Nasce uma interrogação no horizonte da Pátria. Sob o prisma dos que desprezam a máscara e negam a vacina, pode o governo aumentar o valor das contas ou obrigar cidadãos e empresas a desligar luzes e a consumir menos água?
Para eles, só existe uma resposta: não.
Por isso, imagino essa legião de destrambelhados acendendo mais luzes de propósito, lavando os carros ostensivamente na calçada e postando vídeos de torneiras abertas, uma forma de insurgência contra os poderes do Estado, o mesmo que não pode atrever-se, nunca, nem que seja em nome de mais de meio milhão de mortos, a tentar impor o uso de máscaras, o distanciamento social e a vacina. Para muitos, a solução é justamente usar muita água e energia até que os reservatórios sequem, porque então conquistaríamos uma espécie de imunidade de rebanho, já que estaríamos todos no escuro e com sede, mas livres das amarras do autoritarismo estatal.
Na segunda-feira, o ministro da Minas e Energia anunciou, em rede nacional, a criação da Câmara de Regras Excepcionais para Gestão Hidroenergética. Bento Albuquerque deve cair em breve. Imaginem se o seu colega, ministro da Saúde, inventasse uma Câmara de Regras Excepcionais para Gestão da Pandemia? Mandetta foi para casa por bem menos.
Essa nova crise, como tudo o que gera alguma polêmica no Brasil, vai passar pelo STF. Imaginemos que a Suprema Corte decida, por exemplo, que municípios e Estados podem criar regras para poupar energia, desde que sejam mais rigorosas do que as impostas pelo governo federal. Seria a glória.
Já antevejo, lá por janeiro, todas as luzes dos palácios de Brasília acesas à noite. E o presidente, mangueira em punho, encharcando as emas e as plantas no jardim, três vezes por dia, depois de afirmar a apoiadores, na porta do Alvorada, que botará o “seu” Exército na rua para garantir que os parques aquáticos permaneçam abertos e que a culpa pela falta de chuva e de planejamento é do STF, da China, dos esquerdopatas, da urna eletrônica, dos crocodilos, das ONGs, do kit gay e dos ateus. E que fique claro: racionamento é coisa de cubano e de coreano do norte.