O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu nesta terça-feira (26), por maioria, que os cartórios brasileiros não podem registrar como união estável as relações poliafetivas, entre três ou mais pessoas.
O pedido de providências foi proposto em 2016 pela Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS), que solicitou, em liminar, a proibição do reconhecimento do poliamor por dois cartórios em São Vicente (SP) e em Tupã (SP), que teriam lavrado escrituras de uniões estáveis poliafetivas.
Sete conselheiros acompanharam o voto do relator João Otávio de Noronha, Corregedor Nacional de Justiça, pela procedência da representação. Outros quatro acompanharam a divergência aberta pelo conselheiro Aloysio Corrêa, que entende ser possível lavrar escrituras públicas em que se registre a convivência de três ou mais pessoas por coabitação. Contudo, de acordo com o seu voto, não se pode equiparar essas escrituras à união estável e à família.
O conselheiro Luciano Frota foi o único a votar pela improcedência absoluta do pedido, sendo totalmente favorável à união poliafetiva, inclusive, considerando-a união estável.
Ao proferir o resultado, a presidente do CNJ, ministra Cármen Lúcia, destacou que não é atribuição do conselho autorizar ou proibir a união poliafetiva, mas julgar se cartórios podem adotar registros de relação entre três ou mais pessoas.
— Aqui nós não estamos tratamos da relação entre as pessoas, mas do poder de um cartório de receber a escritura.
Em seu voto contra a possibilidade de cartórios brasileiros registrarem como união estável as relações poliafetivas o relator afirmou não haver amparo na legislação.
— Não quero ser tomado por um moralista, não estou julgando pelo meu pensamento, mas com a consciência jurídica formada no substrato social que impera neste país. E nosso substrato social ainda não deu essa abertura para admissibilidade do poliamor. E nem sei se dará — disse.
— Se pessoas querem viver em relação de poliamor, que vivam. Escritura declara a vontade jurídica das coisas. Não estamos discutindo se pode ou não pode, mas a possibilidade de normatizar atos cartorários — concluiu.
Na última sessão, no final de maio, antes de ser interrompida pela segunda vez por um pedido de vista, o conselheiro Aloysio Corrêa, ministro do Tribunal Superior do Trabalho, defendeu que todos os cidadãos têm liberdade de escolher seu par, independente para construir sua família.
— Ainda que não seja possível reconhecer união poliafetiva como união estável nem equipará-las à família, não pode negar direito à escritura pública.
— O que tratamos não é união estável, não se equipara à família. Mas pessoas que convivem podem chegar e registrar em escritura pública uma convivência, pode ser amorosa ou não. Há irmandades que se unem como fato social por convivência poliafetiva — afirmou.
Corrêa julgou o pedido procedente em parte, afastando a proibição de escritura da união poliafetiva, limitando-a ao reconhecimento da sociedade de fato. Assim, de acordo com seu voto, fica impedido que o poliamor se equipare à união estável para efeito constituição da família, inclusive para efeitos patrimoniais.
Em seu voto, o conselheiro Luciano Frota defendeu as relações poliafetivas.
— O Direito deve acompanhar a dinâmica de mudanças sociais sob pena de não cumprir papel de pacificador das relações. Nosso Direito é baseado em princípios e possibilita atualização do conteúdo pela releitura de seus institutos — afirmou.
De acordo com ele, "proibir o poliamor com base em conceito vetusto de família seria perpetuar a situação de exclusão e negação de cidadania que não se coaduna com valores democracia". Em sua arguição, o conselheiro Marcio Schiefler afirmou que o tema "tem de ser discutido no Legislativo, não no CNJ".