Sophia, de quatro anos, indagava a todo instante se precisava de cuidado para descer as escadas de casa, em Guarulhos, na Grande São Paulo, sem ajuda de ninguém. Enquanto isso, sua mãe, a dona de casa Fernanda Carmo, de 23 anos, filmava a descida, em silêncio: era a chance da filha, que é cega, vencer um obstáculo doméstico. Sua missão, gravada em um vídeo, era ir até a casa de uma tia pedir uma xícara de achocolatado.
O vídeo foi para o YouTube, onde já tem quase 6 mil visualizações, e também no perfil Princesa Sophia, no Facebook, que já tem 13,5 mil curtidas. A mãe criou a página para compartilhar na internet a rotina da filha e as experiências sobre o processo de adaptação de uma criança com deficiência visual.
A ideia de Fernanda, também mãe de Maria Eduarda, de um ano e três meses, sempre foi criar a filha de forma independente.
— É para realmente torná-la uma mulher destemida, que se ame, e ser guerreira. Desde bebê, a gente teve a preocupação de não deixar que se tornasse uma criança medrosa.
Educar uma criança com deficiência visual é mesmo um desafio e requer preparo da família.
— A maior dificuldade da criação é o emocional da família, quando se tem muito medo e superprotege demais, porque tira a oportunidade de aprendizagem e desenvolvimento — explica a especialista em orientação e mobilidade da Associação Brasileira de Assistência ao Deficiente Visual (Laramara), Nelma Meo.
A coordenadora de educação da área inclusiva da Fundação Dorina Nowill para Cegos, Eliana Cunha, também diz que os pais de crianças com deficiência visual precisam cuidar para que os filhos não se tornem dependentes.
— Atitudes práticas começam na família e depois na escola, para que ela seja independente. Quem não é independente, não se torna alguém plenamente desenvolvido. E você proporciona dignidade para a criança.
Eliana também explica que o processo de ensino de uma criança que não enxerga passa pela necessidade de desenvolver o lado do raciocínio, utilizando outros sentidos e outras formas de ensino, para que ela consiga apreender o mundo que a cerca. Hoje, o único medo de Fernanda é em relação à alfabetização de Sophia.
— No meu ponto de vista, aprender a ler Braile vai ser difícil. Eu não sei se vai ter alguém próprio para ajudá-la na escola. Mas ano que vem ela começa no cursinho e essa é a minha única preocupação no momento — afirma a especialista.
Sem desistência
Se depender de Sophia, os medos de Fernanda serão facilmente superados.
— Desde pequena, ela sempre foi destemida. Sempre que batia em alguma coisa, ela não parava — conta a mãe.
— Quando aprendeu a andar, por mais que batesse nas coisas, ela não desistia — acrescenta.