Nas escolas brasileiras, 4 milhões de meninas passam por ao menos uma privação de higiene, como infraestrutura básica ou acesso a absorventes. Segundo relatório do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), o cenário é ainda pior para quase 200 mil destas alunas, que estão totalmente privadas de condições mínimas para cuidar da menstruação no colégio.
Nesta terça-feira (14), os senadores aprovaram a distribuição gratuita de absorventes no Brasil e encaminharam o projeto de lei para sanção presidencial. Antes do Senado, o texto para o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual (PL 4968/2019) já havia sido aprovado na Câmara dos Deputados, em agosto. O projeto é uma tentativa de ajudar a resolver questões ligadas a chamada pobreza menstrual.
No Estado de São Paulo, a Secretaria Estadual de Educação lançou, em junho, um projeto chamado Dignidade Íntima. O governo paulista destinou R$ 30 milhões para as escolas disponibilizarem absorventes a 1,3 milhão de alunas da rede estadual. O recurso foi planejado para o período de um ano e veio do Programa Dinheiro Direto na Escola que faz repasses diretamente para as Associações de Pais e Mestres. Como incentivo inicial, o projeto ainda recebeu doação de 2 milhões de absorventes de uma empresa de higiene íntima.
Cada escola tem autonomia para entender as necessidades das alunas e adquirir outros produtos, como lenços umedecidos, calcinhas absorventes ou coletores menstruais. Para o Secretário da Educação do Estado de São Paulo, Rossieli Soares da Silva, mais do que apenas enviar recursos, o essencial é que cada menina se sinta bem e respeitada, por isso a iniciativa foi acompanhada de formações para professores, direção, funcionários e grêmio estudantil, além de campanhas de conscientização para que as estudantes se sentissem à vontade para pedir ajuda a qualquer pessoa dentro do ambiente escolar.
— Isso é fundamental para a menina permanecer. Ela não pode estar fora da aula. A pobreza menstrual é excludente, ela tira essa menina da escola, está tirando do convívio e fazendo com que ela sofra bullying, além de outras marcas que vai deixar na sua vida — comenta o secretário.
A Escola Estadual Heckel Tavares, que fica na zona leste de São Paulo, recebeu R$ 12 mil do programa para beneficiar 454 estudantes entre 10 e 18 anos (226 delas se encaixam nas condições de vulnerabilidade social). A diretora Jucilane Araújo Freitas conta que vive uma relação próxima com a comunidade há três anos e que a instituição chega a ser procurada pelas famílias dos alunos para conseguir alimento e cestas básicas.
— O absorvente é caro. Uma mãe quando tem dois ou três filhos não tem como comprar. É o caso de uma mãe que me disse que não mandou a menina pra escola porque ela estava usando um papel higiênico e não tinha absorvente — comenta a diretora, que relembra que na hora entregou um pacote para que as duas já levassem para casa.
A vergonha de pedir ajuda também é um desafio a ser vencido por lá. Uma estudante do 9º ano, de 14 anos, diz que já teve que improvisar com os panos e roupas velhas para ir estudar e conta que viu colegas deixarem de ir à aula porque não tinham absorventes. Para a adolescente, falar mais sobre o assunto é o que pode mudar esta situação.
– Se elas virem alguém falando, vão perder esse medo, porque é muito ruim você perder aula e ganhar falta por causa de absorvente – afirma a estudante.
Em busca de trabalho, Ednalda Maria da Silva, de 33 anos, explica que o orçamento limitado dificulta a compra de absorventes para as duas e para a outra filha de 11 anos. Caçula de seis irmãos, ela lembra que na sua infância também faltava muita informação.
– Quando eu menstruei eu nem sabia o que era isso. Eu fui perguntar pra uma vizinha e ela que me explicou, daí eu usava pano. Ela [sua mãe] não tinha condições nem de bancar alimento, imagina de absorvente – relembra.
Rio Grande do Sul tem projetos aguardando na Assembleia Legislativa
Na Assembleia Legislativa gaúcha, a deputada Luciano Genro (PSOL) enviou dois projetos de lei para combate à pobreza menstrual. Atualmente, eles estão parados na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que é a primeira por onde passam todos os projetos de lei.
O PL 158/2020 cria a política Menstruação Sem Tabu e prevê distribuição de absorventes nas escolas e comunidades carentes, além de ações de conscientização sobre o tema e inclusão do absorvente como item obrigatório na cesta básica. Já o PL 96/2021 prevê a disponibilização em presídios e incentiva a criação de cooperativas para as detentas fabricarem absorventes.
O deputado Sérgio Peres (Republicanos) é o relator dos dois textos na CCJ. O parlamentar já deu um parecer favorável ao PL 158, mas ainda precisa tratar do outro. Como ambos têm o mesmo objeto, somente quando ele apresentar os dois pareceres, as propostas serão votadas na comissão.
Como eu posso ajudar?
- ONG Dia do Amor – Porto Alegre
Recebe doações de absorventes e itens de higiene pessoal. Contribuições financeiras: Dia do Amor (Banco do Brasil Ag 4612-4 CC 26201-3. Chave PIX - CNPJ 36287.872/ 0001-20 Contato pelo Instagram @diadoamor e www.diadoamor.org.br
- Mais Empatia – Porto Alegre
Entrega doações e no dia 25 de setembro terá mais uma ação para levar marmitas e kits de higiene. Chave do PIX: igorcarbonim@gmail.com Pontos de coleta e mais detalhes para a entrega pelo Instagram @maisempatiapoa
- Projeto Sobre Nós – Porto Alegre
Recebe doações de roupas, absorventes e alimentos não perecíveis Chave do PIX 51 98050-5328 Entregas na Avenida Desembargador André da Rocha, 216 Mais informações pelo Instagram @sobrenos_poa
- Absorventes do Bem – Porto Alegre
Perfil no Instagram (@absorventesdobem) que divulga ações e facilita doações a projetos que precisam.
Para assistir no streaming
Documentário Absorvendo o Tabu (2018): a produção indiana ganhou o prêmio de Melhor Documentário em Curta Metragem no Oscar 2019 e mostra mulheres de uma vila na Índia rural produzindo absorventes e como a questão da menstruação ainda é um estigma social no país. Disponível na Netflix.
Filme Homem-Absorvente (2018): o longa indiano conta a história de um empreendedor enfrenta a humilhação pública e resistência para vender absorventes com valores acessíveis para que até as mulheres mais pobres da Índia possam comprar. Disponível na Netflix.