Carta escrita por Leonardo Soares, 15 anos, morador de Canoas, a João Pedro Matos Pinto, 14, que foi atingido por um tiro de fuzil na segunda-feira, enquanto brincava em casa, em São Gonçalo, Rio de Janeiro. A grafia do texto foi minimamente revisada para respeitar o ritmo do autor.
“João, como cê tá, meu bom? Saudade de tu menó, de batê uma bola, assar um churrasco com a família. Aqui na quebrada a saudade de ti tá enorme. A gente sempre te disse que se a gente não se cuidasse isso ia acontecer, e tu sempre se cuidou, diferente de muitos dos nossos irmãos. O pessoal tá p. porque cê era piá, e quem tá defendendo os cara tá usando os mesmos argumentos de sempre, que foram tiros de advertência e que tu atirou também. O nosso presidente não falou nada sobre tu, e nem vai. A gente sabe que tu mexe com a cabeça de uma galera que, quando não consegue achar um motivo, fala que tu era do crime, já que tu era de favela e preto. Infelizmente cê não foi sozinho, meu bom. A cada 23 minutos morre um João e a galera ignora ou esquece depois de um tempo, igual aos 80 tiros, que a gente tanto sofreu quando rolou, ou à Marielle, que nosso presidente fez piada. Enfim, eu espero que tu esteja bem aí em cima. A gente vai prometê que vamos fazer o possível e o impossível pra não esquecerem de ti tão cedo, mas a gente sabe que, cedo ou tarde, cê vai virar estatística só”.