A quinta-feira (1º) só não foi um dia perdido na CPI da Covid porque serviu para mostrar que o enredo de seriado da política brasileira tem mais personagens obscuros do que indicavam os primeiros capítulos. E que se a ideia do roteirista era descreditar a CPI, faltou conhecimento de literatura policial.
O cabo da PM mineira Luiz Paulo Dominguetti foi depor na condição de testemunha-bomba, depois de ter dado uma entrevista à Folha de S.Paulo “denunciando” que havia recebido um pedido de propina de US$ 1 por dose em negociação para a compra de vacinas.
A história é nebulosa e cheia de furos. Dominguetti, um tipo estranho, policial que teria tentado fazer um bico intermediando a compra de vacinas virtuais da AstraZeneca, a serem fornecidas pela empresa americana Davati Medical Supply , tentou incriminar o deputado Luís Miranda, mas o tiro saiu pela culatra. Exibiu como se fosse deste ano um áudio de 2020, editado, e que segundo a versão registrada em cartório por Miranda, tratava da venda de luvas para os Estados Unidos e não de vacina para o Ministério da Saúde.
Os governistas se excitaram diante da perspectiva de desqualificar o depoimento de Miranda, que contou ter denunciado ao presidente Jair Bolsonaro um negócio suspeito envolvendo a Covaxin, do laboratório indiano Bahrat Biotech.
Com tantos personagens e versões que não batem, a CPI precisa retomar o foco, fazer acareações e mostrar quem está mentindo. Depoimentos soltos, acusações sem provas e ilações não contribuem para responder à pergunta que interessa: houve ou não corrupção no Ministério da Saúde?
A entrevista de Dominguetti derrubou o diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Dias, com quem ele jantou em fevereiro e teria oferecido vacinas sem ter procuração do fabricante, que não trabalha com intermediários. O PM mineiro pode ser apenas um mitômano ou um aproveitador que tentou levar vantagem num negócio que nada tem a ver com a sua área de atuação.
Os senadores de oposição dizem que Dominguetti é um “cavalo de troia" plantado pelo governo, mas até isso é prematuro. Afinal, o personagem só foi chamado para a CPI porque acusou um integrante do governo de propor o aumento de US$ 1 em cada dose de vacina para que essa diferença fosse repassada como propina.
Aliás
Na sessão desta quinta-feira, chamou atenção a atuação do senador Flávio Bolsonaro, filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro. Em certo momento, para ler um documento, Flavio pediu para tirar a máscara, alegando que não conseguia ler com o acessório.