O Rio Grande do Sul é forte candidato a entrar no Guinness Book como o Estado onde uma referência criada para debelar a inflação mais enriqueceu funcionários públicos. Vinte e quatro anos depois do Plano Real, a Unidade de Referência de Valor, conhecida por URV, continua a produzir filhotes. Quando se pensava que dessa vaquinha já tinha se extraído tudo o que era possível extrair, vem o Tribunal de Contas provar o contrário e espeta no contribuinte gaúcho uma conta de mais R$ 200 milhões.
O custo total desse criatório é difícil de calcular até para quem tem domínio dos meandros da contabilidade pública, como o economista Darcy Francisco dos Santos, funcionário aposentado da Secretaria da Fazenda.
Só com o que havia sido pago até 2007, quando o jornalista e economista Sergio Gobetti questionou os pagamentos no Conselho Nacional de Justiça, Darcy calcula que o Rio Grande do Sul gastou, em valores atualizados, mais de R$ 2 bilhões a título de “diferenças na conversão da URV”. Com os pagamentos feitos nos anos seguintes, calcula-se que a conta passe de R$ 3 bilhões.
Não foi isso que quebrou o Estado, mas que ajudou, ajudou. R$ 4 bilhões é o valor do déficit previsto para este ano, mesmo sem o pagamento da dívida com a União.
A vaquinha URV encorpou contracheques no Tribunal de Justiça, no Ministério Público, na Assembleia Legislativa e no Tribunal de Contas. Servidores do Executivo que recorreram ao Judiciário para tentar se habilitar a uma correção semelhante deram com a cara na porta.
O desabafo de Darcy é o de um especialista que há anos alerta para o risco de colapso nos serviços públicos, em consequência da crise que atinge as finanças estaduais:
– Esses pagamentos são uma vergonha. Não tem cabimento porque se trata de mudança de moeda. Até o CNJ já se posicionou contra a forma como os pagamentos foram calculados. E o Tribunal de Contas, que tinha de zelar pelas contas públicas, primeiro porque é seu dever e segundo porque as conhece melhor do que ninguém, está pagando para seus servidores aposentados desde 1994. Enquanto isso, servidores do Executivo que ganham pouco mais que o salário mínimo ainda não receberam nada de seus vencimentos de outubro.