A história de mais de meio século que destaca o mês de junho como referência para as lutas e reivindicações do movimento LGBT+ remonta a um episódio ocorrido no bar Stonewall Inn, em Nova York, nos Estados Unidos. Desde que a polícia atacou com violência frequentadores do estabelecimento, ponto de encontro de gays, lésbicas e transexuais, em 28 de junho de 1969, elegeu-se a data como símbolo para o reconhecimento a essa parcela da população — e do fundamental respeito a ela devido.
Àquela época, mais de meio século atrás, ainda que a homossexualidade e a transexualidade não estivessem associadas a crimes, a manifestação do afeto em público — um beijo, por exemplo — era motivo para o emprego da força pelas autoridades.
Guilherme Gomes Ferreira, assistente social, professor do Departamento de Serviço Social na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), coordenador do Centro de Referência LGBT da universidade e ativista na ONG Somos — Comunicação, Saúde e Sexualidade, recorda que o episódio de Stonewall não foi fato isolado.
— O bar recebia muitos clientes LGBT+, era conhecido por isso e, justamente por isso, alvo de violência policial. A polícia chegava e batia. O comportamento das pessoas era a motivação da polícia — lembra Ferreira.
Ao amanhecer de 28 de junho daquele ano, os frequentadores do estabelecimento, junto de moradores da vizinhança, no bairro de Greenwich Village, reagiram, impulsionados, em grande parte, pelo ativismo de mulheres trans de origem latina, como Sylvia Rivera.
— Foi um marco — resume o professor.
Outros países se apropriaram da data, que foi ganhando força ao longo dos anos. No Brasil, os movimentos mais organizados começaram a surgir nas décadas de 1970 e 1980, conforme Ferreira. Iniciativas acadêmicas protagonizadas, especialmente, por lésbicas também foram fundamentais.
Para Ferreira, o 28 de junho — e o mês como um todo — ganha ainda mais importância na atualidade brasileira. Trata-se de um momento de “acirramento do gueto”. Apesar da legitimação de demandas conquistadas nos campos da saúde e da Justiça (a troca de nome no RG, o casamento civil, a abertura de ambulatórios específicos para pacientes transexuais), ocorre, em paralelo, o avanço do pensamento e da intervenção conservadores.
— Temos que celebrar, mas é uma luta constante. Essas afirmações de direitos humanos não estão garantidas, podem ser retiradas muito facilmente. Fazia muito tempo que não tínhamos um momento político tão retrógrado. Marcar a data é para afirmar nosso lugar na sociedade e conquistar mentes e corações — comenta o ativista.
Para Ferreira, o conservadorismo nos costumes que consta da agenda política, reflete o pensamento da sociedade, por sua vez representada pelo governo federal.
— O fato de conquistarmos mais direitos também faz com que o movimento conservador apareça de forma mais evidente — reflete.
O mês deve ser de pró-atividade, incentiva Ferreira: o tema dos direitos LGBT+ deve pautar conversas e ações em empresas, escolas e instituições públicas. As paradas livres — a de Porto Alegre foi transferida para o próximo domingo (12), devido à previsão de mau tempo no final de semana passado — são uma oportunidade de celebração, que não está dissociada de outros aspectos.
— Algumas pessoas dizem: “Ah, é um dia em que fazem festa, deveriam estar lutando por direitos”. Mas a festa não está dissociada da luta. É um momento para poder se expressar, lembrar nossas reivindicações. Conquistamos muito, mas temos muito o que conquistar. Celebramos lembrando que os governos têm que investir em políticas públicas. Reivindicamos o que ainda é preciso, celebramos, contestamos — diz o assistente social, destacando a necessidade de mais atenção para aqueles que ficaram desempregados e em condição de maior vulnerabilidade no período da pandemia.