Até os agropecuaristas devem ter se surpreendido com a veemência do presidente Lula na defesa do agronegócio brasileiro diante dos ataques do CEO do Carrefour e de um deputado da direita francesa. Mesmo com os atritos que teve com líderes do setor a quem chamou de fascistas, Lula sabe o quanto a economia brasileira depende da agricultura e da pecuária. Sabe, também, que não pode silenciar diante de um ataque infundado à qualidade da carne produzida no Mercosul.
O presidente aproveitou o discurso na Confederação Nacional da Indústria para limpar a imagem dos produtos agropecuários brasileiros e fustigar os franceses. Apesar da sua boa relação com o presidente Emmanuel Macron, Lula seria ingênuo se achasse que a França, em crise com seus agricultores, iria bater palmas para o acordo alinhavado entre o Mercosul e a União Europeia.
— Se os franceses não quiserem o acordo, eles não apitam mais nada. Quem apita é a Comissão Europeia, e a Ursula von der Leyen (presidente da Comissão) tem procuração para fazer este acordo. Pretendo assinar este acordo este ano ainda, tirar isso da minha pauta — discursou Lula.
Há nesse discurso um otimismo exagerado. Falta um mês para o ano terminar. Menos até, se considerarmos que nada se faz entre o Natal e o Ano Novo. A França pode não ter força suficiente para barrar o acordo, em nome do protecionismo de seus agricultores, mas é um dos membros mais relevantes da União Europeia. Se em 22 anos o acordo não saiu, quem garante que sairá agora?
Na terça-feira (26), a Assembleia Nacional da França rejeitou a celebração do acordo Mercosul-UE e os parlamentares franceses levantaram dúvidas sobre a qualidade, rastreabilidade e padrões sanitários da carne brasileira.
É fato que o Brasil tem outros clientes com dinheiro e mercado consumidor, como a China e a Índia, para vender as carnes e os grãos que o deputado francês Vincent Trébuchet, do partido de direita UDR, chamou de lixo. Mas também é fato que um acordo com a União Europeia dá fôlego ao Mercosul, uma associação de países que nunca chegou ao nível de integração pretendido na criação, quando Fernando Henrique Cardoso era presidente do Brasil.