A coluna de hoje é em homenagem ao Dia do Professor, essa profissão tão importante mas tão desvalorizada. Para marcar o 15 de outubro, nesta quinta-feira, separei uma coleção de filmes e séries sobre um tipo especial de docente: aquele que, às vezes contra tudo e contra todos, vai além da matéria e tenta mudar a vida dos alunos.
O tema permite uma volta ao mundo, começando pelos Estados Unidos, cenário de um dos filmes mais emblemáticos da vertente: Sociedade dos Poetas Mortos (1989), com Robin Williams no papel do professor John Keating, que, no final dos anos 1950, mostra aos seus alunos – criados sob o conservadorismo – a importância de "valorizar o dia", ou seja, viver cada momento com intensidade. Dirigido pelo australiano Peter Weir, o drama ganhou o Oscar de roteiro original e concorreu aos prêmios de melhor filme, diretor e ator. Pode ser visto no Google Play e no YouTube.
Outro clássico é Ao Mestre com Carinho (1967), de James Clavell, em que Sidney Poitier é um professor inexperiente que assume uma classe de alunos indisciplinados e tenta ensiná-los, antes de mais nada, a respeitarem-se uns aos outros. Em cartaz no Google Play e no YouTube.
Na mesma linha, Michelle Pfeiffer interpretou em Mentes Perigosas (1995), de John N. Smith, no cinema, uma professora da vida real, LouAnne Johnson, que abandonou a Marinha para dar aulas de inglês. Logo na primeira escola, ela depara com barreiras e a rebeldia dos alunos. Então, decide partir para outra forma de ensino, usando o caratê e músicas de Bob Dylan. Saiu em DVD no Brasil.
Entre os títulos americanos mais recentes, um bastante elogiado é Escritores da Liberdade (2007), de Richard LaGravenese. Baseado em uma história real, tem Hilary Swank como Erin Gruwell, professora de uma escola da periferia de Los Angeles que desenvolveu um método para integrar alunos de diferentes grupos étnicos. Incentivando a tolerância entre jovens negros, latinos e asiáticos que costumavam se enfrentar, ela promoveu uma pequena revolução no sistema educacional do país. Está no catálogo da Netflix.
E eu gosto muito de dois educadores que não são protagonistas, mas desempenham um papel fundamental, como inspiradores ou aconselhadores. Um deles é o professor de ciências do seriado Stranger Things (2016-, disponível na Netflix). O senhor Clarke (interpretado por Rand Havens) está sempre incentivando os meninos a pensarem, e é ele que revela à turma como supostamente funcionam as outras dimensões e como acessá-las. O outro é Max Bruner (Woody Harrelson), que, a seu modo peculiar, acaba se tornando uma sábia companhia para a protagonista do filme Quase 18 (2016, em cartaz na Netflix), de Kell Fremon Craig, uma adolescente que se sente excluída de todos os grupos da escola: não se acha bonita nem é craque nos estudos ou no esporte.
Cruzando o Pacífico em direção à Ásia, chegamos ao Japão do comovente Madadayo (1993), de Akira Kurosawa, o professor é tão inesquecível que seus alunos reúnem-se todos os anos para comemorar seu aniversário e repetir um ritual de celebração à vida do velho mestre. Foi lançado em DVD no Brasil.
Ainda no continente asiático, vale destacar o empenho dos jovens professores itinerantes do filme iraniano O Quadro Negro (2000), de Samira Makhmalbaf, que na conflituada fronteira com o Iraque vão em busca dos alunos onde quer que eles estejam – com o quadro-negro nas costas. Também saiu em DVD.
Na Europa, a porta de entrada pode ser o seriado catalão Merlí (2015), que teve três temporadas, todas disponíveis na Netflix. Escrita por Eduard Cortés e dirigida por Héctor Losano, gira em torno de Merlí Bergeron (vivido por Francesc Orella), professor desempregado de filosofia que é literalmente jogado numa escola pública de Barcelona, a Àngel Guimerà, na qual tem de dar aula a alunos do Ensino Médio. O protagonista é um transgressor e um Don Juan, mas principalmente um docente apaixonado por sua matéria e convicto das virtudes do pensamento crítico, como escreveu a escritora e colunista Cíntia Moscovich: "Merlí incentiva seus estudantes a contestar, levando-os a crises dentro da escola e das famílias, mas também a experiências inevitáveis de crescimento".
Da Espanha, vamos para a vizinha França, país do inesquecível Entre os Muros da Escola (2008), presente no catálogo da Apple TV. Vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes, o filme dirigido por Laurent Cantet e estrelado por atores não profissionais, o filme se tornou um fenômeno de bilheteria e de debate. O roteiro é baseado na experiência do professor de Francês François Bégaudeau, que interpreta o protagonista. O ensino é o tema central, mas a sala de aula, como escreveu meu colega Daniel Feix, "é uma metáfora para a sociedade contemporânea como um todo". Os conflitos incluem a inadequação dos imigrantes, a formação problemática que os jovens trazem como herança da infância invariavelmente difícil, a falta de disciplina e respeito, a distância cultural entre professor e alunos e a incomunicabilidade resultante dessa equação.
Sementes Podres (2018) é outro filme francês que merece atenção. Em cartaz na Netflix, a comédia dramática é escrita, dirigida e protagonizada pelo franco-iraniano Kheiron. Seu papel é o do trapaceiro Wael, que vive aplicando golpes na companhia de Monique (a sempre charmosa Catherine Deneuve). Quando um desses golpes dá errado, Wael acaba incumbido de ser o mentor de adolescentes à beira de serem expulsos da escola. Entre risos e lágrimas, todos aprendem algo sobre si próprios.
O drama inglês O Despertar de Rita (1983), de Lewis Gilbert, retrata a relação entre um professor universitário desencantado e uma cabeleireira simplória determinada a completar sua educação. Concorreu aos Oscar de melhor ator (Michael Caine), atriz (Julie Walters) e roteiro adaptado e chegou a ser lançado em DVD por aqui.
Rita também é o nome de um seriado dinamarquês com quatro temporadas (entre 2012 e 2020) disponíveis na Netflix. Encarnada por Mille Dinesen, a personagem criada por Christian Torpe é professora de literatura de uma escola em sua cidade natal, no interior da Dinamarca. Rita é querida pelos alunos, a quem distribui honestidade, doçura e lições de humanismo, mas é vista como rebelde e fora do padrão por seus pares e coordenadoras. Contribui para isso sua vida pessoal: divorciada, ela tem relacionamentos amorosos tensos; como mãe, lida com uma menina disléxica, um rapaz que se descobre homossexual e o primogênito que ainda não sabe bem o que quer fazer.
Nossa volta ao mundo acaba com dois títulos do Brasil. Vencedor dos Kikitos de melhor filme, diretor (Carlos Reichenbach) e atriz (Betty Faria) no Festival de Gramado, Anjos do Arrabalde (1987) é sobre três professoras que enfrentam os problemas sociais da escola pública onde lecionam e tentam sobreviver à hostilidade da periferia paulista. Na esfera pessoal, precisam lidar com questões familiares e relacionamentos frustrados.
Também premiado em Gramado – melhor filme pela crítica, pelo público, trilha sonora e prêmio especial do júri –, o documentário Pro Dia Nascer Feliz (2005) nasceu de uma pergunta: como o adolescente brasileiro encara a vida escolar? A partir daí, o diretor João Jardim entrevistou alunos e professores de escolas públicas e particulares de três Estados – Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo. O documentarista revela a complexidade das desigualdades sociais e da violência no país, mostrando precariedades, ansiedades, inseguranças e esperanças totalmente distintas. Pode ser visto no Looke.