa oferece. Cada um tem sua própria mochila, feita pela creche, com uma foto do cão.
A contratação da creche é feita no modelo de planos, que são fechados de acordo com a necessidade do tutor. Durante o período que permanecem no local, os animais ficam juntos de acordo com o porte de cada um, mas não há restrições por raça.
—Eles ficam o tempo todo soltos. Então, não aceitamos cães bravos. Não aceitamos machos que não sejam castrados e as fêmeas não podem vir para cá quando estão no cio. Precisamos manter a harmonia — revela o sócio proprietário da empresa, Henrique Barbosa Arellano, 33 anos.
Quando criou a empresa com outro sócio, em 2021, Henrique não imaginava um crescimento tão rápido. Atualmente, atende até 90 cães diariamente, somando as duas unidades. Com a abertura da terceira creche, a expectativa do empresário é de quase dobrar o número de “alunos”.
— Temos muitos filhos da pandemia. São cachorrinhos entre um a dois anos, que nunca tinham visto outro cão, e sempre com o tutor do lado. Agora, com as pessoas voltando a trabalhar, ganhamos muitos clientes nos últimos meses, pois o cão não pode ficar o dia inteiro trancado em um apartamento — contou Arellano.
No dia em que GZH visitou o local, uma festa de aniversário ocorria. Toda a comida oferecida, como o bolo, sanduíches, cupcakes e brigadeiros, eram para o aniversariante – um border collie de dois anos chamado Bazuca – e os coleguinhas convidados.
Entre eles, estava a husky Nala, três anos. Natural do Canadá, a cadela veio com o casal de empresários Paulo Cardoso e Melissa Pauli Cardoso, 33 e 29 anos, respectivamente. Eles pretendem permanecer por um ano no Brasil e não tinham como deixá-la na cidade onde residem.
Aqui em Porto Alegre, Nala frequentou outras duas creches, mas não se adaptou. Paulo conta que precisava encontrar um local em que os profissionais falam inglês, já que a esposa é canadense.
—Nos primeiros 10 dias, ela estava um pouco confusa. Mas, depois, deu certo. Hoje, a Nala pede todo dia para vir para creche. Se alguém vai buscá-la, ela faz uma festa e corre para o carro. Quando eu vou levá-la e, ela escuta a chave do carro, vai correndo para perto da mochilinha dela e fica sentada esperando a hora de sair. Quando estamos chegando perto, ela começa a gritar como uma louca dentro do carro. Ela realmente adora — contou Paulo.
Em nome da saúde
E não são somente os cães saudáveis podem contar com um serviço deste tipo. Animais com alguma dificuldade motora, obesos ou mesmo já com idade avançada podem permanecer sob os cuidados de uma equipe veterinária. Os serviços de spa e day care são oferecidos pela Clínica VitalVet, que atua na reabilitação de cães e gatos.
O médico veterinário e proprietário do espaço, Ricardo de Bem Pacheco, ressalta que o day care é focado nos animais com necessidades especiais – que não caminham sozinhos, que são idosos ou ainda que têm problemas cognitivos.
— É feita uma programação de exercícios para este bichinho ao longo do tempo de permanência durante o dia na clínica para que ele tenha esse estímulo de ter interações tanto com o ambiente quanto com outros animais — ressalta.
Já o spa é destinado para o animal com obesidade, que tem condições plenas de saúde, mas, por algum motivo, não estão conseguindo fazer esse gasto energético ou estão comendo mais do que deveriam. Vai desde orientação nutricional até a realização de exercícios. O animal caminha na esteira, nada na piscina, faz circuitos funcionais.
—Infelizmente, nesse processo de humanização dos animais, eles acabam não tendo uma rotina de exercícios, passam o dia trancados em casa e, em muitos casos, com pisos que não são apropriados para o andar deles, o que prejudica as articulações. Essa união resulta ainda em ganho de peso e fraqueza muscular. A consequência disso é que muitos animais desenvolvem problemas ortopédicos e de coluna — completou Pacheco.
Assim como na creche, o serviço pode ser contratado por plano em que o tutor estabelece o número de dias que o animal irá para a clínica, aliada a orientação do médico veterinário.