A médica psiquiatra Jenny Fjell, 47 anos, lidera a campanha Alla har rätt till syrgas (Todo mundo tem direito ao oxigênio). Funcionária de uma agência estatal de inspeção de serviços de saúde da Suécia, vê com profunda desconfiança a estratégia de enfrentamento ao coronavírus adotada em seu país. A Dra. Fjell concedeu a seguinte entrevista ao Informe Especial, enquanto se recupera, em Estocolmo, de uma doença que acredita ser covid-19, mas que, seguindo a lógica do modelo adotado pelo governo local, não foi testada.
1) O modelo sueco de combate à covid-19 tem sido apontado por muitos como um exemplo a ser seguido. Qual a sua avaliação sobre a estratégia adotada pelo seu país?
A estratégia sueca baseia-se na premissa de que as próprias pessoas tomem a responsabilidade de ficar em casa quando estiverem doentes e voltem dois dias depois de melhorarem. No entanto, como há evidências de que a doença pode ser transmitida antes dos sintomas apareceram, essa estratégia está fadada ao fracasso, especialmente porque mesmo os sintomas iniciais, geralmente, são bastante leves. Apesar disso, as máscaras não são amplamente usadas e sua adoção chega a ser desencorajada por muitos setores que as consideram inseguras. As escolas permanecem abertas e obrigatórias para crianças entre 6 e 15 anos. Os alunos não estão sendo testados, nem mesmo depois que seus professores morrem. Logo, nenhum caso é encontrado no sistema de educação. Acredito que essa visão está começando a mudar bastante à medida em que as pessoas percebem que o número de mortos aqui é muito mais terrível do que nos países vizinhos. Mas a estratégia do governo ainda tem muito apoio.
2) Por que a senhora iniciou uma campanha defendendo o direito ao oxigênio?
Os governos regionais e os municípios são orientados a garantir que todos os que precisam obtenham oxigênio, mas, infelizmente, não há disponibilidade ampla para os idosos. Então, os médicos foram aconselhados a tratar a covid-19 com morfina, em vez de oxigênio. Isso é estranho do ponto de vista médico, já que a maioria dos idosos sobrevive à doença, especialmente quando o tratamento é correto. Muitas pessoas estão, portanto, morrendo em consequência das medidas paliativas baseadas em morfina, e não da própria covid-19. Um artigo recente no Dagens Nyheter, o maior jornal sueco, defendeu a interrupção dessa prática, que pode ser considerada eutanásia, ou algo pior (o jornal apurou que, na Suécia, os idosos podem receber morfina, principalmente em caso de problemas respiratórios, de acordo com as diretrizes de várias regiões revisadas pelos repórteres, o que estaria acontecendo em detrimento do uso de respiradores). A eutanásia é proibida pela lei sueca. Há médicos resistentes a discutir as objeções à noção de paliação baseada em morfina. Agora, espero que isso comece a mudar.
3) Qual a sua expectativa em relação à economia sueca?
Não conheço profundamente economia, mas estou bastante preocupada com as consequências de longo prazo para o meu país se não pararmos a disseminação, porque isso interferirá no turismo, nas viagens e nos negócios internacionais, pois outros países estão começando a adotar restrições contra nós. Infelizmente, a maioria das pessoas na Suécia parece não entender que é preciso primeiro desacelerar a contaminação por bloqueio e depois abrir gradualmente, fornecendo testes e outras medidas, como máscaras.