O pequeno sultanato de Brunei instaurou nesta quarta-feira (3) a pena de morte por apedrejamento para punir as relações homossexuais e o adultério com uma reforma do código penal inspirada na sharia, conjunto de leis compreendidas pelo Alcorão (livro sagrado dos muçulmanos).O ato provocou uma onda de indignação ao redor do mundo.
O pequeno Estado rico em combustíveis, situado na ilha de Bornéu e governado com mão de ferro pelo sultão Hassanal Bolkiah, se tornou o primeiro país do sudeste asiático a aplicar a nível nacional uma versão mais rígida da sharia, seguindo o exemplo da Arábia Saudita.
A nova legislação também prevê a amputação de um pé ou de uma das mãos para os ladrões. O estupro pode ser punido com pena de morte, assim como ofensas ao profeta Maomé. Alguns artigos do código penal, como o apedrejamento por homossexualidade, se aplicam tanto aos muçulmanos como aos não muçulmanos.
O novo código penal foi criticado pela Organização das Nações Unidas (ONU) e por vários governos e ONGs, assim como por várias personalidades do mundo do entretenimento, como George Clooney e Elton John, que pediram um boicote aos hotéis de luxo vinculados ao sultão de Brunei.
O sultão Bolkiah, que lidera a monarquia desde 1967, não fez referência à entrada em vigor das novas leis em um discurso pronunciado nesta quarta-feira, mas defendeu um islã mais forte.
— Quero que os ensinamentos islâmicos neste país sejam reforçados — disse Bolkiah em um centro de convenções nas proximidades da capital Bandar Seri Begawan.
A convocação para a oração deve ser ouvida em todos os locais públicos, não apenas nas mesquitas, para recordar os deveres, disse o sultão.
Condenação internacional
— Brunei é um país justo e feliz — afirmou o sultão em resposta às críticas. — Quem desejar visitar este país terá uma experiência agradável e se beneficiará de um ambiente seguro e harmonioso.
Representantes do governo confirmaram a entrada em vigor do novo código nacional, que segundo os críticos atenta contra os direitos humanos.
Phil Robertson, subdiretor da ONG Human Rights Watch, considera que o texto é "bárbaro em sua essência" e "impõe castigos arcaicos por atos que nem sequer deveriam ser considerados crimes".
Para a União Europeia (UE), alguns aspectos da legislação supõem "tortura ou atos cruéis, desumanos e degradantes". O governo dos Estados Unidos afirmou que a nova legislação é contrária às "obrigações internacionais relativas aos direitos humanos".
O sultão, dono de uma das maiores fortunas do mundo, anunciou em 2013 a progressiva aplicação da sharia.
Com o novo código, as relações homossexuais podem ser punidas com a pena de morte por apedrejamento no caso dos homens e de 10 anos de prisão no caso das mulheres. Até agora as relações entre homens, que já eram ilegais em Brunei, eram castigadas com a pena máxima de 10 anos de prisão.
Um habitante homosexual de 33 anos do sultanato criticou as leis "injustas e cruéis", que não deveriam ser aplicadas.
— Isto tira a alegria de viver, a liberdade de expressão, me deprime tanto — disse sob a condição de anonimato.
Zulhelmi bin Mohamad, uma mulher transgênero de 19 anos que fugiu de Brunei no ano passado e pediu asilo no Canadá, afirma que a comunidade LGBT do país, que já vive "muito escondida", sofrerá ainda mais.
— Alguns estão muito preocupados e gostariam de fugir do país antes que descubram que não são heterossexuais — disse.
Os primeiros dispositivos do novo código foram instaurados em 2014, com multas ou penas de prisão por exibicionismo ou ausência na oração de sexta-feira.
É difícil avaliar o sentimento da população ante a aplicação da sharia em Brunei, já que a maioria dos 435 mil habitantes evitam criticar o sultão.
Mas se acredita que tem um amplo apoio entre os muçulmanos malaios, que representam 70% da população.
Para os analistas, o sultão Bolkiah busca reforçar sua imagem de líder islâmico diante dos mais conservadores no momento em que a economia nacional, baseada no petróleo, dá sinais de enfraquecimento.
De fato não há certeza de que a pena mais severa, o apedrejamento, será aplicada algum dia.
As condições para que a justiça determine uma sentença deste tipo permanecem excepcionais: um acusado deve confessar o crime ou cometê-lo na frente de pelo menos quatro testemunhas.