Jango vive. Não é slogan e nem hashtag. É fato. Cem anos depois do seu nascimento, que se completam dia 1º de março, João Belchior Marques Goulart talvez já não seja tão lembrado. Mas sua história tem relação direta com o Brasil de hoje, um país que não cansa de fazer de forma errada as contas com seu passado.
Quando os militares chegaram ao poder em 1964, Jango era o presidente. Foi deposto ou fugiu para o Uruguai? Morreu ou foi assassinado?
Foi fraco ou foi forte? Voto na segunda. É opinião, não verdade absoluta. O movimento militar no continente era inevitável e uma reação violenta resultaria em centenas, talvez milhares, de mortes. Estávamos, meio sem saber, no meio de uma guerra que não era nossa. Estados Unidos e União Soviética disputavam as casas no tabuleiro geopolítico do planeta. A América para os americanos – no Norte, foi o que prevaleceu. Prevaleceria, por bem ou por mal. Jango leu os movimentos e evitou a carnificina. Isso é diferente de desistir.
Parte dessa memória está sendo registrada agora através de uma série de depoimentos registrados em vídeo (foto) pelo neto de Jango, Christopher. Figuras importantes como os ex-governadores Alceu Collares, Pedro Simon e Tarso Genro, os jornalistas Flávio Tavares, Carlos Bastos e Mino Carta, e correligionários e amigos próximos como Índio Vargas e Antoninho Àvila. Na sexta-feira, foi a vez da ex-primeira-dama, Maria Thereza.
Morando no Rio de Janeiro, próximo da filha Denise, ela voltou ao Hotel Embaixador, no centro da Capital, onde morou três anos, para conversar com o neto em frente à câmera.
Antes da gravação começar, Tetê – como é carinhosamente chamada pelos familiares, – já avisa: "Sou de falar pouco". Mas a timidez sumiu logo. Aos poucos começa a contar episódios da História brasileira com a tranquilidade de quem viu e ouviu tudo de perto. Relembrou capítulos marcantes, como o suicídio do "doutor Getúlio", até causos engraçados como a esquisita mania de "doutor Juscelino" (Kubitschek) de não gostar de calçar sapatos ou do porque preferiu morar na Granja do Torto em vez do Palácio da Alvorada.
Todas essas lembranças estarão contadas também na biografia da ex-primeira-dama, que chega às livrarias no mês que vem. Assinada pelo jornalista Wagner Willian, Maria Thereza: a mulher vestida de silêncio foi escrita tendo como ponto de partida os diários dela, redigidos enquanto estava exilada no Uruguai. Desde então, conta, já cogitava escrever um livro de memórias. Naquela época, no entanto, tinha em mente um outro título para a obra. Pensava em chamá-lo de Puertas Cerradas.
VIDA E MORTE DE JANGO
1919 – Nasce na Estância de Iguariaçá, no distrito de Itacurubi, em São Borja.
1947 – Se elege pela primeira vez para a Assembleia Legislativa, sendo o quinto candidato mais votado, a frente de seu cunhado Leonel Brizola, outra estrela em ascensão do PTB.
1950 – É eleito deputado federal.
1953 – Assume como ministro do Trabalho de Getulio Vargas.
1955 – É eleito vice-presidente do Brasil na chapa com Juscelino Kubitschek.
1956 – Casa-se com a jovem Maria Tereza, com quem teve dois filhos – João Vicente e Denise.
1960 – É eleito novamente vice-presidente do Brasil, dessa vez na chapa com Jânio Quadros.
1961 – Com a renúncia de Jânio, assume a presidência da República.
1963 – Lançamento do programa "Reformas de base".
1964 – Com ascensão dos militares ao poder, se exila no Uruguai.
1976 – Morre, de acordo com a versão oficial, vítima de um ataque cardíaco, no município argentino de Mercedes, Corrientes.