As caras e bocas feitas durante os cliques são as mesmas que qualquer adolescente faria. Quem as via maquiadas, de vestido longo e cabelo arrumado, fazendo poses no salão e no jardim da Catedral Metropolitana de Porto Alegre, nesta quarta-feira (8), não conseguiria imaginar tudo o que aquelas meninas já passaram em seus 15 anos de vida. Com tratamentos longos, que, às vezes, envolvem cortes e mudanças no corpo e nos cabelos, as jovens associadas ao Instituto do Câncer Infantil (ICI) ganharam um “dia de princesa”, seguido de um book organizado pelo fotógrafo Dionathan Santos, para marcar seus aniversários.
Moradora de Viamão, Erica dos Santos Colares usava um longo vestido rosa, que combinou com as pétalas de ipê roxo caídas no jardim da Catedral e com o guarda-chuva que a garota empunhava em alguns cliques. A jovem enfrentou dos seis aos 10 anos o tratamento contra um câncer no rim. Dessa época, a adolescente lembra de pouca coisa – recorda que frequentou pouco o primeiro ano do Ensino Fundamental, chegou a ficar 18 dias internada no Hospital Nossa Senhora da Conceição e que uma professora ia visitá-la, como forma de apoio.
— Eu ter passado pelo câncer não é uma coisa que eu vá esquecer. Não muda muita coisa na minha vida agora, mas E. Mas, felizmente, deu tudo certo — relata Erica.
Desde então, a jovem se vinculou ao ICI e, lá, faz consultas de rotina, especialmente para monitorar a saúde renal, já que precisou retirar um dos órgãos, mas também busca serviços de outros tipos, como dentista, psicólogo e nutricionista. Quando recebeu o convite do instituto para fazer as fotos, gostou da ideia.
— Eu já tinha pensado em fazer uma festa de 15 anos, mas acabou que não deu. Aí, quando ofereceram esse book, achei uma oportunidade legal — conta a menina, que foi à Catedral Metropolitana acompanhada dos pais e de uma amiga.
A mãe de Erica, Iloides Godoi dos Santos, de 46 anos, parecia mais animada com a chegada dos 15 anos da filha – celebrados em junho – do que a adolescente.
— É um sonho que se realiza, ela estar fazendo 15 anos, como é o sonho de qualquer mãe, mesmo que a gente não tenha podido dar a festa. Eu estava nervosa por ela, mas acho que ela estava mais do que eu — comenta Iloides.
Outra das 12 contempladas com o book foi Ebony Batista da Silva, que escolheu um vestido longo, azul-marinho, para usar na ocasião. A garota não enfrentou câncer, e sim a anemia falciforme quando tinha três anos. Rara, a doença é genética e já havia ceifado a vida de tios e de uma irmã que a adolescente não chegou a conhecer. A salvação foi a doação de medula óssea da irmã Shayla Batista da Silva, de 21 anos, que acompanhou a jovem durante a sessão de fotos.
— Eu lembro que os médicos do Hospital de Clínicas me diziam que eu ia salvar a minha irmãzinha. Na época, não entendia o que significava aquilo, mas, quando fiquei mais velha, pensei: nossa, que sorte, muita sorte, eu ser compatível — ressalta Shayla, que é modelo e trancista.
Ebony ficou sabendo do projeto do ICI quando viu fotos e vídeos de outras meninas, contempladas com books na edição passada. Com a pandemia, a adolescente não pôde fazer a grande festa de 15 anos que gostaria, mas sente que a data, festejada em janeiro, está bem marcada com o ensaio fotográfico.
— É meio que uma realização de um sonho, por isso, topei. Eu sempre quis tirar foto de vestido grande e maquiagem e sei que os 15 anos são um momento importante. Todo mundo diz que depois passa rápido, então eu tentei aproveitar a oportunidade — comenta a garota.
Iniciativa começou em 2017
Responsável pelo projeto, iniciado em 2017, o fotógrafo Dionathan Santos diz que todas as meninas vinculadas ao ICI que festejam 15 anos naquele ano são contempladas. Aliás, não excluir ninguém foi o que motivou o profissional a iniciar a ação.
— Eu cheguei ao ICI porque um parceiro meu quis fazer uma boa ação e pediu que eu escolhesse alguém para fazer um book, que não tivesse condição de contratar meu serviço, que ele pagaria. Fui ao instituto e pedi indicação de alguma menina que fosse fazer 15 anos. Eles me deram uma lista de 16 adolescentes e disseram que eu poderia escolher qualquer uma. Eu disse que não dava para escolher uma, procurei parceiros e conseguimos fazer book e festa gratuita para elas — lembra o fotógrafo.
A ação marca o Setembro Dourado, que visa mostrar a importância do diagnóstico precoce do câncer infantojuvenil. No Rio Grande do Sul, cerca de 500 crianças e adolescentes são diagnosticadas por ano com tumores. O projeto consiste no resgate da autoestima das adolescentes. Parceiros fazem maquiagem, arrumam seus cabelos e emprestam vestidos para elas. As 12 participantes deste ano também ganharam um sapato e bijuterias de presente. Outras duas, por questões de saúde, não puderam participar. Para estas, o book será disponibilizado quando melhorarem.