Tantas foram as tentativas frustradas de revitalizar o Cais Mauá que será difícil ao governo de Eduardo Leite convencer a população de Porto Alegre que o projeto apresentado nesta quinta-feira não é apenas mais um para o museu das coisas impossíveis. Nas maquetes digitais, o projeto é bonito, ousado, inovador, conectado com o modo de vida no século 21, ambientalmente sustentável e moderno sem perder a essência do que são os armazéns: parte da história de Porto Alegre.
A parte mais radical do projeto é, sem dúvida, a derrubada de um trecho do Muro da Mauá, a ser substituída por um sistema capaz de proteger não só a cidade, mas o próprio cais de uma possível enchente. A mais polêmica, a venda da área das docas, com a construção de edifícios — dois dos prédios propostos remetem ao formato do Centro Administrativo, ainda que a ideia dos arquitetos seja de lembrar uma cascata.
No papel, a equação econômica está resolvida com a venda de terrenos nas docas, para a construção de prédios arrojados, que combinam moradia e atividades comerciais. Os investimentos previstos para o período de 10 a 15 anos chegam a R$ 1,3 bilhão, sendo sendo R$ 300 milhões nos primeiros cinco anos. Serão 45 mil empregos.
A vida real, no entanto, é um pouco mais complicada. Há um cipoal burocrático a ser vencido — e Leite mencionou esses obstáculos — a despeito da mudança no plano diretor do Centro, aprovada pela Câmara, e a da boa vontade da administração do prefeito Sebastião Melo. Registre-se que Melo defendia um plano mais modesto, deixando o Embarcadero ali onde está, ao lado do Gasômetro, e usando os armazéns para a instalação de cervejarias, feiras e restaurantes. Como o comando é estadual, a prefeitura está disposta a fazer sua parte para que os nós sejam desatados o mais rápido possível.
O governo, em uma perspectiva otimista, planeja fazer o leilão em maio de 2022. Leite deixará o Piratini em abril, se for candidato, ou janeiro de 2023, se não for. Melo terá ainda três anos no governo.
No projeto desenhado pelo consórcio Revitaliza, sob supervisão do BNDES, o Embarcadero desaparece (o contrato é de seis anos). Aquele ponto será destinado a uma área de contemplação. As operações de gastronomia ficarão concentradas nos armazéns, que também terão espaços para atividades culturais e de tecnologia. O antigo frigorífico, que não pode ser demolido, será um centro cultural ou de eventos. O edifício em frente ao pórtico central, que no projeto do governo Yeda Crusius era um hotel boutique, será um coliving, para moradia em períodos de curta duração.
ALIÁS
Quando tomou a decisão de rescindir o contrato com a Cais Mauá do Brasil, que não cumprira a sua parte, o governador Eduardo Leite assumiu o risco de o Estado vir a ser condenado a indenizar a empresa, mas o procurador-geral do Estado, Eduardo Cunha da Costa, garante que a base jurídica para o rompimento é sólida.