A vida não é como um comercial de margarina. Cada novo ciclo na rotina de um casal é um prato cheio para crise, e uma boa conversa nem sempre é capaz de solucionar todos os conflitos. Por isso, a ajuda especializada pode ser a solução para melhorar a relação _ ou terminá-la de vez.
O argumento é simples: compreender o outro isento de julgamentos e expectativas é algo complexo. Por isso, a análise e intervenção de um terapeuta de casal pode evitar que você e seu par despejem reclamações e frustrações um sobre o outro. Quando dois mundos diferentes se encontram em um relacionamento, bagagens culturais, genéticas, mentais, orgânicas, espirituais e financeiras entram em colisão direta. Amaciar esse impacto depende de muita maturidade.
Embora a principal função do terapeuta seja facilitar a comunicação entre o casal, é comum que problemas de dinheiro, traição, criação de filhos e descontentamento sexual levem muita gente a buscar a terapia. E a maioria deixa para pedir ajuda quando a bomba está prestes a estourar. Quem afirma é a terapeuta de família e casal Clarissa Trindade Sant'Anna.
_ São poucos os que procuram em momento de prevenção ou quando está iniciando o conflito _ explica a especialista.
No caso dos dentistas Aline e Rafael Altmann, _ 27 e 32 anos, respectivamente, a história foi outra. Eles começaram a terapia individualmente, cada um por causa própria, até que seus psicólogos recomendaram que sentassem juntos no divã. Foi em julho passado que iniciaram o tratamento. Para Aline, foi natural falar sobre o relacionamento, pois ela já tinha vínculo com a psicóloga. Rafael também não teve muito receio: sendo da área da saúde, entendia que o psicólogo era um profissional capaz de fazer diagnósticos e trazer soluções.
Já a história de João*, 26 anos, foi diferente. Ele começou a se interessar por um amigo que tinha uma namorada. Aos poucos, os dois rapazes começaram a se envolver e a relação se transformou em triângulo amoroso do qual apenas os amigos mais próximos tinham conhecimento. Depois de mais de um ano na condição de "o outro da relação", João procurou uma terapeuta de casais. Ele foi sozinho na primeira sessão e prometeu levar o namorado. O rapaz resistiu, só iniciando a terapia meses depois. Após algumas sessões, os dois romperam. Mesmo que a terapia não tenha salvo a relação, João avalia que a experiência foi positiva:
_ Depois que a psicóloga perguntou sobre o meu amor próprio, comecei a pensar sobre isso. Foi aí que me dei conta de que não merecia aquela situação.
Ao contrário do que muitas pessoas acreditam, a terapia de casal não é indicada apenas para aqueles que estão juntos há muito tempo e sim para qualquer pessoa que deseja resolver os conflitos da relação. Outro mito a respeito do tratamento é de que a terapia sempre irá reunir os casais. Há situações em que a terapia é aconselhada até mesmo na hora da separação, explica a psicóloga e psicanalista Lisiane Hadlich Machado.
Foram a diminuição da admiração e, sobretudo, do desejo sexual, os motivos que levaram a secretária executiva Rose*, 59 anos, a querer dar fim a um casamento de 24 anos. Na época com 45, ela se sentia realizada como profissional, mãe e dona de casa, mas estava longe de se sentir feliz na cama. Decidida pela separação, começou a fazer terapia para tentar tornar menos amargo o sabor do fim.
_ Quando ele se deu conta que não tinha mais jeito, que eu já estava certa do que queria, parou de ir nas consultas _ comenta ela, que percebeu que sua iniciativa havia sido tardia.
Lisiane esclarece que, em qualquer relação onde há muitos conflitos e brigas, é importante procurar por ajuda profissional:
_ O mais importante da terapia é que ajuda a fortalecer. É importante sempre o respeito, a aceitação, o querer o bem do outro. Não dá para dizer se o casal vai ficar junto ou vai separar, mas o importante é a qualidade do ambiente familiar. Quando a pessoa gosta e não quer terminar, mas tem muitas brigas, é indicado fazer a terapia. É para aqueles que querem dar uma nova chance para a relação _ completa a psicanalista.
O psicólogo Diego Gonçalo Moares Gomes, sócio do Centro de Estudos Sistêmicos: Família e Indivíduo, lembra que para um casal é difícil abrir a relação para outra pessoa. Por isso, muitos casais optam pela terapia como última tentativa.
_ Tem casais que voltam para a terapia mesmo depois da separação, que é para melhorar a relação, especialmente casais que têm filhos _ comenta.
E vale a advertência: a terapia é recomendada apenas quando os dois desejam e concordam. Nos casos em que "só um quer", a opção é a psicoterapia individual ou, se preferirem, os cônjuges podem fazer o tratamento separadamente. Nas sessões, sejam elas individuais ou a dois, as pessoas podem aprender a ouvir a si mesmas e ao outro de uma forma melhor, em uma dinâmica de relação. É importante saber os motivos pelos quais você escolheu aquela pessoa para amar e o que ela significa e sua vida.
_ O relacionamento é sempre uma projeção do eu. Nem sempre as pessoas se dão conta disso e colocam a culpa no outro. Na terapia, a gente enxerga isso e analisa o que é melhor. Além disso, a pessoa tem como resultado a maturidade afetiva _ finaliza Lisiane.
Depois de 6 meses, a reconciliação
Depois de oito anos de casados, Luana e Rogério* resolveram se separar.
_ Falta de diálogo, falta de respeito, egocentrismo de ambas as partes, discussões continuas. Depois de muitas brigas, resolvemos nos separar judicialmente _ conta Rogério.
Depois de seis meses longe um do outro, eles resolveram ouvir os conselhos de amigos, que incentivavam a reaproximação. E, para facilitar a reconciliação, buscaram o serviço de aconselhamento para casais do Templo das Nações, igreja que frequentam. Hoje, o casal comemora os 15 anos de união e os três filhos.
_ A superação dependeu de nós dois. No início, não parece ser fácil, pois você inicia com a ideia de que você está sempre certa e a outra pessoa sempre errada. Mas quando você entende que, em um relacionamento, nunca um só é o errado e que a culpa é 50% de cada um, você compreende a necessidade de priorizar a vida compartilhada _ explica Luana.
Quando eles puxam a frente
A mudança da posição da mulher no mercado de trabalho influenciou para que se modificassem muito as relações familiares e amorosas. Segundo a psicóloga Helena Centeno Hintz, o fato de a mulher trabalhar fora e ser, muitas vezes, a provedora do lar deixou os homens mais comprometidos na divisão das tarefas domésticas. Isso exigiu deles a tomada de atitude e novas posições dentro da família.
_ Na terapia, não se retoma a vida que se tinha no início do casamento, por exemplo. Mas é possível encontrar novas formas de se relacionar. Pode-se mudar os objetivos, diminuir as incomodações _ afirma Helena.
Foi assim que o casal Caciano Marques, 31 anos, e Daiana Petroli, 29, conseguiu reencontrar o equilíbrio que buscava: adotaram novas estratégias para resolver velhos problemas. Eles estavam vendo a relação desmoronar por falta de diálogo. E não era por menos: depois de ter a primeira filha, Maria Luísa, quatro anos, Daiana entrou em uma crise depressiva da qual não conseguia sair. Só tinha vontade de dormir, não conversava, estava sem iniciativa. Levada pelo marido até o consultório das terapeutas Patrícia Vidal e Clarissa Carvalho, ela aceitou na marra participar das sessões de terapia. Era isso ou perder o amor de sua vida.
_ Eu queria ficar com ele, queria salvar nosso casamento, mas estava totalmente sem condições de cuidar de mim, quem dirá dele?
Conforme o tempo foi passando, Daiana se abriu para o tratamento. Aceitou fazer terapia individual, passou a administrar as questões que atrapalhavam a autoestima dela e, por consequência, foi recuperando a alegria. No andamento, conseguiu ajustar questões do comportamento dele que também lhe desagradavam. Os primeiros passos, as terapeutas fazem questão de relembrar:
_ Ela trocou as lágrimas por sorrisos, está se arrumando mais, se reorganizando. Neste ano, eles tiraram as primeiras férias juntos e trocaram alianças _ dizem, orgulhosas, Clarissa e Daiana.
NASCIMENTO DE FILHOS
- Mudanças na estrutura familiar costumam abalar as relações. A chegada do primeiro filho, por exemplo, costuma ter impacto muito grande na vida a dois. Neste período, muitos casais deixam de lado a relação em nome da prole. É o momento em que acontece grande parte das separações. A dica é procurar ajuda aos primeiros sinais de conflito e guardar momentos só para o casal.
SEXO RUIM OU INEXISTENTE
- A falta de satisfação sexual com o parceiro(a) é uma das queixas mais recorrentes na terapia de casal. Muitas vezes, essa é apenas a ponta do iceberg. A perda de intimidade ou diminuição do desejo podem ser armadilhas pregadas pela rotina e acomodação. Falar sobre sexo, prazer, cumplicidade e fantasias ajuda a diminuir esse problema, além de aliviar traumas e preconceitos.
PROBLEMAS FINANCEIROS
- Só amor não enche barriga. É bastante comum que falta de dinheiro, dívidas, desemprego ou insatisfação com a vida profissional respinguem nos relacionamentos. Cuidado para não confundir as coisas.
- Antes de sair por aí planilhando os gastos e pedindo empréstimos no banco, pare para pensar se a reorganização emocional não ajudará a colocar as finanças também em dia.
DIVÓRCIO
- Mesmo quando a decisão pelo divórcio está tomada, a terapia pode ajudar. Separação representa perda, e geralmente é dolorida para um dos lados, pelo menos. Fazer terapia pode tornar menos traumático esse período e evitar desentendimentos, principalmente quando há filhos envolvidos. Não quer dizer que vá mudar a decisão, mas, certamente, pode torná-la mais amigável.
*Os nomes foram alterados