Aos 43 anos, até ter uma perna esmagada em acidente de trânsito, o mundo de Luiz Thadeu não era pequeno, mas limitado. Além de boa parte do Brasil, o engenheiro agrônomo maranhense havia ido a Portugal, aos Estados Unidos, à Argentina e Espanha. O universo expandiu-se de forma exponencial a partir daquele momento trágico que poderia significar um fim de linha. Desde então, sozinho ou às vezes na companhia dos filhos e da esposa ou de amigos, percorreu 151 países. A meta é ter pisado em todos os mais de 190 reconhecidos pela ONU quando fizer 70 anos – em 7 de dezembro, completa 64.
É um pouco de tudo isso, e de muitas reflexões, que trata o livro Das Muletas Fiz Asas: A história do viajante que venceu suas limitações e ganhou o mundo, lançado em junho.
Não foi tarefa tão difícil reunir histórias para o primeiro livro – são tantas e estão registradas em agendas que ele compra desde 1993, sempre adornadas com mapa-múndi. Ao começar a pandemia, nove passagens aéreas prontas para serem utilizadas, incluindo duas voltas ao mundo, ficaram em repouso, e após assistir a dúzias de documentários e ler outros tantos livros sobre viagens e viajantes, encorajou-se a registrar as próprias peripécias, ainda que não tenha sido penoso ficar em seu apartamento de São Luís do Maranhão, para onde sempre volta e onde vive com a esposa, Heloisa, 64 anos – os filhos Frederico, advogado de 33 anos, e Rodrigo, administrador de empresas, 35 anos, também moram na cidade.
Quando pergunto como classificaria sua primeira obra, já que ela mistura viagem, autobiografia e autoajuda, Luiz Thadeu responde:
— É uma experiência de vida real, em que mostro para as pessoas que qualquer um é capaz de concretizar um sonho, um desejo, um plano. Eu tinha tudo para dar errado. Hoje não consigo puxar a própria mala, mas ando de mala pelo mundo inteiro. A pergunta que mais me fazem é se tenho muito dinheiro. Minha resposta é sempre a mesma: eu tenho bolso raso e sonhos profundos. Não tenho dinheiro pra comprar um avião, mas compro um assento.
O livro de 216 páginas começa contando em detalhes o acidente que lhe reduziu a mobilidade, as dores excruciantes nos anos de internações hospitalares e as 43 cirurgias a que foi submetido. Não se trata de remoer o passado, mas de explicar por que o futuro é tão importante. Não faltam projetos a Luiz Thadeu. Além de completar seu “álbum de figurinhas” do mapa-múndi – nas Américas, faltam só as duas Guianas – e fazer as voltas ao mundo – pelo menos uma delas em 2023, incluindo a passagem por 10 novos pontos –, ele pretende passar períodos prolongados em vários países, ainda que já os tenha visitado mais de uma vez (Argentina, Austrália, Espanha, Israel, Itália e Portugal), e no sul do Brasil. Também quer trilhar todos os 217 municípios maranhenses, concluir o curso de Jornalismo (faltam dois anos) e uma terceira faculdade. Outro plano imediato, este para 2023, é refazer as fotos do casamento, de 40 anos atrás, no Palácio Guanabara, no Rio.
Seus problemas de mobilidade o fizeram despertar para o tema e para os direitos de quem tem algum tipo de deficiência. Agora, antes de fazer o check-in, solicita assistência das companhias aéreas e usa recursos como cadeiras de rodas para se locomover no aeroporto e, quando não há finger, o ambulift, equipamento para embarque e desembarque das aeronaves, evitando as fatigantes escadas dos aviões. O Brasil, diz ele, precisa melhorar muito neste aspecto, e ele já teve de aguardar horas na aeronave por não haver equipamento disponível ou estar estragado.
— Fui dar palestra em Fernando de Noronha e verifiquei que não há corrimãos para descer uma ladeira de pedra. Mudou muito pouco a acessibilidade no turismo — avalia.
Ele diz nunca ter se sentido discriminado e só uma vez, num país africano, desistiu do passeio por não sentir segurança para chegar ao local usando muletas. Considera-se viajante de sorte: nunca foi roubado, nunca se perdeu e, mesmo tendo a bagagem extraviada oito vezes, ela sempre acabou devolvida, incluindo uma em que chegou ao Alasca tendo deixado o casaco na mala. Perrengues não foram poucos, como quando quase quebraram suas muletas, no Sri Lanka, por desconfiarem que, como são ocas, poderiam transportar produtos ilícitos.
Dos pontos que faltam visitar, tem olhar especial para Kiribati, país/arquipélago composto por 33 ilhas e atóis no Pacífico, o primeiro sempre a comemorar o Ano-Novo, o único a ter territórios nos quatro hemisférios e o mais ameaçado pelas mudanças climáticas. São muitas urgências, não dá para desperdiçar o tempo.
Dicas e curiosidades
- Quando Luiz Thadeu embarca, em geral, passagens e hotéis já estão quitados. Até usa parcelamentos, mas foge dos juros. Na volta de uma viagem, sempre guarda algum dinheiro, nem que seja simbólico, para a próxima.
- Planeja todos os roteiros pela internet e está sempre de olho em promoções e plataformas de uso de milhas e/ou passagens aéreas. Alguns exemplos: já foi às ilhas Seychelles por R$ 3,8 mil, com passagens e hospedagem; por uma das voltas ao mundo, que vai fazer em junho de 2023, pagou R$ 7,8 mil pelo bilhete, em classe executiva.
- Pesquisa todos os dias e busca datas e horários menos cobiçados. Também participa de sorteios e já ganhou upgrades e milhas.
- Nos aeroportos, usa salas VIP de cartões de crédito e economiza com refeições. Nas viagens, almoço e jantar são sagrados, mas em locais simples e está sempre atento aos preços (na Tailândia, diz, a comida é boa e barata; no Japão, na Noruega e Suécia, é caríssima).
- Costuma ficar no centro das cidades, para facilitar o deslocamento, e anda de ônibus dentro das cidades ou entre um lugar e outro.
- Para hospedagem, não busca conforto nem hotéis caros. Gosta de albergues, para conviver com pessoas.
- Viaja com mala grande, despachada, mas com pouca bagagem. Na ida, leva lembrancinhas para distribuir a quem eventualmente conhecer. Na volta, traz presentes e suvenires, como canecas (tem uma coleção com mais de 500).
- Luiz Thadeu relativiza a questão do tempo para quem justifica o fato de não poder viajar: todo mundo dispõe das mesmas 24 horas por dia, observa.
O livro
- Das Muletas Fiz Asas: A história do viajante que venceu suas limitações e ganhou o mundo, de Luiz Thadeu.
- O prefácio é da jornalista Sandra Coutinho, correspondente da Globo em Nova York.
- Teve lançamento em junho em São Luís do Maranhão, em setembro em São Paulo e tem previsão para Brasília e Portugal no próximo ano.
- Da nVersos Editora, 216 páginas, preço sugerido R$ 59
- Onde encontrar: no site da editora nversos.com.br, na Amazon, em livrarias de São Paulo e São Luís do Maranhão