Na minha última troca de carro, o principal motivo da escolha foi a marca – pela confiança inabalável na seriedade dos japoneses –, mas um detalhe acabou por pesar na decisão: eu não conseguia me imaginar comprando um automóvel sem tocador de CDs. Sim, sou das antigas. Preciso de um bom rádio para ouvir notícias e de um leitor de CDs para escutar as relíquias acumuladas ao longo dos anos.
Cheguei a fazer o test drive em um asiático de design moderno, confortável e muito bom de dirigir. Pelo meu usado, a concessionária pagava o mesmo valor oferecido na concorrente, os preços eram equivalentes, o conforto idem. Câmera de ré eu podia mandar instalar em qualquer um. De motores, não entendo muito, mesmo, para perceber as sutilezas. Quando perguntei sobre o equipamento de som, a simpática vendedora me falou que CD é um negócio ultrapassado. Que os carros modernos só têm bluetooth e entrada de pen drive. Fiquei de pensar. Minutos mais tarde, passei na outra loja e encomendei o carro com tocador de CDs.
Dias depois, minha filha usou a consciência ambiental como argumento definitivo para me converter ao Apple Music, pelo qual eu pagava, sem usar, a assinatura de um plano familiar de US$ 7,99 por mês. Ou seja: por cerca de R$ 30 por mês, todos em casa podemos baixar milhares de músicas e ouvir no carro, no celular, na caixinha de som ao lado da cama, sem poluir o planeta com aquelas embalagens de plástico e com os discos propriamente ditos.
Ninguém melhor do que os filhos para mudar nossos hábitos. Em menos de 24 horas, eu já estava apaixonada pelas múltiplas possibilidade do streaming. Quando já estamos na segunda metade da vida, nossa trilha sonora está completa – ou quase. Resgatar as músicas que me tocam a alma tem sido uma divertida forma de relaxar depois do trabalho.
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Arrisquei-me até a fazer a playlist com as 20 mais, para ouvir quando estou sozinha e não cansar a família com a repetição. Entre outras, tem Futuros Amantes, Valsa Brasileira e Anos Dourados (Chico Buarque), Luiza (Tom Jobim), As Time Goes By (com Tonny Benett), Emmanuelle (Pierre Bachelet), Don't Cry For Me Argentina e As Quatro Estações de Vivaldi, que funciona como um ansiolítico nos dias mais tensos.
Como alguma coisa sempre se perde quando mudamos um hábito, ir a um shopping ficou um tanto sem graça. Minha loja preferida de discos, a King's do Quinta Avenida Center, já tinha fechado as portas, abatida pela modernidade. Deixei de ser uma das últimas compradoras de CDs com a mesma dor que, anos antes, selou minha despedida das locadoras de vídeos. Em compensação, quando estou no banco do carona já tenho como espichar as pernas. Antes, precisava dividir o espaço com os porta-CDs, outra espécie em extinção que guardarei para um pequeno museu das coisas que só têm valor sentimental.