A transmissão de cargo em Novo Hamburgo retratou a tensão da campanha. Sem clima para uma transição pacífica e civilizada como foi a de Pelotas, a ex-prefeita Fátima Daudt (MDB) entregou o cargo a Gustavo Finck (PP) na porta da prefeitura — a chuva forte que caiu à tarde no Vale do Sinos deixou o centro administrativo sem energia elétrica, e impediu a cerimônia no gabinete.
O novo prefeito não pode reclamar da herança recebida de Fátima. Ao assumir, recebeu a prefeitura com mais de R$ 30 milhões em caixa. Além disso, a previsão é de ingresso de mais de R$ 50 milhões em janeiro, referentes à cota única do IPTU, sem considerar as demais arrecadações e repasses estaduais e federais.
— Todas as despesas públicas municipais também estão abaixo dos tetos constitucionais. A folha do funcionalismo, por exemplo, está em 38% da receita corrente líquida, bem abaixo do limite de 54%. E os pagamentos de fornecedores estão dentro dos 30 dias de prazo para quitação — orgulha-se Fátima, que administrou Novo Hamburgo por oito anos.
Quando assumiu, em 2017, Fátima encontrou a prefeitura quebrada. A gestão anterior havia perdido financiamentos internacionais que ela conseguiu recuperar para fazer a revitalização do centro da cidade e investir em educação. Ainda no primeiro mandato, conseguiu diminuir o déficit recebido do governo anterior.
No segundo mandato, encaminhou à Câmara um projeto de lei de reforma da Previdência. A prefeitura tem sistema próprio de aposentadoria com um histórico de déficits que Fátima não conseguiu resolver. O atual prefeito, que era vereador, trabalhou contra a aprovação da reforma. Antes do recesso, Fátima enviou novamente o projeto à Câmara. A votação está prevista para o início de fevereiro. A própria Fátima tem curiosidade para saber como se comportará o prefeito agora que tem a responsabilidade de administrar uma das principais cidades do Rio Grande do Sul.
Na campanha eleitoral, Finck fez promessas que aumentam despesas e reduzem receitas, como passagem gratuita no transporte público, redução do valor do IPTU, retirada de todos os moradores de rua da cidade e abertura de atendimento a pacientes de oncologia em 60 dias.
Finck diz que "números não são bons"
Na breve transferência do cargo, que durou cerca de cinco minutos, o prefeito eleito agradeceu Fátima pelo "legado importante" deixado por ela na cidade, o qual disse que dará sequência. Mais tarde, durante a posse na Câmara Municipal, Finck refutou os bons indicadores econômicos celebrados pela ex-prefeita e antecipou que terá que realizar cortes financeiros para "fazer os avanços necessários". Ele repetiu o discurso na chegada à prefeitura nesta quinta-feira (2):
— Vamos analisar os números ainda, nós sabemos que não são números bons. Nós temos que cortar na própria carne, a reforma administrativa é para isso, para dar o exemplo. Que eu possa contar junto com vocês para a gente economizar o máximo possível e gradativamente evoluir a cidade. Tínhamos um governo muito afastado da população e isso não pode acontecer. O governo tem que estar presente e saber das dores da comunidade — disse, em fala aos servidores e políticos presentes.
Com a reforma administrativa, o novo prefeito prevê uma economia de R$ 19 milhões no quatro anos de gestão. Ele também afirma que não tem recursos para investir em eventos festivos nem é "um momento para comemorar" na cidade.
Quando vereador, Finck foi o autor de lei aprovada em agosto de 2024 que proíbe a realização de eventos festivos com a utilização de recursos públicos enquanto o município estiver sob estado de calamidade pública ou em situação de emergência. Tal legislação impediu no ano passado a realização da feira do livro, da virada cultural e da programação de Natal, atividades tradicionais do fim de ano na cidade.