Um dos designers mais carismáticos do país, Marcelo Rosenbaum esteve em Porto Alegre para o lançamento do programa Obra Prima, da Tumelero, e concedeu uma entrevista em que fala da atual fase voltada para o design essencial e o trabalho junto a áreas suscetíveis à desertificação.
Em que fase o seu projeto de sustentabilidade A Gente Transforma se encontra neste momento?
Estamos nos aprofundando nas áreas suscetíveis a desertificação, que são muitas e pouco faladas. Temos aproximadamente 30% do nosso território com áreas que estão a 1 grau de temperatura de virarem deserto, onde a cada ano chove menos e são locais muito quentes. É todo um trabalho de como levar subsistência e uma regeneração da terra que garanta uma agricultura. Um dos locais é Várzea Queimada, no sertão do Piauí, onde também trabalhamos a palha de carnaúba com uma metodologia de design essencial. É uma forma de usar matérias-primas ancestrais, com os saberes dessas comunidades com novas possibilidades, tecnologias e estudos, inclusive junto a universidades.
Na questão dos produtos, como fazer com que eles se tornem competitivos?
Para ter um alcance, só com políticas públicas. Um artesanato de uma comunidade do interior é tributado da mesma forma que uma indústria, então o produto fica muito caro nessa movimentação. Então, pensamos na questão de subsistência e uma cadeia de consumo próxima. Que também gera uma certa autonomia.
Quais as maiores dificuldades de iniciar o trabalho em uma nova região?
É a continuidade, criar um laço. Não são projetos que você cria e está pronto. Não é assistencialismo, mas um movimento de acompanhamento, oportunidades, de construir na comunidade as lideranças e elas estarem se adequando. Não é de um ano pro outro. A grande dificuldade é sustentar isso.
Faz quase 10 anos que o projeto teve início. Já é possível notar diferença na busca por parcerias?
Ainda é muito difícil, pois a mentalidade do brasileiro é baseada na ajuda. E o país está complicado. Uma indústria para se manter, por si só, já tem que fazer toda uma mágica. Mas o mais interessante é que com uma metodologia mais desenhada é mais fácil customizar para as empresas. Porque as marcas também precisam trabalhar o em torno de sua planta de fábrica. É uma reeducação, na verdade.
O início do trabalho ainda é uma imersão que vocês fazem nas regiões?
Sim, com certeza. A gente se relaciona, busca parceiros. É a dinâmica do terceiro setor, e a gente pensa em como transformar em setor dois e meio (risos). Porque ficamos exatamente entre o segundo e o terceiro setor. Gosto de dizer que criamos empreendimentos sociais.
Mas o escritório segue forte com setores de produtos e arquitetura.
Continuamos desenvolvendo objetos para empresas e projetos de arquitetura, claro. Mas não tem como negar nosso foco hoje. Fizemos as moradas dos estudantes da Fundação Bradesco, no Tocantins, mas até nessa proposta aplicamos a ideia de cocriação estimulada no A Gente Transforma, falamos muito com os estudantes durante todo o processo.
Como você lida com tantas possibilidades de trabalhos?
A gente tem um Brasil inteiro, cada lugar do planeta tem uma necessidade. Mas eu aprendi a me acalmar, a focar. Tenho trabalhado no processo de fazer o tempo acontecer. Se não tiver calma, você não faz nada. Não estou acomodado na urgência, mas a partir da experiência conseguimos ter processos mais eficazes.