A Defensoria Pública do Estado ajuizou uma ação civil pública contra a advogada Doris Denise Neumann, que proferiu uma frase de cunho nazista durante protesto contra as restrições impostas pelo governo do Estado para conter a pandemia de coronavírus. No processo, a instituição pede que Doris seja condenada a pagar R$ 60 mil por danos morais coletivos e outros R$ 40 mil por danos sociais, além de promover uma retratação pública.
A ação foi protocolada no fim da tarde desta quinta-feira (18), na Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre. Além da indenização e da retratação, a Defensoria pleiteia que a advogada frequente e seja aprovada em um curso sobre Direitos Humanos com carga horária mínima de 20 horas-aula.
De acordo com o subdefensor público-geral para Assuntos Jurídicos, Alexandre Brandão Rodrigues, a atitude de “exaltação ao nazismo" não pode ser tolerada pela sociedade e pelas instituições.
— Nesse caso, não estamos falando de liberdade de expressão, pois, em uma república que se proclamou Estado Democrático de Direito, ninguém tem o direito de cometer atos ilícitos. A liberdade de expressão é uma garantia de livre expressão de um direito e não uma garantia de que se possa, impunemente, vilipendiar o direito alheio — explica Rodrigues.
Se for condenada, Doris deverá repassar os valores propostos pela defensoria a um fundo constituído no município de Porto Alegre para a prevenção da discriminação e do combate a discursos de ódio. Outra alternativa é que o valor seja destinado ao Fundo para Reconstituição de Bens Lesados (FRBL), administrado pelo Ministério Público.
A retratação deverá ocorrer em até 48 horas, em vídeo a ser publicado em suas redes sociais e encaminhado a pelo menos três veículos de imprensa de grande circulação no Estado.
Relembre o caso
No dia 10 de março, durante um protesto contra as medidas restritivas impostas pelo governador Eduardo Leite para conter o avanço do coronavírus, a advogada Doris Denise Neumann gravou um vídeo em que cita a frase em alemão “Arbeit macht frei” para defender “o direito de trabalhar”. A expressão, que significa "o trabalho liberta", pode ser lida ainda hoje nos portões do que restou dos campos de concentração da Alemanha nazista.
— Os alemães vão entender a frase que eu vou falar: Arbeit macht frei. Não foi isso que a gente aprendeu? Que o trabalho nos faz ser livre (sic). Pois aqui nós estamos reivindicando o trabalho. Se o governador que foi posto por nós no poder para a decisão não decidir que nós possamos trabalhar, a gente tira ele — disse a advogada, na gravação.
Doris foi candidata a prefeita de Nova Petrópolis pelo Patriota em 2020 e ficou em último lugar, com 1.347 votos.
Representantes da comunidade judaica pediram providências à Secretaria da Segurança Pública e ao Ministério Público, alegando “discurso de ódio”. A Polícia Civil instaurou procedimento policial e o MP está apurando o caso.
A Federação Israelita do Rio Grande do Sul divulgou nota em repúdio ao que chamou de “atitude vil da sra. Dóris Denise Neumann”.
Contraponto
A coluna tentou contato com Doris por meio de dois telefones, mas as ligações não foram atendidas. Em uma nota de esclarecimento publicada nas redes sociais no dia 14 de março, a advogada afirma que proferiu a frase em alemão em referência aos antepassados:
"Minha vó e meus pais me educaram que só o trabalho pode nos dar liberdade e dignidade. Foi exatamente no resgate destas lembranças, imbuída pelo sentimento de perda dos gaúchos, acelerada pela desastrosa política de enfrentamento ao Covid-19 adotada em nosso Estado, que desejei homenageá-los; falando em alemão, que só o trabalho poderá nos libertar. Não caberia eu falar: le travail vous libère idêntica frase em francês, não se destinava aos franceses. Foi pensando em nossos Alemães do RS", escreveu.
No comunicado, Doris descreveu o nazismo como "a escravidão, o sistema esquerdo/comunista de Hitler", que classificou como "perverso e desumano".