"E se a morte não for nada senão som?", pergunta o protagonista de Ruído Branco, romance de 1985 de Don DeLillo. "Ruído eletrônico", responde sua mulher. "Uniforme, branco."
Para DeLillo, a saturação auditiva de fundo da vida cotidiana – micro-ondas apitando, jingles comerciais, carros nas rodovias – significava a morte e nossa tentativa de negá-la. Comparado com a paisagem sonora digital moderna, no entanto, sua época era muito silenciosa. Ruídos inorgânicos bombásticos que tentam capturar a atenção das pessoas estão se tornando a norma, alertas sonoros incômodos desencadeiam respostas pavlovianas e sons simulados estão suplantando os analógicos.
Pense na cacofonia produzida pelos celulares e tablets de hoje. Além da lista de ringtones que podem ser ouvidos, há sussurros e bips das mensagens de texto; o clique da digitação; alarmes que soam como relógios analógicos e pios de pássaros reais; o barulho da lente da câmera; e sons para várias outras funções e aplicativos. Existem também os ruídos dos computadores: o farfalhar dos arquivos sendo "jogados" no lixo (e o som do lixo sendo "esvaziado"), alertas de e-mail, sinos de inicialização e desligamento.
Estamos suficientemente habituados a esses efeitos sonoros, e sua presença em séries de TV e filmes não é mais uma novidade. É mais estranho ouvir o ruído de um telefone fixo em um programa atual do que a batida da marimba que vem com o iPhone.
Games jogados em equipamentos móveis podem ser onde os sons mudaram mais na última década. Os celulares possuem uma faixa dinâmica pequena, o que significa que a diferença entre as porções mais suaves e mais altas é limitada se comparada com, digamos, um cinema com um sistema de som de alta qualidade.
— Tudo é mais alto nos jogos. Eles são programados para ter sons ricos em transições que possuem ataque incisivo, um acúmulo rápido e percussivo de energia, como alguém estalando os dedos, em oposição a uma nota se desvanecendo em um violino — afirma Jean-Luc Cohen-Sinclair, professor assistente de Produção e Design Eletrônicos da Faculdade de Música Berklee e da Universidade de Nova York que trabalhou no projeto de sons para jogos.
Por que é tão fácil ouvir os sons quando outra pessoa está jogando? Cohen-Sinclair afirma que os designers acentuam a frequência sonora de porte médio, que se traduz melhor para fones de ouvido e caixas de som pequenas, e para as quais os ouvidos humanos são mais sensíveis. Como os jogos em geral competem com ruídos externos, eles também contêm sons mais altos, que frequentemente vazam dos fones de ouvido dos jogadores.
O uso constante de fones de ouvido e a presença contínua em locais públicos com muitos decibéis levam à perda auditiva (a Organização Mundial de Saúde estima que mais de 1 bilhão de adolescentes e jovens correm esse risco), forçando os ouvintes a aumentar ainda mais o volume. E, claro, há o ocasional altruísta que deixa de lado os fones e generosamente permite que os outros compartilhem dos sons melodiosos de seu jogo, sua música ou seu vídeo.
Tendemos a pensar em estímulo visual como a força dominante da distração na cultura moderna. No entanto, fomos condicionados fisiologicamente para responder a essas pistas auditivas com picos de dopamina, especialmente quando o alerta é para recompensas de validação das redes sociais. É difícil não reagir ao som de um texto que chega ou de um novo seguidor no Twitter.
Algo parecido certamente foi pensado quando inventaram o toque do telefone antigo, mas as chamadas telefônicas aconteciam em um ritmo muito mais lento, tomavam mais tempo e raramente envolviam o chamador (muito menos centenas deles) reafirmando o quando eles "gostam" de você.
Marcas digitais desenvolveram estratégias de impressão que permeiam nossos cada vez mais curtos intervalos de atenção sonoros. As redes de televisão e filmes e as produtoras têm assinaturas de áudio desde que o som invadiu as telas. Pense, por exemplo, na fanfarra que acompanha o icônico logotipo da 20th Century Fox, o leão rugindo da MGM ou o carrilhão de três tons da NBC.
Compare com os canais populares da era do cabo e dos serviços de streaming. A HBO há tempos começa seus programas com um ruído de televisão que leva a um campo estático e termina em um zumbido etéreo. A Netflix possui uma badalada de tímpano duplo de quatro segundos seguida de um som de cordas. As ofertas da Amazon Originals começam com um som sussurrado e terminam com uma série de campainhas vibrantes. O novo logotipo da 21st Century Fox deixa de lado os arranjos orquestrais e termina com vários bips que parecem o som do robô R2-D2.
Enquanto a velha guarda privilegiava a musicalidade e os sons orgânicos e tentava criar assinaturas que as distinguissem e, de alguma forma, representassem a marca, a nova onda parece preocupada principalmente em assegurar a atenção imediata da audiência, em um tempo mínimo, por meio de ruídos dissonantes e sintetizados que no final são intercambiáveis com os de outras empresas.
— É uma maneira implacavelmente corporativa de tentar atrair a atenção da plateia. A escala de atenção pedida ao público de um episódio de série na Netflix é comparativamente menor do que aquela grande experiência cinemática para a qual a fanfarra da 20th Century Fox preparava as pessoas — explica Paul Grimstad, escritor e compositor de Nova York que fez a trilha de vários filmes.
Vários efeitos sonoros digitais, como o da câmera fotográfica, podem ser classificados como "skeuomórficos", ou objetos de imitação que usam as características de design do original de maneira ornamental (como as costuras falsas em assentos de couro sintético). Sua ubiquidade sugere um cenário auditivo pós-moderno em que o artificial está cada vez mais substituindo o real. Para as pessoas que cresceram ouvindo apenas sons reais, as novas diferenças são provavelmente mais claras.
— Uma pessoa de 80 anos e outra de 12 terão respostas diferentes a um mesmo som — diz Will Mason, professor visitante de Teoria da Música em Oberlin.
Mas a criança de 12 anos não necessariamente vai estar em desvantagem, segundo ele:
— Queremos privilegiar os sons reais sobre os sintetizados, e gostaríamos de pensar que uma mudança nesse cenário caracterizado por sons artificiais é um elemento distópico. Mas fico pensando no motivo por que falamos que é uma distopia. Parece haver uma maneira automática, intuitiva em que essa é a postura padrão e na qual o real é sempre preferível.
Um dos motivos, além de nosso ceticismo de longa data sobre as imitações sintéticas, pode ser a preponderância de vozes maléficas e ambíguas da inteligência artificial na ficção científica, desde o HAL 9000 de 2001: Uma Odisseia no Espaço até a Samantha do filme Ela, de 2013. A maioria de nós tem nossos próprios HALs e Samanthas na forma da Siri e de outros assistentes virtuais de celulares, que, apesar de rudimentares nesse momento, devem eventualmente se aproximar da fluência de seus antepassados fictícios. Suas habilidades de simulação de fala, juntamente com sua mobilidade, estão nos acostumando a um futuro em que os espaços públicos estarão inundados de vozes digitalizadas e gravadas sobre todos os bips e apitos aos quais já estamos acostumados.
Por anos, o único anúncio automatizado familiar aos usuários do metrô de Nova York era "Fique longe das portas se fechando, por favor", mas agora há uma série deles para substituir essas mensagens supostamente ao vivo. As novas incluem o imperativo bem conhecido que incita os passageiros a ficarem atentos a pacotes deixados nos trens – uma mensagem comum de anúncio de segurança depois do 11 de setembro, claro, mas que também sugere nosso conforto cada vez maior com um estado de vigilância em que as pessoas olham umas para as outras com suspeição e ainda toleram a supervisão invisível, mas audível, do governo e das corporações.
À medida que mandamos despreocupadamente nossos dados pessoais a empresas ao ouvir um som sussurrante ou um bip, pensamos menos e menos sobre a audição de tantos outros ruídos de fundo artificiais e desencarnados. Podemos não amar o Big Brother, mas parece que não temos problema com a cacofonia de seus pequenos irmãos.
Por Teddy Wayne